Mobilidade meia boca - Rubens Nóbrega

Com esse seu ‘Pac da mobilidade urbana’, o prefeito Luciano Agra, da Capital, mostrou que não quer que eu deixe o carro na garagem e pegue a bicicleta, ônibus, metrô ou van para ir e voltar de casa para o trabalho ou qualquer lugar.

Os meus parentes, vizinhos do lado, de cima e de baixo também não vão querer trocar o carro por qualquer outro meio de transporte mais saudável ou coletivo porque agora teremos mais asfalto e mais ruas alargadas para trafegar.

Que importa se vamos continuar contribuindo para aumentar exponencialmente os congestionamentos em nossas ruas e a poluição do ar que respiramos, despejando diariamente toneladas de gases poluentes em nossa atmosfera?

Que importa se mais binários, ruas asfaltadas e terceiras pistas em alguns dos nossos grandes corredores serão facilmente saturados e superados pela circulação de uma centena de novos carros licenciados a cada dia na Capital?

Sinceramente, desconfio que o tal ‘Pac’ do Doutor Luciano não passa de mais um evento de sua pré-campanha à reeleição, além de servir para desviar um pouco a atenção dos escândalos envolvendo merenda e outros cuiás da gestão.

Caminho livre? Só se for pra otras cositas mas… Ou para empurrar goela abaixo do povo mais um balaio de paliativos para contornar gargalos pontuais, localizados. E tudo isso no médio prazo. No longo, o inferno deverá se repetir ou piorar.

De outro lado, na promessa de corredores exclusivos para ônibus e expansão da frota daqueles ônibus dito articulados, com dois ou três vagões, vê-se que o prefeito não consegue disfarçar a sua predileção pelo atual sistema de transporte coletivo.

Em matéria de transporte de massa, o atual gestor, a exemplo daquele do qual é cria, continua priorizando o ônibus em detrimento de alternativas de deslocamentos mais rápidos, mais ágeis, mais confortáveis e seguros.

Por que será, hem? Alguém aí saberia dizer por que o alcaide de agora, tanto quanto o seu antecessor, jamais pautou ou permitiu qualquer discussão em torno de possibilidades como metrô, trens ou vans no transporte de massa?

Ah, mas o prefeito diz e vai dizer que metrô é muito caro. Caro o quê, Doutor! Caro é reduzir canteiros e gramados (como está no seu plano) para caber mais carros, mais acidentes, mais poluição, mais doenças, mais mortes no trânsito…

Algum estudo aí?

E quando o senhor diz que é ‘caro’ por acaso tem algum estudo sobre custos de congestionamentos, acidentes de carro, engenheiros, bandeirões, pardais, lombadas eletrônicas e físicas, semáforos e gastos com guardas de trânsito, viaturas etc.?

Aposto que não, Doutor, mas, se tiver, apresente. Enquanto isso, sugiro que Vossa Excelência leia, por exemplo, “Trânsito nas grandes cidades: o preço do tempo perdido”, artigo de Cláudio Cunha publicado no Opinião e Notícia em 2008.

Foi através desse escrito que soube de um Estudo do Denatran, em parceria com o Ipea, sobre “Impactos Sociais e Econômicos dos Acidentes de Trânsito nas Rodovias Brasileiras”. O estudo ajuda a entender melhor o assunto pelo foco que o conduziu.

Mostra, por exemplo, que além da perda de tempo a retenção no trânsito provoca ainda o aumento do custo de operação de cada veículo (combustível e desgaste de peças) e faz com que estados e cidades gastem fortunas em soluções meia boca.

“Quando motivado por acidente, o engarrafamento fica ainda mais caro, pois envolve bombeiros, ambulâncias, médicos, hospitais, internações, medicamentos, lucros cessantes e, eventualmente, custos fúnebres, além das perdas familiares”, informa.

Pro senhor ter uma idéia, Seu Prefeito, “nos Estados Unidos, as autoridades incluíram, no custo financeiro do engarrafamento, o estresse emocional provocado em suas 75 maiores cidades. Conta final: U$ 70 bilhões/ano”. É brincadeira?

“Isso sem falar no custo ambiental, pois é consenso na comunidade científica que a queima de combustíveis fósseis, como o petróleo, é uma das principais causas de emissões de carbono, um dos causadores do aquecimento global”, arremata.

Soluções mundo afora

Fora do Planeta Girassol temos também vida inteligente e soluções para resolver problemas de trânsito como o que enfrentamos atualmente, soluções essas para muito além das obras que vão custar mais de R$ 10 milhões aos cofres públicos.

Agora, por que será, hem, que o prefeito não aceita fazer, por exemplo, o que fizeram no Rio de Janeiro, onde investiram pesado no aumento de ciclovias e numa campanha de conscientização da população, que aderiu bem à bicicleta?

Por que será que os girassolaicos, como diria Chico César, ignoram sugestões que podem ajudar a melhorar de verdade a nossa qualidade de vida? Por que não fazem um projeto competente para captar dinheiro que financie a construção do nosso metrô?

Você aí, amigo, amiga, já viu pelo menos por aqui alguma campanha do poder público municipal que incentive a classe média a pegar ônibus, a deixar o carro em casa, convencendo-a ainda de que ônibus não é só pra gente pobre?

Lembrando, evidentemente, que, primeiro, é preciso oferecer ônibus de muita qualidade, regularidade, limpeza e segurança. De nada adianta vender uma mercadoria que não vai entregar, fazendo propaganda enganosa. Como sói, aliás.
Por todo o exposto dá pra sentir que sinto cheiro de enganação nesse aparatoso anúncio do ‘Pac da mobilidade’. As obras prometidas podem até minorar, aliviar, facilitar etc., mas logo se revelarão insuficientes e, mais um pouco, ineficientes.

Torcer pra dar certo

Creio que essa é a expectativa ou o desejo dominante da grande maioria da população que assistiu ao governador Ricardo Coutinho anunciar anteontem que está passando a bola do Hospital de Trauma de João Pessoa para a Cruz Vermelha.
Todo mundo deve torcer para que dê certo, para que o HT recupere seu padrão de qualidade no atendimento e que no correr do tempo revele-se acertada e exitosa a iniciativa do atual governo em entregar o equipamento aos cuidados da CVB.

Só fico preocupado com duas coisas: a já proverbial falta de transparência do governo que marcou presença também nessa operação e a mui provável dificuldade que a nova direção do Hospital terá em substituir a força de trabalho local.

Espero que a prata da casa seja respeitada nessa transição e que os novos dirigentes possam viabilizar acordos com outros profissionais paraibanos para evitar descontinuidade, supressão ou precarização dos serviços do HT.

Porque, se agir no sentido contrário, se optar pelo confronto, tal e qual o governo que temos, o prejuízo e o sofrimento terão que ser arcados mais uma vez pela população, em especial “por quem mais precisa”.