Mãe, mulher, vida

Nonato Guedes

Acho que o Dia das Mães pede uma reflexãozinha que seja sobre a luta constante das mulheres pela sua emancipação, inserção no mercado de trabalho, reconhecimento da sua capacidade ou competência, sem falar nos atributos inatos de doação, solidariedade, dedicação a maridos, filhos, noras e netos. Não posso deixar de registrar com orgulho o exemplo de dona Josefa Guedes de Aquino, que segura o leme à frente de uma prole numerosa, majoritariamente feminina, suprindo a lacuna deixada pelo meu pai, Joaquim Nonato, falecido aos 58 anos de idade. Dona Josefa deve ter adquirido essa têmpera nas batalhas pela sobrevivência no longínquo sertão paraibano, numa época em que era tudo escasso, dos mantimentos ao dinheiro para fazer face às necessidades que a vida impõe. O seu gigantismo aflorou mais ainda quando foi chamada a cuidar de filhos e filhas com a morte de papai.

O enredo da história de mamãe não difere muito do enredo da história de tantas mães que dão duro na peleja contra a adversidade. A diferença, que a torna especialíssima, no meu caso, é que é minha mãe, aquela que me suporta nos momentos difíceis quando ela espera ternura, que tenta ser compreensiva mesmo quando em troca recebe gestos de aparente hostilidade, não propriamente dirigidos a ela, mas, em geral, ao mundo, a pessoas que nos fazem infelizes, que tripudiam sobre nossas eventuais qualidades, que exploram o nosso potencial. Tê-la sempre por perto é um sinal de alento, de encorajamento. É a certeza do regaço materno a desalinhar meus cabelos sinalizando a sua presença marcante, demonstrando que ela não está ausente nem indiferente. Está, às vezes, impotente, para equacionar os conflitos que permeiam nossas cabecinhas devassadas pela quantidade de informações e pela velocidade das transformações de valores.

A autonomia das mulheres e a igualdade de gênero são reconhecidas como um dos grandes pontos da Declaração do Milênio, adotada por 191 países membros das Nações Unidas, com vistas a melhorar a qualidade de vida de todos os habitantes do planeta até 2015. Nela está indicada a necessidade de promoção da igualdade entre os sexos e da autonomia da mulher como meios eficazes de combater a pobreza, a fome e as doenças, além de estimular um desenvolvimento verdadeiramente sustentável. Não deixa de ser lamentável, pelo que nos diz o Portal Brasil, que faltando três anos para o fim do prazo dedicado ao cumprimento da mais importante promessa já feita às populações vulneráveis do mundo, a autonomia da mulher em todos os sentidos e o respeito aos direitos já assegurados estejam longe de serem atingidos.

Em amplo e recente estudo, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) afirma que, no atual nível de desenvolvimento econômico tecnológico e social, é possível alcançar esses objetivos. Mas como alerta a Cepal, as condições materiais existentes não oferecem uma explicação razoável para a desigualdade, para a morte materna, para a gravidez na adolescência, para o emprego precário ou para a insólita concentração do trabalho doméstico não remunerado nas mãos das mulheres. “Muito menos para a violência de gênero”, acrescenta a Cepal no estudo “O salto da autonomia – Das margens ao centro”, divulgado em novembro de 2011. Esse organismo das Nações Unidas afirma ainda que a desigualdade e, portanto, a falta de autonomia, é, principalmente, conseqüência da injustiça, da má distribuição de poder, de renda e da falta de reconhecimento dos direitos das mulheres por parte das elites políticas e econômicas.

Na opinião de Ana Márcia Gallafrio, o caminho é longo e os desafios a serem superados ainda são gigantescos, principalmente para equilibrar trabalho, família e vida pessoal. “Mulheres que se tornaram mães e precisam voltar ao trabalho enfrentam um difícil recomeço”, diz. Na avaliação dela, a mulher que acabou de ser mãe não é a mesma, já que sofre transformações profundas desde a gravidez. “Após esse mergulho na doação e na sua entrega ao filho, o desafio é como enfrentar a separação e a dúvida de com quem deixar o seu bebê e como vai ficar longe dele”, explica. E arremata: “O Brasil ainda é muito desigual. Mas gostaria de frisar que não dá para substituir a cultura machista que temos por outra, feminista. A sociedade precisa entender que o papel de mãe precisa ser respeitado e valorizado”. Vai ser! As mulheres vão conseguir isto, como já conquistaram tantos avanços. Um beijo no coração de todas!