O Estado de S.Paulo
Se pudesse, registraria em cartório a sua condição de não candidato ao Planalto este ano, e os jornalistas de sua confiança deveriam “contribuir para acabar com essa boataria toda”; o governo tem que “ir para cima” e o PT tem que reagir “com unhas e dentes” à tentativa da oposição de fazer a CPI da Petrobrás, e se o partido assim tivesse procedido em relação à CPI dos Correios, em 2005, “possivelmente a história teria sido outra” (ou seja, o mensalão acabaria abafado); a economia está aquém do que ele e a presidente gostariam, mas não tanto como faz crer “a massa feroz de informação deformada”, e de todo modo Dilma precisa explicar na campanha eleitoral o que fará para melhorar a situação a partir de 2015.
Desde sexta-feira, quando se encontraram em São Paulo, a criatura sabia que o criador iria ele próprio “para cima” do desencanto e do pessimismo que não cessam de ensombrear o governo. O que ele ouve em seu confessionário no bairro paulistano do Ipiranga, onde funciona o instituto que leva o seu nome, confere com a sua proverbial intuição para convencê-lo de que o descrédito de confiança das elites políticas, a começar dos companheiros, e das lideranças empresariais nas aptidões da presidente chegou a um nível alarmante. Se o poder fosse uma conta bancária, ela estaria afundada no cheque especial, beirando a inadimplência.
Isso, há de raciocinar Lula, ainda não prenuncia o desmanche do projeto da reeleição, mas deixa antever acidentes de percurso capazes de ameaçar a travessia com o imponderável. O mais desalentador terá sido descobrir, a cada conselho dado, mas não atendido, que a pupila ou apenas finge concordar com ele, por se achar em posse de atributos suficientes para exercer o mando como lhe pareça melhor, ou por não conseguir segui-los, porque, em poucas palavras, não é do ramo. Seja como for, Lula deve ter sido particularmente enfático ao lhe ordenar que proclamasse estar disposta a investir com unhas e dentes contra a CPI da Petrobrás – o que ela fez na segunda-feira ao avisar que não recuará um milímetro da “disputa política” com a oposição.
Decerto Lula também lhe terá dito que pretendia vir a público para defender o governo. Não se sabe se acrescentou algo como “ainda que fosse necessário cobrar da governante promessas de dias melhores para a economia”. Seria uma contraofensiva ao seu estilo, a que não poderiam faltar as habituais caneladas na imprensa. “Temos que retomar com muita força essa questão da regulação dos meios de comunicação do País”, aos quais acusa de tratar Dilma com “falta de respeito e de compromisso com a verdade”. (Isso não o impediu de propor a Dilma “uma política agressiva de comunicação”.) A sucessora não só enfiou a obsessão de Lula no fundo da gaveta, como disse logo depois da posse que “devemos preferir o som das vozes críticas da imprensa livre ao silêncio das ditaduras”.
Se tiver apenas metade da inteligência de que há de se achar dotada, Dilma deve ter passado pelo desconforto de atinar com o que Lula efetivamente pretendia ao chamar os holofotes para si – mostrar a tutti quanti que resolveu exercer, agora à plenitude, a função de fiador da presidente. Ou seja, ele não precisa “voltar” para acalmar a legião de queixosos da conduta da afilhada. E ele estará por perto até o fim de seu mandato para prevenir ou, em último caso, remediar, a tempo e a hora, derrapadas da mandatária. Por sinal, como quem não quer nada, mas querendo, Lula disse aos seus blogueiros que tem recebido mais políticos, ativistas e empresários do que no seu tempo de presidente.