A Justiça Federal em São Paulo determinou liminarmente a suspensão dos passaportes diplomáticos concedidos ao pastor R. R. Soares e a sua mulher Maria Magdalena Ribeiro Soares, da Igreja Internacional da Graça de Deus, concedidos pelo ministro das Relações Exteriores José Serra (PSDB) na quarta-feira passada, dia 29 de junho. A decisão liminar acata o pedido em ação popular movida pelo advogado Ricardo Abraão Amin Nacle questionando a concessão do benefício aos pastores.
Na decisão, o juiz da 7ª Vara Federal Cível Tiago Bologna Dias dá cinco dias para os pastores entregarem o documento à Justiça e aponta que a concessão do benefício aos religiosos representa uma “confusão entre Estado e religião incabível”.
“Na Ordem Constitucional vigente o Estado é laico, há separação plena entre Igreja e Estado, de forma que é efetivamente incompatível com a Constituição que líder religioso, nesta condição e no interesse de sua instituição religiosa, seja representante dos interesses estatais brasileiros no exterior”, assinala o magistrado.
Tiago Bologna Dias contesta o argumento do Ministério das Relações Exteriores de que a concessão do benefício aos pastores atende ao “interesse do País”, uma das justificativas previstas na legislação sobre o tema.
Para o magistrado, ainda que a legislação deixe em aberto algumas possibilidades para a concessão do benefício, “isso não quer dizer arbitrariedade, vale dizer, a opção de conveniência e oportunidade deverá respeitar os parâmetros constitucionais, legais e regulamentares incidentes e sua conformidade com os fins do instituto”.
Além disso, o juiz apontou que, além do alegado interesse do País, o Ministério deve explicar os motivos de forma mais detalhada para autorizar os passaportes, o que não foi feito na portaria envolvendo R. R Soares e sua mulher.
Na prática, o passaporte diplomático permite a R. R Soares e sua mulher entrarem e saírem de alguns países com relação diplomática com o Brasil sem a necessidade de visto ou qualquer outra burocracia. O passaporte, contudo, não dá imunidade diplomática a eles.
Religiões
Não é a primeira vez que o governo federal concede o benefício a líderes religiosos. Em 2013, durante o governo Dilma Rousseff, o líder da Igreja Mundial do Poder de Deus, Valdemiro Santiago de Oliveira, e a mulher dele, Franciléia de Castro Gomes de Oliveira também receberam o benefício. Outros líderes de igrejas também já receberam o documento, que dá direito ao uso de uma fila especial nos aeroportos, mas não dá imunidade diplomática.
Com menos de uma semana no cargo, em maio deste ano, José Serra concedeu o mesmo benefício para o pastor Samuel Ferreira e a mulher Keila, também pastora, da Assembleia de Deus. Ferreira é investigado na Lava Jato suspeito de lavar dinheiro de propina para Eduardo Cunha (PMDB-RJ) por meio da igreja em Campinas.
Apesar da repercussão negativa do caso, a Justiça de São Paulo negou o pedido liminar para a suspensão dos passaportes diplomáticos de ambos, também solicitado em uma Ação Popular de Ricardo Nacle. Foi a primeira vez, desde o começo da Lava Jato, que um investigado sem prerrogativa de foro recebeu o benefício dado a autoridades.
Segundo o Itamaraty, a política de conceder os passaportes a líderes evangélicos busca dar igualdade de tratamento às diferentes religiões, já que líderes católicos recebem o documento também. A gestão de Serra, contudo, já informou que pretende reavaliar as políticas de concessão de passaportes diplomáticos.
A reportagem encaminhou e-mail para a assessoria de R. R Soares e para a Advogacia-Geral da União, que representa a União na ação popular, mas ainda não obteve retorno.
Créditos: ESTADO DE MINAS