Jornalista vai "reaver" mandato do pai que foi cassado durante a ditadura militar

O jornalista Abelardo Jurema Filho, que assina coluna de repercussão no jornal “Correio da Paraíba” irá a Brasília na próxima quinta-feira para participar da solenidade de devolução simbólica, pela Câmara Federal, do mandato de deputados cassados durante a ditadura militar instaurada em 1964. Jurema Filho representará na cerimônia o seu pai, Abelardo Jurema, uma das grandes figuras do cenário político brasileiro no século 20, que ocupou mandatos de deputado e senador, foi líder de Juscelino Kubitscheck no Congresso e Ministro da Justiça no governo João Goulart. Natural de Itabaiana, onde chegou a exercer a função de prefeito nomeado, o ex-Ministro Abelardo Jurema teve os direitos políticos cassados por dez anos e foi obrigado a buscar asilo na embaixada do Peru, no Rio de Janeiro, onde permaneceu 35 dias, dela saindo com destino a Lima, capital daquele país, onde começou uma fase de exílio e de imensa melancolia, pelas saudades da família e do convívio em sua própria terra.

A devolução dos mandatos terá caráter simbólico e de resgate, como explica a deputada federal Luíza Erundina, nascida em Uiraúna, na Paraíba, e integrante da bancada do PSB por São Paulo. Numa sessão embalada pelo Hino Nacional, interpretado por um cantor lírico, a Câmara dos Deputados, no próximo dia seis, “devolverá” o mandato a parlamentares cassados, muitos dos quais se farão representar por familiares, a quem serão entregues o diploma e o broche típico. “É uma forma de a Câmara devolver ao povo o mandato que os torturadores usurparam de seus representantes”, comenta Luíza Erundina, arrematando: “É o mínimo que podemos fazer agora, enquanto não aprovam a mudança na Lei da Anistia”. O jornalista Jurema Filho não esconde a sua emoção em participar da cerimônia. Ele é autor do livro “Cesário Alvim, 27 – Histórias do filho de um exilado”, narrando a odisseia da família, vivenciada nos momentos dramáticos da manhã de 31 de março de 64, quando irrompeu o golpe militar.

O ex-Ministro Abelardo Jurema, para sobreviver em Lima, teve que vender charutos e farinha de peixe. Anos depois, chegou a ser corretor de incentivos fiscais na área da Sudene, recebendo a ajuda de devotados amigos, entre os quais Adolpho Bloch, Antônio Galotti e Fernando Cunha Lima. Curtiu o seu tempo de exílio com discrição, dignidade e decência. Enquanto isso, seu nome era quase proibido de ser citado. Seus filhos receberam a orientação de endereçar cartas a um certo Alberto Araújo, tementes de que a correspondência fosse aberta e censurada pelos órgãos da repressão. Abelardo Jurema projetou-se no plano nacional a partir de 1950, como suplente do senador Ruy Carneiro, a quem substituiu durante uma licença de seis meses. Elegeu-se deputado federal em 1958 e líder do PSD no governo de JK, enfrentando a aguerrida bancada da UDN, de que faziam parte Carlos Lacerda, Adauto Lúcio Cardoso, Prado Kelly, Aliomar Baleeiro, Afonso Arinos, Odilon Braga e Oscar Corrêa. Integrou a delegação brasileira numa Assembléia Geral das Nações Unidas em Nova Iorque, quando emitiu voto favorável à independência das colônias portuguesas na África.

A deputada Luíza Erundina teve problemas para materializar a sessão em homenagem à memória dos políticos cassados pela ditadura. O presidente da Câmara Federal, Marco Maia, demorou a dar o aval à sessão solene idealizada por ela e requerida pelo primeiro-secretário Eduardo Gomes, do PSDB do Tocantins. A assessoria do presidente revelou que o pedido teria sido formulado tardiamente e, por uma questão de calendário, havia sido decidido priorizar a votação de matérias. Luíza Erundina não se intimidou com os obstáculos e chegou a denunciar, num evento na Ordem dos Advogados do Brasil, a má vontade que o Legislativo sempre teve em investigar sua história. Diante da repercussão negativa, o presidente Marco Maia acabou deferindo a sua solicitação. A deputada socialista tem sido intransigente na defesa da apuração de fatos relacionados com a ditadura militar que, na sua opinião, significou um período de trevas na história política do país. Daí o seu apoio incondicional à iniciativa da presidente Dilma Rousseff em instituir a Comissão Nacional da Verdade para investigar episódios ocorridos entre 1945 e 1985. Mas Luíza Erundina tem sido crítica em relação à lentidão no andamento dos trabalhos da Comissão e, sobretudo, quanto à obtenção de resultados concretos. Para ela, o resgate de fatos que abalaram o cenário nacional é um dever do Poder Público e do Congresso para com a sociedade, que foi duramente reprimida nos anos de chumbo da ditadura militar.

Do Blog com RepórterPB