Dilma virá arrastada pelas chuvas

Gilvan Freire

Só um acidente maior do que a torção sofrida no pé (não desejada por ninguém na Paraíba) pela presidente Dilma, sobrestará sua vinda ao Estado no princípio do mês de março. Se depender de chuva, que é a maior salvaguarda dela para cobrir sua ausência e gravíssimas omissões perante o povo nordestino, nesse longo período de calamidade e colapso da economia agrícola, o céu promete o socorro que ela negou às populações sofridas: a água. É sempre assim: Deus chega ou para punir o povo pela sua incapacidade de reação diante dos líderes ruins que elege, ou para salvar-lhe a pele quando estiver à beira do abismo crucial da seca mais cruenta. E nem Deus tem abandonado de todo seu povo indolente e nem o povo tem abandonado o servilismo com que trata seus algozes. Mas já foi pior.

A submissão congênita do nordestino aos poderosos de plantão, ou o complexo de escravidão, pode ser medida pelas opiniões manifestadas na imprensa de que a presidentA (com o A de ausente), deverá ser recebida com educação e civilidade, quando vier à Paraíba. Isso é deprimente. É um caldo de cultura fisiológica e da sujeição humilhante da região aos senhores do engenho e dos feudos políticos. Senhor (com o ‘S’ maiúsculo) tem piedade de nós, filhos teus mas servos de outros homens!

O JORNALISTA PAULO SANTOS pinçou em sua coluna do dia 18/02 a opinião de Élio Gáspari na Folha de São Paulo sobre a seca. Alguns paraibanos morrerão de vergonha, se lerem. Disse Paulo, remetendo ao famoso jornalista brasileiro:

“A seca chegou a um dos espaços mais nobres da imprensa brasileira: a coluna do jornalista Élio Gáspari na Folha de São Paulo. É um dos profissionais mais conceituados deste país, atento aos problemas nacionais e com senso crítico incomum. O trecho abaixo é reprodução do que está publicado neste domingo (17).”

“Desde o ano passado o semiárido nordestino atravessa uma grave seca. Na Bahia, Sergipe, Alagoas e Maranhão, 75% dos municípios estão em estado de emergência. No Ceará, são 177 em 184. Lá, as chuvas do ano passado ficaram em metade da média habitual e neste ano estão abaixo do terço (55,1 milímetros contra 161,8). Há 136 municípios dependendo de carros-pipa para atender perto de um milhão de pessoas. Em algumas cidades as escolas dependem do socorro de vizinhos.

Os investimentos feitos na região mostraram-se insuficientes para enfrentar uma calamidade natural que, segundo os meteorologistas, tende a se agravar. Estima-se que as chuvas deste ano serão poucas.

A mais vistosa ação do governo federal tem sido um filme de um minuto que a Secom botou nas televisões da região. Nele, “Chambinho do Acordeon”, feliz e sorridente, anda pela caatinga informando que “a seca sempre vai existir, mas o sertanejo vai poder se defender cada vez mais dela”. Cantando louvores aos investimentos feitos pelo governo, informa que “o sertanejo é um cabra forte, só precisa de apoio, e vai ter cada vez mais”.

Os sertanejos que estão sem o abastecimento de carros-pipa não precisam de propaganda. O que lhes falta é água. Esse tipo de marquetagem no meio de uma seca chega a ser deboche. Para falar sério, o aparelho de autoglorificação da doutora Dilma deveria anunciar, ao fim de cada clipe, quanto gastou na marquetagem e quantos carros-pipa ela pagaria.

Durante a seca de 1998, Lula visitou o interior do Ceará acompanhado de José Genoino, cuja família morava em Jaguaruana. Culpou a desatenção dos tucanos e prometeu rios de mel. Nas palavras de Nosso Guia: “O sofrimento do povo nordestino só vai acabar no dia que a gente tiver políticas de investimento para tornar esta terra produtiva. E essas políticas o PT tem”. Qual era? “O Fernando Henrique veio ao Ceará na campanha de 1994 e prometeu transpor as águas do rio São Francisco. Mas até agora não trouxe sequer um copo de água. Ele foi mentiroso e vai mentir de novo prometendo a obra para ganhar voto”. Em 2003, eleito, Lula prometeu: “Nesses quatro anos, 24 horas por dia serão dedicadas para fazer aquilo em que acredito: a transposição das águas do rio São Francisco”. Ficou oito anos, a doutora Dilma juntou mais dois e depois de dez anos o “copo de água” ainda não apareceu.

A opção preferencial dos governos pela propaganda e pelos espetáculos criou um novo estilo de administração e nele o governador do Ceará, Cid Gomes, tem se revelado um talento à altura de Steven Spielberg. No ano passado, a Viúva entrou com boa parte do custo da festa de inauguração de um centro de convenções abrilhantado pelo tenor espanhol Plácido Domingo. A tertúlia custou R$ 3,1 milhões e alegrou 3.000 convidados.

Até aí tudo bem, pois de fato havia um centro de convenções. Em janeiro passado ele pagou um cachê de R$ 650 mil à cantora Ivete Sangalo para lustrar a inauguração do Hospital Regional Euclides Ferreira Gomes, em Sobral, berço político de sua família desde a Proclamação da República. Cadê o hospital?

Houvera o show, o prédio estava pronto, mas não havia funcionários. Até hoje ele funciona como posto de saúde, só com consultas e raios-x. Hospital mesmo, só em maio.

Assim como a Secom poderia investir em carros-pipa o que gasta em propaganda, Cid Gomes poderia ao menos fazer a caridade de só patrocinar shows quanto tiver serviço para entregar.”