Dilma reage para sair do “inferno astral”

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Nonato Guedes

Enfrentando as piores semanas do seu governo, a presidente Dilma Rousseff viu-se na contingência de tomar medidas para conter a onda de protestos reivindicando melhorias nos serviços públicos e moralização dos costumes políticos. Os focos de violência que eclodiram em manifestações misturaram-se à inflação em alta e queda de popularidade da presidente petista. Dilma montou uma espécie de gabinete de crise e rompeu o isolamento em que se encontrava no Palácio do Planalto, convocando dirigentes do Congresso, governadores e prefeitos, representantes de entidades da sociedade civil, no esforço de preparar uma agenda de emergência para atender aos reclamos populares. Em outra frente, a presidente agiu no sentido de abafar o coro de “Volta, Lula”, ensaiado em hostes do Partido dos Trabalhadores, tendo como pano de fundo a disputa presidencial de 2014.

Analistas políticos avaliam que desde o escândalo do mensalão em 2005 o Partido dos Trabalhadores não enfrentava um desgaste tão grande e que a tática da presidente Dilma consiste em tentar virar o jogo e traçar uma rota para o seu projeto de reeleição no próximo ano. Dentro dessa operação figuram ajustes na economia e mudanças no núcleo político que a assessora no Planalto, o que está sendo aguardado concretamente para este segundo semestre. Habituada a centralizar decisões e formular sozinha as principais diretrizes de política e economia, Dilma ficou com a imagem sensivelmente arranhada, de que foi exemplo o coro de vaias ensaiado ainda na abertura da Copa das Confederações. Um ponto parece definido: a presidente pretende tornar periódicas as reuniões com movimentos sociais, além de investir numa espécie de “concertação” com o Legislativo e o Judiciário para o pacto nacional de mobilidade urbana, mobilizando-se as forças ativas da sociedade brasileira.

Internamente, a presidente não escondeu seu desapontamento com a falta de agilidade dos serviços de inteligência do governo, que se revelaram incapazes de fornecer com antecedência informações sobre os rumos da mobilização que se desencadeava no país. O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general José Elito Siqueira, tornou-se uma peça obsoleta na estrutura palaciana e ficou fora das reuniões em que Dilma ainda avaliava a oportunidade de fazer um pronunciamento à Nação e o tom que esse pronunciamento deveria conter. Nem mesmo a articulação através de redes sociais, a que qualquer um pode ter acesso, foi objeto de atenção da tropa do general Elito, como informa o jornal “O Estado de São Paulo”. A presidente teria manobrado, também, com vistas para diminuir a influência do ex-presidente Lula no chamado núcleo duro do Palácio do Planalto. Foi nesse contexto que o ministro Gilberto Carvalho, até então um interlocutor do diálogo com movimentos sociais, ficou igualmente isolado. Carvalho é bastante ligado ao ex-presidente da República e evitou passar recibo do isolamento a que foi conduzido nesse processo.

A colunista da “Folha on line” Eliane Cantanhêde observou que além do tomate havia um outro grande ausente do cenário nacional: o ex-presidente Lula. “O Brasil ficou de pernas para o ar, os Poderes ficaram atônitos diante da maior manifestação em décadas, mas o personagem mais popular do país, famoso no mundo inteiro, praticamente não disse nada até as últimas horas”, comentou Eliane, adiantando que essa postura confirmou uma sábia ironia do senador e ex-petista Cristovam Buarque: “Tudo o que é bom foi Lula quem fez; o que dá errado, a culpa é dos outros”. O jornal “O Globo”, por sua vez, revelou que Lula foi surpreendido pelos protestos e nos últimos dias manteve um encontro com líderes de movimentos sociais, no qual convocou os jovens para irem às ruas. Quinze lideranças teriam participado de um encontro anteontem na sede do Instituto Lula, no bairro do Ipiranga, em São Paulo. Estopim para a onda de protestos, o Movimento do Passe Livre não foi convidado. Jovens de grupos como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, União da Juventude Socialista e Conselho Nacional da Juventude participaram da conversa. Lula teria chamado os movimentos de que tem mais proximidade. Queria ouvir, colher impressões. Deixou claro que a hora é de ir para as ruas enfrentar politicamente a direita e empurrar o governo para a esquerda. No depoimento de um dos participantes, Lula agiu mais como um líder de massas do que como um aliado do governo.