O empreiteiro Emílio Odebrecht afirmou não ter dúvidas de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pressionou para que o BNDES aprovasse o financiamento do Porto de Mariel em Cuba. Em depoimento ao Ministério Público Federal (MPF), ele contou como a empresa foi envolvida no negócio e também como ele mesmo inseriu o governo brasileiro nisso.
Segundo o empresário, o ex-presidente da Venezuela Hugo Chávez pediu que a empresa construísse o porto. Odebrecht explicou que, além do venezuelano ser muito próximo do cubano Fidel Castro, Chávez também tinha interesses políticos.
— Para ele (Chávez) interessava a medida, porque ele tinha esse antagonismo com os Estados Unidos. Determinadas eminências pardas eram fundamentais. Foi muito mais uma estratégia de fortalecimento dele, de contraponto para ele, do que propriamente dito ideológico — justificou Emílio. — Ele (Chávez) nos pediu que pudéssemos viabilizar a história de um porto.
Aos procuradores, o empreiteiro afirmou que disse a Chávez que encontraria uma forma de atender ao seu pedido. No entanto, frisou que precisaria que o governo brasileiro estivesse engajado nessa empreitada e que também solicitasse à Odebrecht para realizar a obra.
— Eu não gostaria de estar tomando a iniciativa e o senhor, que tem uma boa relação com o presidente Lula, podia ligar para ele e transmitir isso. De fato, ele (Chávez) fez. E eu estive com o Lula. Fui convocado pelo Lula dizendo que tinha recebido um telefonema do Chávez, transmitindo um encontro que tinha tido comigo e que ele estava dentro da linha de apoiar o programa de Cuba do Porto de Mariel — contou o empresário.
Os procuradores questionaram se o ex-presidente Lula teve ingerência no BNDES para a liberação do empréstimo. Ele respondeu:
— Eu não tenho dúvida nenhuma. Eu diria que o BNDES jamais, nem nós próprios, levaríamos um assunto de financiamento do BNDES para Cuba. Não estava dentro dos nossos planos e nem dentro das diretrizes do BNDES.
Imediatamente, os investigadores perguntaram se, numa situação normal, o BNDES não faria. O empreiteiro foi direto:
— Nem a Odebrecht, nem o BNDES. Numa condição normal, nem a Odebrecht, nem o BNDES. Eu não tenho dúvida quanto a isso. Houve um interesse de governo. Não foi só o pedido do Chávez — disse, numa referência à proximidade de Lula e Fidel.
Emílio Odebrecht afirmou que Chávez teve de dar petróleo venezuelano como garantia dos empréstimos.
— Não é fácil encontrar garantias num país como Cuba. Se fosse botar como garantias os charutos, ia levar 50 anos — brincou.
Ele fez questão de ressaltar que a pressão política não significa frouxidão nos processos de financiamento do BNDES.
— Pressão, eu acho que teve. Ao meu modo de ver, se é legítima ou não, não vou entrar nesse mérito. Mas tenho certeza que houve, porque as prioridades de governo traduziam-se em pressão junto às instituições do próprio governo. O BNDES era uma. Agora, o BNDES abrir mão daquelas regras dele, acho muito difícil.
MERCOSUL E ANGOLA
Questionado se a empresa teve influência no processo de inclusão da Venezuela no Mercosul, Emílio Odebrecht disse que não. Falou que apoiaria, mas o governo brasileiro já tinha se movimentado sozinho para isso.
Os procuradores também perguntaram sobre a sua relação com José Eduardo Santos, presidente de Angola. Ele detalhou todo o trabalho da empresa naquele país. Falou que autorizou o “seu pessoal” para operacionalizar a atuação da empresa em Angola. No entanto, ele não detalhou ilícitos. Falou apenas que tinha consciência e endossou a atuação.
— Sem dúvida nenhuma, houve coisas que foram feitas, eu soube que foram feitas… Não tinha domínio de cada uma delas, mas estimulei meu pessoal a transmitir.
Fonte: O Globo