De vidraça a estilingue

Paulo Santos

Grave, mas muito grave mesmo, a acusação feita pela secretária de Saúde da Prefeitura de João Pessoa, Roseana Meira, de que o Hospital de Trauma e Emergência “Senador Humberto Lucena” estaria rejeitando pacientes para sobrecarregar o chamado Trauminha, de Mangabeira, administrado pelo condomínio municipal.

A secretária tentou, com uma simples entrevista a um programa de rádio, passar de vidraça a estilingue, isto é, deixar de ser o alvo permanente de denúncias a respeito do agonizante sistema municipal de saúde na Capital, transferindo a culpa de todas as mazelas ao Estado. A culpa pode ser dos problemas recentes, mas isso não exime a PMJP de parte da culpa pelos inúmeros contratempos enfrentados pela população para ter acesso à saúde.

Os PSFs, por exemplo, não ficaram sem médicos recentemente. Surpreendente é que, depois de tantos anos, a secretária Roseana Meira tenta arquitetar um discurso otimista, desenvolvimentista, como se apresentar esta ou aquela obra viesse a encobrir todas as falhas existentes. Melhor seria se assumisse um discurso humilde, fizesse um mea culpa e admitisse que as gestões mais recentes falharam.

Só quem não vê que a saúde em João Pessoa – como em toda a Paraíba – está um caos quem ainda não precisou. Tanto faz ir ao Trauminha como chegar ao “Edson Ramalho” é a mesma coisa, ou seja, as deficiências ficam evidentes. É algo tão óbvio que chegaa ser ululante, mas isso não sensibiliza os responsáveis por esse setor.

Não é apenas o confronto político que está deixando a saúde na UTI. Pode se dizer que isso “também” influi. O que causou esse caos foi a politicagem, o despreparo emocional, a arrogância, a prepotência, o descaso com princípios mínimos de respeito à população. Gerenciar saúde não é coisa para leigos. É coisa para especialistas.

O que se sabe, mas a maior parte da imprensa se cala devido aos interesses escusos que a movem, é que existia um pacto de compadrio na administração municipal. E isso não atingiu apenas a saúde, mas outros setores que hoje também padecem de sérios problemas. E essa cultura maldita vem sendo disseminada.

É surpreendente, também, que a secretária de Saúde de JP, Roseana Meira, faça publicamente uma denúncia tão grava e, 24 horas, o Ministério Público e a Câmara Municipal de João Pessoa – responsáveis ela fiscalização do poder pública – ainda não tenham requisitado a gravação do programa para analisar as acusações feitas ao Estado.

É surpreendente, ainda, que a secretária não venha a público para mostrar uma administração humana. Só fala de obras, de números, de recursos financeiros, os ditos “investimentos”. Em resumo: inexiste sensibilidade, comprometimento com a vida. Na Paraíba de hoje os contribuintes se dividem em dois segmentos: os ricos e os indigentes. Pobres e carentes, que viviam na faixa intermediária da população, estão anonimamente desaparecendo e virando estatística.