De Ruy a Lima Barreto

Rubens Nóbrega

“Rubão, já tenho um partido pra você: é o PQI – Partido das Quimeras Irrealizáveis”, ofereceu-me o amigo Ruy Barroso na manhã da última terça-feira (28 de maio), dia em que lancei neste espaço a minha plataforma de governo e me anunciei candidato à procura de um partido.

Ruy telefonou-me logo após a leitura do artigo intitulado ‘Sou candidato’, no qual assumi o compromisso de, se eleito, fazer da educação a prioridade zero do meu mandato. Para tanto, proponho um plano de carreira e remuneração do magistério que levará o professor com doutorado e dedicação exclusiva a ganhar igual a um desembargador do nosso Tribunal de Justiça.

Apesar da descrença de Ruy, outros amigos manifestaram apoio tanto à proposta de candidatura como à ideia de valorização salarial dos nossos mestres, processo que infalivelmente concorrerá para a oferta de uma educação pública de qualidade em larga escala. A partir dela, não tenham dúvida, o Estado ingressará num ciclo virtuoso de crescimento humano e material jamais visto na história da Paraíba e do próprio Brasil.

Professor Menezes foi dos primeiros a aderir à causa. Em seguida, Gonzaga Rodrigues, nosso cronista-maior, outro que desde jovem prescreve educação como poderoso elixir para curar atraso de qualquer povo. Tive ainda a felicidade de receber aplausos do amigo Dal, que garante me arranjar bem mais que dois ou três eleitores para “seguirmos juntos nessa mesma estrada”, como diz aquela canção do Roberto.

Outra manifestação que me encheu de orgulho (no melhor dos sentidos) traz a assinatura do Professor Márcio Luís de Oliveira Pereira. Ele resgatou e me presenteou com ‘O novo manifesto’, artigo de Lima Barreto publicado em 16 de janeiro de 1915 no Correio da Noite, do Rio de Janeiro.

O texto do genial escritor, que reparto com vocês adiante, é na avaliação do Professor Márcio uma prova de que mal a nossa história republicana alcançava dois decênios e já se estabelecia na política brasileira todos os impedimentos possíveis a que “pessoas com ideias para o bem do povo assumam cargos eletivos de relevo”.

Para mostrar que era assim já em 1915, vamos a Lima Barreto e à refinada ironia com que se apresentou ‘candidato’ aos seus (e)leitores. Deixo vocês na companhia desse monstro sagrado do jornalismo e da literatura brasileira. É com ele, a partir deste ponto.

O novo manifesto

Eu também sou candidato a deputado. Nada mais justo. Primeiro: eu não pretendo fazer coisa alguma pela pátria, pela família, pela humanidade. Um deputado que quisesse fazer qualquer coisa dessas, ver-se-ia bambo, pois teria, certamente, os duzentos e tantos espíritos dos seus colegas contra ele. Contra as suas idéias levantar-se-iam duas centenas de pessoas do mais profundo bom senso.

Assim, para poder fazer alguma coisa útil, não farei coisa alguma, a não ser receber o subsídio. Eis aí em que vai consistir o máximo da minha ação parlamentar, caso o preclaro eleitorado sufrague o meu nome nas urnas. Recebendo os três contos mensais, darei mais conforto à mulher e aos filhos, ficando mais generoso nas facadas aos amigos. Desde que minha mulher e os meus filhos passem melhor de cama, mesa e roupas, a humanidade ganha. Ganha porque, sendo eles parcelas da humanidade, a sua situação melhorando, essa melhoria reflete sobre o todo de que fazem parte.

Concordarão os nossos leitores e prováveis eleitores que o meu propósito é lógico e as razões apontadas para justificar a minha candidatura são bastante ponderosas. De resto, acresce que nada sei da história social, política e intelectual do país; que nada sei da sua geografia; que nada entendo de ciências sociais e próximas, para que o nobre eleitorado veja bem que vou dar um excelente deputado.

Há ainda um poderoso motivo, que, na minha consciência, pesa para dar este cansado passo de vir solicitar dos meus compatriotas atenção para o meu obscuro nome. Ando mal vestido e tenho uma grande vocação para elegâncias. O subsídio, meus senhores, viria dar-me elementos para realizar essa minha velha aspiração de emparelhar-me com a deschanelesca elegância do senhor Carlos Peixoto.

Confesso também que, quando passo pela Rua do Passeio e outras do Catete, alta noite, a minha modesta vagabundagem é atraída para certas casas cheias de luzes, com carros e automóveis à porta, janelas com cortinas ricas, de onde jorram gargalhadas femininas, mais ou menos falsas. Um tal espetáculo é por demais tentador, para a minha imaginação; e, eu desejo ser deputado para gozar esse paraíso de Maomé sem passar pela algidez da sepultura.

Razões tão ponderosas e justas, creio, até agora, nenhum candidato apresentou, e espero da clarividência dos homens livres e orientados o sufrágio do meu humilde nome, para ocupar uma cadeira de deputado, por qualquer Estado, província, ou emirado, porque, nesse ponto, não faço questão alguma. Às urnas.

Escritor estreante

Lanço amanhã meu primeiro livro – ‘Histórias da Gente’ – às 18h no auditório da OAB-PB, Centro da Capital. Todos estão convidados a comparecer e ler o que gostaria de fazer sempre: contar histórias simples ou extraordinárias, engraçadas ou tristes, verdadeiras ou inventadas, da gente boa da Paraíba.

Tal e qual o leitor poderá encontrar na obra da minha estreia no ofício de escritor, ao qual pretendo me dedicar com regularidade, doravante. Mesmo que venha a ser candidato e eleito. Afinal, tem gente que acumulou e deu muito certo nas duas funções.