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Cuiá II - Rubens Nóbrega

O negócio pode vir a ser bom para o Estado, mas, do jeito como foi e está sendo encaminhado, o que o governador Ricardo Coutinho deve chamar de ‘republicano’ eu chamo de Novo Cuiá. Refiro-me à troca de um terreno em Mangabeira, onde funciona a Academia de Polícia, por outro no Geisel, onde ainda não funciona nada.

Sua Excelência deve chamar o negócio de ‘republicano’ porque, conforme disse ontem em seu programa de rádio, a transação é ‘correta e justa’, embora o terreno de Mangabeira seja duas vezes maior e dez vezes mais caro que o terreno do Geisel.

Segundo avaliações divulgadas ontem, o terreno da Acadepol mede 9 hectares e valeria R$ 135,9 milhões. Já o terreno do Geisel mede 4,5 hectares e valeria R$ 13,5 milhões. A diferença é de R$ 122,4 milhões, portanto.

Ah, mas aí vai ser bom para o Estado, dizem Ricardo e os ricardistas, porque o empresário que ficar com o terreno de Mangabeira vai construir no terreno do Geisel uma nova Acadepol, um novo Instituto de Polícia Científica e uma nova Central de Polícia.

Nesse caso, deve ser mesmo bom para o Estado. Porque nem os prédios-sede da norte-americana CIA e da britânica Scotland Yard, juntos, valeriam R$ 122,4 milhões.

Esse novo complexo ou shopping center da segurança pública deve ser mesmo coisa do outro mundo, então. Deve ser coisa de um planeta chamado Girassol, que gravita em torno de um sol chamado Ricardo Coutinho.

O que daria para construir

Se valerem as explicações dadas ontem pelo astro-rei e os valores levantados pelo inexcedível Clilson Júnior, o empresário que pegar essa boquinha vai investir no Geisel uma grana que daria para realizar, entre outras, as seguintes obras:

• um shopping center do tamanho do Manaíra Shopping ou, pretensamente, do tamanho daquele que o empresário Roberto Santiago pretende construir em Mangabeira, no terreno que seria – exatamente – o da Acadepol;

• seis hospitais de emergência e trauma de 22,5 mil metros quadrados de área coberta, cada, do tamanho do HT que está prontinho para funcionar em Campina Grande, mas que só entrará em funcionamento quando o povo esquecer que foi concluído no governo anterior;

• dois hospitais de emergência e trauma com as mesmas dimensões do HT campinense completamente equipadinhos da silva ou – vejam só! – 397 Unidades de Saúde da Família (USFs) no padrão daquelas que estão sendo construídas pela Prefeitura de João Pessoa;

• quinze escolas de tempo integral com capacidade para 400 alunos, cada, semelhante àquela que a Prefeitura da Capital inaugurou recentemente no Bessa, com dois pavimentos, dez salas de aula, laboratórios de informática, de ciências, sala de artes, de vídeo, biblioteca, banheiros, administração, diretoria, sala de professores e secretaria, além de ginásio de esportes completo, do vestuário aos banheiros, da arquibancada à cobertura;

• cinco conjuntos habitacionais com cerca de 1.330 casas, cada, dotados de toda a infra (saneamento básico, ruas pavimentadas e urbanizadas), além de uma escola de nível fundamental (até a nona série), de um Centro de Referência de Educação Infantil (Crei), de uma Unidade de Saúde da Família (USF) e de uma praça, isto é, todos iguais em tudo e por tudo ao Gervasão, construído na Capital em 2007;

• duas e meia estações ciências; três viadutos com todo o entorno de acesso incluído, tipo Via Jaguaribe; meio estádio de futebol do porte do Verdão, de Campo Grande, que dá a Mato Grosso o passaporte para ser uma das sedes da Copa do Mundo de Futebol em 2014;

• um novo Sistema Camará e meio, vez que ao custo de R$ 82,5 milhões o governo federal patrocinará a reconstrução da barragem de Camará, mais a construção da barragem de Pitombeiras e pelo menos 11 adutoras para levar água boa e tratada para 21 municípios do Brejo e do Planalto da Borborema.

Porque lembra o Cuiá

A amiga ou o amigo aí pode aumentar e completar a lista de obras que poderiam ser construída com a baba dos R$ 122,4 milhões. Fique à vontade. Basta fazer uma pesquisa no Google e sair catando o valor de obras de grande porte que poderiam ser financiadas com a montanha de dinheiro que seria o troco da troca dos terrenos.

Quanto à comparação com o Cuiá (ou a lembrança de) é porque esse negócio dos terrenos me lembrou aquele outro que compreendia uma área de preservação permanente e foi desapropriada e indenizada por R$ 11 milhões, ano passado, véspera de eleição, pela PMJP.

No terreno do Cuiá, segundo especialistas em Direito Ambiental, a Prefeitura não tinha que ter gasto uma ruela sequer porque as APPs são inindenizáveis, ou seja, a rigor, mesmo dentro de uma propriedade privada, não podem ser mexidas nem negociadas pelo dono. Não podem ser compradas nem vendidas, nem desapropriadas e indenizadas pelo poder público.
Como sempre disse, é como se a a presidente Dilma desapropriasse e pagasse por um pedaço da Amazônia brasileira. De modo assemelhado, o terreno do Geisel não poderia ser dado em troca por outro do Estado porque ao Estado o imóvel do Geisel pertenceria.

Consta que foi cedido pela Companhia de Industrialização do Estado da Paraíba (Cinep) a um particular, sob a condição de em determinado prazo ele instalar no local um empreendimento comercial ou industrial. Como o prazo ter-se-ia expirado e nada foi feito, a área teria que ser reincorporada ao patrimônio da Cinep.

Bem, mas esse é apenas um detalhe ainda pouco ou nada esclarecido dessa história. Uma história tão nebulosa quanto a do Cuiá, onde o prometido parque ecológico não saiu da placa que se desmancha em ferrugem à beira da estrada que leva ao Valentina de Figueiredo.

Duvido muito que no Geisel surja uma obra que custe R$ 122,4 milhões, toda ela financiada por capital privado. Por essa e outras, a transação dos terrenos nada tem de republicano nem terá, em razão dos fatos e dos mistérios com que o governo entabulou o troço.

Afinal, para ser republicana, mulher de César legítima, a troca teria que ter sido precedida no mínimo de amplo conhecimento e debate por parte da opinião pública e de suas representações mais legítimas.

Mas isso é tudo o que não foi esse negócio mal explicado, mal divulgado e mal encaminhado. Tudo foi feito de um modo que não passam de fumaça a transparência e a boa governança tão presentes no discurso e tão ausentes na prática de Sua Excelência, o Senhor Governador do Estado.