EDITORIAL O ESTADÃO
Nos jogos da Copa, cerca de meia hora antes do chamado pontapé inicial, as seleções entram em campo, ainda de agasalho, para uma sessão de aquecimento e bate-bola. Voltam em seguida aos vestiários de onde emergirão mais adiante, prontas para o confronto. Na política, a primeira fase dessa sequência se deu no domingo sem futebol, quando começou oficialmente a campanha para as eleições de 5 de outubro. Com a diferença de que o aquecimento – no caso, os movimentos iniciais dos competidores para a arquibancada apreciar – pode incluir, desde logo, topadas entre eles.
O tucano Aécio Neves, por exemplo, que significativamente escolheu a cidade de São Paulo para pisar o terreno, acusou a presidente Dilma Rousseff, sem citá-la, de tentar extrair ganhos políticos da Copa e, já agora, da Olimpíada do Rio, em 2016. Foi só uma flexão de músculos, aproveitando o tema da hora. De seu lado, a dupla Eduardo Campos e Marina Silva, do PSB, partiu literalmente para o ataque. No Distrito Federal, onde ela terminou o torneio de 2010 em primeiro lugar, com robustos 42% dos votos, focalizaram o lixo a céu aberto na favela de 100 mil moradores que percorriam, “a 35 quilômetros do Palácio do Planalto”, apontou o pernambucano, para responsabilizar o governador local, do “mesmo partido” da presidente.
Foi ela, de qualquer forma, quem deu a pista mais nítida do esquema tático que adotará tanto neste período de ensaios e ajustes de lances quanto, principalmente, naquele comparável aos embates propriamente ditos da Copa: a temporada de propaganda na TV e no rádio, a se iniciar em 19 de agosto. A presidente preferiu se mostrar no site da campanha a fazer contato direto com o povo, cuja “força” dá o nome à sua chapa com o vice peemedebista Michel Temer. Depois de dar um chute a esmo com a platitude de que “esta vai ser uma das campanhas mais politizadas da nossa história”, equiparou-a a “apenas uma etapa da luta incessante que nós do PT e partidos aliados estamos fazendo para mudar para melhor o Brasil”.
Removida a gordura retórica, fica a “etapa” a indicar que Dilma buscará fundir a sua imagem com a de seu muito mais popular patrono Luiz Inácio Lula da Silva para encobrir a reprovação ao seu próprio desempenho, atestada pelas pesquisas, com os índices estelares de apoio que permitiram ao ex-presidente eleger o “poste” que chefiava o seu Gabinete Civil e deixar o Planalto consagrado. Mas não será um truque de fácil execução. Dilma não pode nem submergir na figura de grande líder político – o que faria o eleitor se perguntar por que, então, dar-lhe mais quatro anos – nem pode fazer crer, apesar dos malabarismos de marquetagem, que o seu quadriênio foi tão bom para o povo como qualquer dos mandatos de Lula.
A inflação renitente, o emprego começando a arrebentar nas costuras e o estado calamitoso dos serviços públicos contra o qual se insurgiram as jornadas de junho do ano passado – e a incompetência gerencial que está longe de ter sido fabricada pela mídia elitista – tolherão as embaixadas que a candidata gostaria de fazer no seu excessivo tempo de propaganda – quase a metade (11m24s) dos 25 minutos disponíveis, duas vezes ao dia, três vezes por semana, além dos spots. Aécio ficou com 4m37s, enquanto Eduardo Campos terá praticamente 2 minutos para vencer o desafio de se tornar conhecido. (No provável segundo turno dos pesadelos da presidente, os tempos são iguais para os finalistas.)
“Muda, Brasil” é o nome da chapa tucana – que vai ao encontro da aspiração compartilhada por mais de 2/3 do eleitorado, segundo as pesquisas. E a própria Dilma apareceu no site da reeleição falando que o PT (ou seja, Lula) e aliados “lutam” para mudar para melhor o Brasil. Não será difícil para Aécio cobrar de Dilma, no horário eleitoral, o que ela deixou de fazer nesse combate. A sua cartada será evidenciar que, diferentemente do criador, a criatura chega ao fim do mandato sem deixar nenhum legado, embora “tivesse tudo” para fazê-lo, como assinalou em entrevista ao Valor o seu candidato a vice, o senador paulista Aloysio Nunes Ferreira. Aécio não poderá, em todo caso, fazer apenas campanha negativa.
O Estado de S. Paulo