O delegado da PF (Polícia Federal) Luciano Flores assumiu o comando da superintendência da corporação no Paraná em fevereiro deste ano com a missão de dar continuidade à Lava Jato. Menos de seis meses depois, acompanha um inquérito que apura a suposta invasão de telefones celulares de membros da força-tarefa da operação e suas conversas com o ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça e chefe de Flores.
A invasão investigada pela PF seria a fonte do vazamento de mensagens privadas entre os membros do MPF (Ministério Público Federal) e Moro. Reveladas pelo The Intercept Brasil, elas indicam que o então juiz, que deveria ser imparcial no julgamento dos casos da Lava Jato, deu conselhos e sugestões àqueles que processavam investigados.
Flores, entretanto, não viu abusos ou excessos nos diálogos divulgados até então. Em rápida entrevista concedida ao UOL, ontem, o delegado disse que a troca de mensagens entre juízes, procuradores, advogados ou mesmo policiais é comum e, por vezes, importante para o trabalho de investigadores.
“Quando tem um caso que demande uma determinada prioridade, até para respeitar o princípio da oportunidade da coleta da prova, eu acredito que é necessário”, afirmou.
Flores ressaltou ainda que os diálogos divulgados foram obtidos de forma ilegal. Por isso, mesmo que fossem irregulares, a PF não poderia investigar se os envolvidos nele realmente cometeram um crime ou ilícito.
Reportagem divulgada pelo UOL no sábado mostrou que juristas criticam o fato de a PF não investigar o conteúdo das conversas entre membros da Lava Jato. Segundo especialistas, o Código de Processo Penal determina que a investigação de “fatos e circunstâncias” seria obrigatória, ainda que nenhum crime seja descoberto ao final.
Flores rebate: “Em se tratando de prova ilícita, a gente não pode iniciar uma investigação que supostamente envolveria mensagens entre vítimas, juízes ou procuradores, e aí, com base nesta prova ilícita, tentar apurar se o conteúdo é verdadeiro para tentar incriminar as vítimas”. Confira os principais trechos da entrevista.
UOL – Como a PF acompanha o vazamento das conversas de membros da Lava Jato?
Luciano Flores – Foram instaurados inquéritos para apurar a invasão criminosa de telefones de procuradores e juízes que atuaram na Lava Jato. A PF vem desenvolvendo investigações neste sentido. Com o fim de apurar os crimes correspondentes à invasão, a interceptação telefônica ou de mensagens eletrônicas das vítimas, que são, na maioria, os procuradores que atuaram na Lava Jato.
A PF está apurando também o conteúdo das mensagens, já que juristas apontam que elas podem tratar de ilegalidades?
Isso não é objeto da investigação até porque [as mensagens divulgadas] se trata de prova ilícita. Em se tratando de prova ilícita, a gente não pode iniciar uma investigação que supostamente envolveria mensagens entre vítimas, juízes ou procuradores, e aí, com base nesta prova ilícita, tentar apurar se o conteúdo é verdadeiro para tentar incriminar as vítimas. Isso, no direito brasileiro, não é admitido.
A PF não investiga o caso por considerar as mensagens uma prova ilegal?
No direito brasileiro, a prova ilícita, que é o produto de uma interceptação telefônica ilícita, não é válida. Como já foi dito por tribunais nas operações Castelo de Areia [2009] e Satiagraha [2008], se isso acontecer, toda a investigação é anulada.
Não seria possível iniciar uma investigação lícita sobre o caso? Chamar as pessoas para depor?
Sobre isso, não vamos nos manifestar no momento.
O fato de os procuradores não entregarem seus celulares para perícia não atrapalha a investigação?
Não há necessidade de perícia. A invasão dos celulares não se deu via aparelho, mas foi no sistema do Telegram [aplicativo de mensagens]. Fazer uma perícia nos telefones seria um trabalho improdutivo.
A comunicação informal entre polícia, MP e juiz é corriqueira?
É comum não só na área criminal como na área cível. Assim como os advogados, que fazem uma petição ao juiz, eu acredito que os membros do MPF e a própria PF, quando tem um caso que demande uma determina prioridade, até para respeitar o princípio da oportunidade da colheita da prova, manifeste isso.
Manifestação via mensagem de celular?
Manifestação via mensagem e email ou via qualquer sistema que fica registrado o pedido. Até oficializa melhor do que uma conversa telefônica, por exemplo. Ou mesmo uma conversa pessoal, a qual não é gravada. Quando os contatos se dão por mensagem de texto, por exemplo, isso fica registrado. Isso é mais transparente que uma conversa pessoal.
A PF usa mensagens para fazer pedidos a juízes?
Não posso afirmar que acontece via mensagens de celular, mas às vezes é necessário, no meio de uma diligência, fazer um pedido e encaminhá-lo pelo meio disponível à Justiça. No caso da Justiça Federal do Paraná, há o e-proc [sistema de processo eletrônico]. As nossas petições podem ser feitas no local da busca no próprio processo eletrônico.
Dentro do que foi divulgado, o senhor vê algum problema ou ilegalidade nas conversas?
Não vi problema nenhum. Não vi excesso nem nada de anormal.
Fonte: UOL
Créditos: UOL