Reeleição em 2012: Cerco aos prefeitos para coibir o uso da máquina pública

Um alerta para os prefeitos que disputarão a reeleição em 2012: os órgãos de controle como Ministério Público, Tribunal de Contas, Tribunal de Justiça e Tribunal Regional Eleitoral vão fechar o cerco ao uso da máquina pública. É o que garante o procurador-geral de Justiça, Oswaldo Trigueiro do Valle Filho. “Iremos, antecipadamente, eleger um calendário com todas essas instituições, para que os desvios sejam os menores possíveis”, afirmou. Segundo ele, a iniciativa partiu do presidente do TCE-PB, Fernando Catão.

Oswaldo Filho foi reconduzido ao cargo de procurador-geral de Justiça pelo governador Ricardo Coutinho (PSB). Ele foi o mais votado na eleição realizada pelo Ministério Público Estadual. Em entrevista exclusiva ao Jornal da Paraíba, ele fala de suas metas para a nova gestão e diz que o maior problema do Ministério Público Estadual é a falta de recursos. “A lei de responsabilidade fiscal nos engessou, pois a proporção de gastos com pessoal é escorchante”.

Sobre a polêmica do duodécimo, ele defendeu o diálogo entre os representantes dos poderes. “Precisamos ter diálogo e encontrar nossas saídas. Reuniões recentíssimas da Interpoderes apontaram para um amadurecimento de todos, e a reposição de perdas, que gera a tranquilidade dos envolvidos, mostra um caminho de estabilidade”, ressalta Oswaldo Filho.Ele fez ainda um balanço positivo das ações empreendidas pelo Ministério Público objetivando fazer com que as prefeituras paraibanas realizem concurso público em vez de contratar prestadores de serviço. “Foi uma aposta que deu certo. Estamos enfrentando uma endemia pública, ou seja, o vício de maus gestores, e aí falo de todos os níveis, que acreditam que a saída para se elegerem é simplesmente comprar o voto através do emprego fácil”.

O Ministério Público, segundo Oswaldo Filho, estará de olho nos concursos públicos oferecidos pelas prefeituras, “pois que existem desvios sérios de prefeitos e nós não iremos compactuar com isso”, destaca o procurador-geral de Justiça. Ele disse que a porta de entrada no serviço público é por meio do concurso. “Quanto mais qualificado o setor, mais cidadania teremos, e quem se beneficia é a própria sociedade, pois estamos premiando a meritocracia”.

 

ENTREVISTA

O senhor foi reconduzido ao cargo de procurador-geral de Justiça. O que significa comandar por mais dois anos a instituição?
Significa, primeiramente, ser um privilegiado. A instituição Ministério Público traz aos que militam na área jurídica uma ideia muito próxima de transformação social, da possibilidade de influenciar, de maneira decisiva, na modificação da paisagem, corrigindo ou diminuindo as distâncias e desigualdades. O fator de poder utilizar do princípio dispositivo, de provocação, é a base elementar de uma instituição forte e, acima de tudo, útil à sociedade. Estar à frente por mais dois anos é revelar o desejo de nossa classe de ver a continuidade de um trabalho de modificação de conceitos, de modelos, de linha de atuação. A responsabilidade é enorme, pois teremos que renovar os ânimos, e isso vem com a montagem de uma equipe comprometida com as mudanças que pretendemos continuar implantando na nossa casa. Os primeiros passos foram dados, mas muitos outros ainda precisam ser firmados, e assim o faremos.

O que não pode ser feito durante a sua gestão e quais as prioridades para essa nova fase?
Éramos uma promessa. As pessoas que assumiram a administração superior do MP tinham que dar certo. A pressão vinha justamente pelo fato de, pela primeira vez, termos a experiência de um promotor estar à frente da gestão, e isso era desafiador. Tínhamos a compreensão de que estávamos vivendo um período de transição, inclusive cultural. Modificar pessoas não é tarefa fácil, e ainda mais no ambiente público, onde existem as chamadas subculturas. Queremos com isso dizer que algumas situações não podiam ser implementadas de forma radical, mas sim gradualmente. Assim, diversos aspectos internos, de aperfeiçoamento da máquina, de encurtamento dos prazos, de metas e indicadores nos espaços administrativos, não foram totalmente inseridos, o que irá se verificar agora nesse novo biênio. No campo da atividade-fim, entendo que avançamos muito na área social, com as modificações estruturantes do setor, mas a parte criminal precisou de mudanças conceituais, a exemplo do controle externo que, apenas pontualmente aparecia. Precisamos de unidade de ação e não mais esforço pessoal e altruísta. Quando isso acontece é porque a máquina está com suas engrenagens desencontradas e cabe à administração corrigi-las. Vamos investir muito fortemente no combate ao crime, principalmente na área do tipo organizado. Crimes como corrupção, desvio de dinheiro público, sonegação fiscal, ilicitudes na área da administração pública receberão por parte do MP uma nova forma de atuação, e nisso podem apostar. Colocaremos as melhores energias de trabalho nesse setor, e, atrelado a um bem delineado plano de controle externo da atividade policial, de certo, estaremos colaborando para a redução dos índices de impunidade, e uma melhor convivência social. Uma sociedade mais tranquila é uma sociedade mais comprometida com sua própria evolução.

O Ministério Público da Paraíba já foi alvo de inspeção do Conselho Nacional do Ministério Público. Uma das irregularidades encontradas diz respeito à carência de membros do MP no interior do Estado? O problema ainda existe?
O CNMP, através de sua Corregedoria, deu uma grande contribuição ao aperfeiçoamento do MP paraibano. Aliás, a inspeção aqui realizada veio a pedido, pois tínhamos a necessidade de apoio às mudanças que estávamos imprimindo. Um dos pontos foi a carência de membros na Paraíba. São 78 vagas oficiais, mas esse número está distorcido, e digo a razão. As duas principais unidades de atuação do parquet em nosso Estado são João Pessoa e Campina Grande e, nessas duas unidades, estamos num trabalho de reengenharia institucional. Promotorias, no passado, eram criadas por obrigação de um dispositivo equivocado de nossa lei orgânica, onde, a cada vara criada no Judiciário, tínhamos que criar uma promotoria, e isso se revelou um tremendo equívoco. Temos atribuições que não caminham com as competências do Judiciário, e essa correção foi estabelecida, mas, de certo, tardia, daí por que temos hoje essas 78 vagas. O problema é, redimensioná-las, e isso não é tarefa fácil, pois pode interferir em garantias constitucionais de nossos membros, e isso é inegociável, são conquistas. A fórmula: transparência e estudo profundo para efetivar as mudanças e encurtar as vacâncias que, diria, na nova ordem, se resolvem com a entrada de, no máximo, 40 novos colegas. O concurso para 20 novas vagas está em tramitação e esperamos que no final de setembro possamos realizar a primeira etapa.

Que outras irregularidades apontadas na inspeção e cujas providências já foram tomadas?
A Corregedoria alcançou nossa instituição num momento de transformação, e isso em consonância com o pensamento nacional de modernidade dos Ministérios Públicos. Isso foi facilitador, tanto que estive pessoalmente na análise, pelo pleno do CNMP, de nosso relatório de inspeção e pude perceber que avançamos muito. O respeito à nossa instituição é outro e a nossa representação evoluiu bastante. As modificações nossas, repito, são estruturantes, que altera o modo de atuação da instituição para um patamar de maior resolutividade. Evidente que alguns pontos de atuações passadas foram encontradas, e, ao receber essas informações, as colocamos em níveis de procedimento que estão recebendo o tratamento devido, mas outros pontos, como nepotismo, desvio de função, quadro de servidores requisitados de outros órgãos, todos esses foram corrigidos, e isso recebeu elogios significativos pelo CNMP.

Em sua opinião, qual o maior problema que afeta hoje o Ministério Público Estadual?
Diria, sem sombra de dúvidas, que o maior dos desafios chama-se recursos. A lei de responsabilidade fiscal nos engessou, pois a proporção de gastos com pessoal é escorchante. O índice de 2% para esses gastos são incompatíveis com realidades nordestinas, ainda mais se falamos de uma Paraíba que não revela, há muitos anos, vocação além do serviço público. Quando um Estado da Federação aponta como sua principal receita o repasse do FPE é porque não existem outras saídas, e assim fica-se refém de uma base absolutamente pobre. O Judiciário tem 6% no limite de gastos, o que poderia sinalizar, num estudo proporcional, que o nosso percentual real haveria de ser entre 3% e 4%, e isso, nos gastos, faz uma enorme diferença. A Lei de Responsabilidade Fiscal é lei complementar à Constituição, mas é essa mesma Constituição que nos impõe, ao MP, tarefas de proximidade social. Defender essa sociedade na área de consumo, meio ambiente, patrimônio público e histórico, educação, saúde, cidadania, infância e ainda num espaço complicadíssimo de combate ao crime, nos leva a perceber que precisamos estar estruturados, e sem pessoal qualificado, membros e servidores, essa tarefa começa a perder o foco. Veja, cada promotor, na sua área de execução, se multiplica em tarefas, e sem uma estrutura de apoio, com assessores qualificados, não há como avançar. Não foram poucos os pedidos de nossos membros, clamando por assessoria. Vamos precisar de imprimir um forte choque de gestão para encontrar saídas, pois os avanços só chegarão nessa medida. Estaremos preparando para 2012 concurso para assessoria de promotor de Justiça, o que os dará um suporte importante.

O senhor anunciou que uma de suas metas é o combate ao crime organizado. Quais as armas que serão usadas para atingir esse objetivo?
Esta semana acordei com a seguinte notícia: “A juíza Patricia Acioli, da 4ª Vara Criminal, de São Gonçalo, foi assassinada no início da madrugada desta sexta-feira, com mais de 10 tiros, quando chegava em casa, em Piratininga, Niterói”. Patrícia era juíza engajada no combate ao extermínio no Rio de Janeiro, e a sua morte é um indício forte de que ali está havendo um enfrentamento severo. Não quero pregar o terror de que precisa morrer alguma autoridade para dizermos que estamos atuando, mas é importante perceber que há de se implementar uma nova lógica de atuação contra o crime organizado. Hoje presido a mais importante comissão do Ministério Público brasileiro no combate ao crime, que é o GNCOC, e pude perceber que muitas coisas devem ser mudadas, alteradas e corrigidas, a bem de um equilibrado tratamento a ordem criminal aqui na Paraíba. Qual a saída? Preparação, qualificação, investimento maciço em tecnologia, na Inteligência, na investigação. Articular as forças de combate, investir pesado em planejamento na área de segurança, premiar os bons policiais, punir os desvios de forma exemplar e buscar incentivos remuneratórios à altura dos riscos. A decisão é e tem que ser política. Investir nessa área é urgente e necessário. Precisamos, e estamos criando, um grupo especializado de estudo para respostas e propostas de mudanças legislativas que facilitem a atuação, não na linha de leis de emergência, de mais punição, porque isso nunca resolveu e não resolve, mas precisamos pressionar para que mecanismos processuais possam ajudar, e não incrementar o sentido de impunidade.

Qual o balanço que o senhor faz das ações empreendidas pelo Ministério Público objetivando fazer com que as prefeituras realizem concurso público em vez de contratar prestadores de serviço?
Foi uma aposta que deu certo. Estamos enfrentando uma endemia pública, ou seja, o vício de maus gestores, e aí falo de todos os níveis, que acreditam que a saída para se elegerem é simplesmente comprar o voto através do emprego fácil. Nisso percebemos também um equívoco profundo da própria sociedade que, em certos momentos, tem um discurso belíssimo de ataque a essas práticas, mas que insistem em, nos bastidores, se autobeneficiarem. Enfrentamos resistências de setores que nos impressionam, e aí entendemos o porquê de certas posições. Há de se entender que o concurso é a via mais apropriada para este ingresso, e quanto mais qualificado o setor, mais cidadania teremos, e quem se beneficia é a própria sociedade, pois estamos premiando a meritocracia. Hoje a Paraíba é o Estado que mais oferece emprego na área pública, e as vagas estão nas prefeituras. Importante dizer que também estamos de olho nos concursos oferecidos, pois que existem desvios sérios de prefeitos e dizer que com isso não iremos pactuar.

Ano que vem haverá eleição nos 223 municípios paraibanos. Existe já alguma orientação aos gestores no sentido de evitar o uso da máquina?
Os órgãos de controle irão se unir nessas próximas eleições. Ministério Público Eleitoral, Estadual, Tribunal de Contas e Poder Judiciário Eleitoral e Estadual irão fechar o cerco ao uso da máquina pública. A iniciativa veio do presidente do TCE, Fernando Catão, que nos propôs essa parceria e entendo mais do que necessária. Não podemos agir isoladamente, mas de maneira conjunta e uniforme. Iremos, antecipadamente, eleger um calendário com todas essas instituições, para que os desvios sejam os menores possíveis. Os promotores de Justiça, a cada eleição, recebem uma orientação da atualização da legislação eleitoral, e isso será também revertido aos gestores. Acredito que a receptividade será na medida do interesse dos gestores de boa-fé, e nisso devemos convocar as entidades que reúnem prefeituras para dar a legitimidade ao processo.

A questão do duodécimo afetou a relação do Poder Executivo com os demais poderes? Como o senhor se posiciona nessa discussão?
O duodécimo vem sendo repassado numa nova formatação, e a razão, temos que tratar isto com a realidade, foi a inexistência de critérios para estes repasses em 2011. Isto se deu face ao veto do Executivo, ano passado, que não foi derrubado pela Assembleia Legislativa. Com isso ficamos sem os percentuais este ano, e, de fato, para todos foi uma grande surpresa. O que iríamos aplicar como base de referência para os repasses? Não tínhamos qualquer critério legal, eis o impasse. Até entender toda essa lógica e, em meio a uma transição de comando no Executivo, muitos desencontros aconteceram, mas acredito que hoje estamos nos níveis de entendimento bastante satisfatórios, pois não interessa a ninguém desgastes na relação entre os poderes. Precisamos ter diálogo e encontrar nossas saídas. Reuniões recentíssimas da interpoderes apontaram para um amadurecimento de todos, e a reposição de perdas, que gera a tranquilidade dos envolvidos, mostra um caminho de estabilidade, além, evidente, da discussão sobre a próxima LDO e seus critérios. Estamos avançando, e bem, nessa relação, e o respeito aos interesses e necessidades dos poderes está sendo compreendido na proporção necessidade/possibilidade. Aposto, sem dúvida, que o diálogo está impondo níveis seguros para nossa relação, e com isso quem ganha é a sociedade paraibana.

O Ministério Público está tendo prejuízos com a redução do duodécimo?
Como disse, não temos percentuais fixados em 2011, e isso nos retira o argumento de dizer que tivemos perdas. Ora, se formos, por ilação, pontuar os percentuais do ano de 2010 fixados na LDO proposta em 2009, sem dúvida que teríamos prejuízos. O problema é que, legalmente, não existem critérios nem percentuais, o que nos impede de impor esta avaliação. Insisto, é preciso transparência nas regras e nos fatos, e estas, pela lei – regras – não existem e, nesses casos, cabe ao Executivo promover os repasses, constitucionais, no modelo e critérios por ele entendido como possível, e é aí que entra o diálogo, pois acredito que não deve ser interessante para o Executivo sufocar os poderes em suas necessidades, e esse caminho agora está sendo percorrido, o que irá gerar, como disse, o equilíbrio esperado por todos.

Há quem diga que existe nepotismo cruzado na Paraíba. O Ministério Público tem competência para fiscalizar os casos de nepotismo?
Evidente que sim, somos os fiscais da lei, mas é importante destacar que não temos a condição de descobrirmos tudo e a todos. Há de se ter uma cooperação da própria sociedade, imprensa e demais setores para que tais fatos nos cheguem. Claro que, paralelo a tudo isso, é preciso que o próprio Ministério Público desenvolva um programa de controle, junto com os demais órgãos a evitar tais disfunções. Estamos trabalhando junto à nossa comissão de combate à improbidade para instituirmos este novo modelo a partir dessa nova gestão.

O que o senhor acha do modelo atual de nomeação do procurador-geral de Justiça pelo governador do Estado?
O modelo é constitucional, e não cabe, por agora, discutir o que levou a Constituição a conferir essas prerrogativas ao chefe do Executivo. Na minha opinião, e esta é a orientação nacional do Ministério Público brasileiro, é que o chefe da instituição deveria ser simplesmente aquele que obtivesse o maior número de votos na escolha, pela classe, para o cargo de procurador-geral, sem a necessidade de opção pelo chefe do Executivo. Existem diversas emendas à Constituição no sentido de rever esse item, mudando as regras para a escolha direta pela classe. Traria, sem dúvida, o sentido completo de legitimidade institucional, afora diversos ganhos, pois a sociedade se vê, e muito bem, representada pelo Ministério Público, e é isso que mais nos orgulha.

Do Blog com Jornal da Paraíba