Campos e o envelope

Nonato Guedes

A pergunta é generalizada, em qualquer roda que se freqüente, seja aqui ou em Brasília: aonde quer chegar o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) com essa propaganda de candidato a presidente da República? As pesquisas não o favorecem nessa fase preliminar nem sinalizam para uma reviravolta. O Instituto Ideia, contratado pelo PSDB, comprovou que a presidente Dilma Rousseff aparece com 53% das intenções de voto, e detém 97% de conhecimento por parte do eleitorado. O universo entrevistado, no quesito estimulado, foi de seis mil pessoas. Dilma é seguida por Marina Silva, que obteve 18% e é conhecida por 77% das pessoas. Aécio Neves, do PSDB, tem 15% de preferências e 77% de conhecimento. Enfim, o neto de Miguel Arraes desponta, simultaneamente, com 4% e 5%.

Pesquisa é sempre polêmica e não significa, necessariamente, situação de estabilidade absoluta. Já tivemos candidatos favoritos na largada que se tornaram fiascos na campanha propriamente dita e perderam a pole position. A muitos parece que Campos está cometendo uma aventura, calculada ou não, porque ainda se trabalha com a hipótese de confronto polarizado entre PT e PSDB. Para os tucanos, seria a grande oportunidade da revanche que tanto ambicionam desde que Fernando Henrique Cardoso ocupou por duas vezes o Palácio do Planalto. Para o PT, a reeleição de Dilma seria um atestado de que o partido, apesar dos ferimentos causados pelo escândalo do mensalão, tem méritos reconhecidos até na inovação de políticas públicas, que os adversários tentaram questionar como assistencialistas, a exemplo do Bolsa Família.

A dificuldade de Campos em passar credibilidade está atrelada a um fator: até pouco tempo ele se identificou como aliado do governo de Dilma Rousseff, que, agora, mais motivada do que nunca, tem caprichado nos investimentos federais em Pernambuco e no Nordeste. Qual o discurso que Eduardo apresenta? A necessidade de revezamento no poder? Não é o suficiente para convencer um eleitorado que se acostumou ao instituto da reeleição exatamente para ter o direito de julgar quem governa bem ou quem governa mal. Em última análise, não é possível imputar ao PT a adoção da reeleição no sistema político brasileiro. Ele foi urdido por Fernando Henrique Cardoso, numa manobra que teria envolvido “cooptação” de parlamentares com assento no Congresso Nacional. O PT fez uso do que estava consagrado na Constituição – primeiro com Lula, agora com Dilma.

O fato de Dilma não ser má avaliada como gestora é um contraponto a qualquer ofensiva para desgastá-la. Marina Silva foi bem votada em 2010, mas dificilmente repetirá a performance este ano. A circunstância de estar logo abaixo de Dilma não é garantia de que ela venha a estar num segundo turno, até porque o seu discurso é cada vez mais difuso, e o partido que ela tenta camuflar na denominação de Rede não sensibiliza sequer ativistas ecológicos mais empedernidos. É mais provável que Aécio avance na ocupação de espaços, dentro da lógica do tira-teima final entre PT e PSDB. Reze o senador para que em 2014 o Supremo não julgue o mensalão tucano mineiro, embrião do mensalão petista, porque a superexposição será altamente negativa. Com uma diferença: estará em jogo, entre outras, a disputa pela presidência da República. No ano passado, quando mensaleiros petistas foram julgados, a eleição foi para prefeituras, de capitais e cidades maiores ou menores.

É temerário subestimar a capacidade da presidente Dilma de sustentar o favoritismo na disputa pela reeleição. Em 2010 dizia-se que a candidata era um “poste”, inventado pelo ex-presidente Lula. Surpreendendo a muita gente incauta, o poste acendeu. Ficou iluminado. Dilma foi execrada pelo seu passado, do qual não tem que se envergonhar: o de militante de esquerda, que foi torturada pelo regime militar. Ela lutou por liberdades políticas, dentro dos cárceres brasileiros. Tucanos de fina plumagem que ousaram confrontá-la preferiram o exílio, no Chile, em outros países. Não ficaram em solo pátrio para resistir. E Dilma nunca fez praça disso, de que foi exemplo a frase infeliz de José Serra de que ela era um envelope lacrado porque evitava falar do passado traumático.

Há um outro ponto a ser considerado: Eduardo Campos é do Nordeste e eventualmente pode dividir votos com Dilma nesta região. Mas a presidente larga em vantagem sobre ele, pelo que já realizou em favor do Nordeste e pelo que pode empreender. A petista já não é mais um envelope lacrado. Este apodo cabe, agora, em Eduardo Campos, que tem que provar que tem história para chegar a presidente, no próximo ano. Veremos!