Antigo cliente de Moraes, Aécio é um dos senadores que terão a oportunidade de formular questões ao futuro ministro na sabatina desta terça-feira (21) na CCJ
A campanha do senador Aécio Neves (PSDB-MG) pagou mais de R$ 360 mil ao escritório de advocacia de Alexandre de Moraes (recém-desfiliado do PSDB) durante a disputa pela Presidência da República de 2014. Membro titular da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça do Senado), o tucano participará na terça-feira (21) da sessão de sabatina de Moraes, indicado para ser ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).
A Coligação Muda Brasil fez a transferência do valor de R$ 364.652, 98 para a empresa Alexandre de Moraes Sociedade de Advogados por serviços jurídicos, como mostram dados da prestação de contas disponíveis no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Moraes afirmou, por assessoria de imprensa, que “prestou serviços de consultoria jurídica nas áreas de Direito Constitucional e Administrativo, inclusive com a elaboração de argumentos, pareceres e memoriais”. À época, o advogado não era partidário do PSDB. Moraes se filiou à sigla em dezembro de 2015, quando era secretário de segurança pública de São Paulo na gestão de Geraldo Alckmin, e pediu recentemente sua desfiliação, ao ser indicado pelo presidente Michel Temer (PMDB) para uma cadeira no STF.
Primeira nota emitida em favor de Alexandre de Moraes na campanha de Aécio
Antigo cliente de Moraes, Aécio é um dos senadores que terão a oportunidade de formular questões ao futuro ministro da Suprema Corte, e não há nenhuma objeção legal que o impeça de participar, mesmo tendo relações anteriores com o sabatinado. Como preza a Constituição, o indicado ao STF deve passar por uma sabatina da CCJ composta por 27 parlamentares, entre titulares e suplentes, em que deve ser questionado sobre questões polêmicas, seu passado, opiniões e como pretende desempenhar a função.
Após a sabatina, a indicação de Moraes será submetida a votação no plenário do Senado. A maioria decidirá se ele está apto a assumir o cargo na Suprema Corte.
Senadores podem se declarar impedidos de participar de votações na Casa por motivações pessoais, segundo o artigo 306 do Regimento Interno do Senado. “Nenhum Senador presente à sessão poderá escusar-se de votar, salvo quando se tratar de assunto em que tenha interesse pessoal, devendo declarar o impedimento antes da votação e sendo a sua presença computada para efeito de quorum”, diz o texto.
A reportagem também perguntou a Alexandre de Moraes, via assessoria de imprensa, se ele atuará com isenção em processos da Lava Jato que possam tratar do senador Aécio Neves, que atualmente não está sendo investigado nesta operação. Também questionou se o advogado contava com o apoio de Aécio para a aprovação no Senado. Essas perguntas não foram respondidas.
Lava Jato
Caso Moraes seja aprovado pelo Senado, ele irá ocupar o cargo de revisor dos processos da Operação Lava Jato no STF. Caberá a ele sugerir medidas para corrigir algum problema do processo, confirmar ou divergir da posição do relator, Edson Fachin.
Na Suprema Corte, há duas investigações contra Aécio Neves como desdobramento da Lava Jato. Os inquéritos contra o tucano tiveram origem na delação premiada do ex-senador Delcídio Amaral (sem partido), que foi preso em novembro de 2015 acusado de tramar contra a operação.
O ex-parlamentar acusou Aécio de maquiar dados do Banco Rural na CPMI dos Correios — presidida por Delcídio — que poderiam atingir membros do PSDB, e também de receber propinas em um esquema de corrupção em Furnas.
O PSDB afirmou, por meio de nota, que os processos que tramitam no STF contra o presidente da sigla, Aécio Neves, não passarão pelo crivo do futuro ministro. “Citações sem provas que possam eventualmente ter sido feitas ao nome do senador não foram feitas no âmbito da Lava Jato, o que significa que não serão revistas pelo ministro Alexandre de Moraes”.
Sem citar os nomes de ministros do STF, o partido acrescentou, em nota, que “existem diversos exemplos de profissionais que prestaram serviços a agremiações políticas antes de ocuparem cargos nos tribunais superiores do país e exercem seus cargos com independência e com o respeito de seus pares”.
Não é a primeira vez que um ministro indicado ao Supremo tem ligações partidárias. Na atual composição do STF, o ministro Dias Toffoli foi advogado da campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2002 e 2006. Já o ministro Ricardo Lewandovski atuou na chefia da assessoria jurídica da Emplasa (Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande São Paulo) na gestão de Orestes Quércia (PMDB) de 1977 a 1979 e em 1983.
Outro ministro com o histórico político é Gilmar Mendes, indicado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Antes, foi procurador da República e ministro-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União) no governo FHC, onde também foi subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil. A indicação ao Supremo interrompeu os planos noticiados à época de que ele poderia se filiar ao PSDB para disputar o governo de Mato Grosso.
Polêmicas de Moraes
Na trajetória de Moraes como advogado, um dos pontos que mais provocaram críticas foi sua defesa da cooperativa de transportes Trancooper, suspeita de ligações com a organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). Ele também já advogou para o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Moraes colecionou outras polêmicas no comando do Ministério da Justiça — cargo do qual está licenciado após a indicação para ser ministro do Supremo. Em setembro do ano passado, ele foi acusado de falar com antecedência sobre a realização de uma nova etapa da Lava Jato durante evento político em Ribeirão Preto (SP). Um dia após ao discurso, o ex-ministro Antonio Palocci (PT) foi preso na 35ª fase da Lava Jato.
O então ministro da Justiça ainda foi mal avaliado no próprio governo por sua condução da crise penitenciária no país, que sofreu uma nova escalada com rebeliões em presídios de Manaus, Boa Vista e Alcaçuz (RN).
Fonte: UOL