Durante um café da manhã com jornalistas na última quinta-feira (25), o presidente Jair Bolsonaro comentou a recusa do Museu Americano de História Natural de Nova Iorque (EUA) de sediar um evento em sua homenagem. Para Bolsonaro, o problema é o fato de que ele apoia pautas conservadoras — enquanto o governo local é democrata.
“Em novembro de 2009 eu comecei a tomar pancada do mundo todo quando eu acusei o ‘kit gay’. Eu comecei a assumir essa pauta conservadora. Essa imagem de homofóbico ficou lá fora”, declarou.
Para reforçar suas convicções políticas a respeito da imagem do Brasil no exterior, o presidente completou sua fala com a seguinte afirmação:
“O Brasil não pode ser um país do mundo gay, de turismo gay. Temos famílias. Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade. Agora, não pode ficar conhecido como paraíso do mundo gay aqui dentro”.
A frase de Bolsonaro não só reforça a postura homofóbica que ele nega com veemência como banaliza um drama que precisamos resolver há pelo menos 50 anos: o turismo sexual. Como o pesquisador e professor universitário Antonio Jonas Dias Filho explica neste artigo, o turismo sexual se consolidou no Brasil durante o período da ditadura militar — quando a propaganda brasileira pró-turismo internacional passou a produzir peças publicitárias “vendendo” nosso país aos gringos como um destino repleto de belezas naturais, costumes típicos e… mulheres extremamente erotizadas. No popular: vendíamos bundas para os estrangeiros no início da década de 1980.
Existem centenas de motivos para que qualquer governo se empenhe em combater a ideia de que o Brasil está de portas abertas para receber gringos interessados em “transar com mulheres”, como disse o presidente. O primeiro e mais importante é que essas mulheres, geralmente, nem são mulheres ainda.
O turismo sexual brasileiro é incrivelmente organizado para cooptar crianças pobres — oriundas de de lares miseráveis e violentos. Na maioria dos casos, as crianças oferecidas no turismo sexual estavam em situação de fuga, abandono ou foram vendidas por familiares para agentes criminosos. Elas acabam entrando em rotas de tráfico de mulheres, tráfico de drogas e contraem todos os tipos de doenças sexualmente transmissíveis porque já dá para deduzir que o tipo de gente que paga para ter sexo com essas vítimas não está lá muito aberto a praticar sexo seguro.
Quando estive em Fortaleza com um namorado, aprendi sobre o turismo sexual da maneira mais chocante possível: eu tinha 18 anos e via meninas bem mais novas do que eu, crianças mesmo, entrando em hotéis de luxo de mãos dadas com estrangeiros de meia idade. Meu namorado, que era brasileiro com cara de gringo (loiro de olhos verdes), era puxado por muitas dessas crianças nas ruas e convidado a comprar o programa delas… mesmo quando estava de mãos dadas comigo.
Para qualquer pessoa que circule pelo Brasil de olhos abertos, o turismo sexual é flagrante e mostra todo o descaso do governo para com esses cidadãos que, ainda crianças, viram mercadoria de exportação. Uma frase como “quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade” só pode ser dita por um presidente da República caso ele não saiba nada sobre o assunto ou apoie essa perversidade. Não existe uma terceira opção.
Se Jair Bolsonaro não se explicar sobre a declaração, resta perguntar se ele é ignorante ou desonesto. Para os cidadãos que não cobram a reparação dessa fala, fica a mesma pergunta.
Fonte: Universa/ UOL
Créditos: Luiza Sahd