Bendita manhã

Por Gonzaga Rodrigues

Não deve ser assim na hora do pique. Mas quando todos já estão no trabalho, já estão de ponto duplamente assinado, vale a pena você tomar o ônibus e ver a rua passar, descobrir placas (algumas ainda em português) e coisas que os cuidados com a direção e o tráfego lhe usurpam.

O nosso transporte coletivo melhorou, sem dúvida, desde a presença do Mário Tourinho na articulação empresa/público, e sem esquecer a intervenção do Carlos Batinga em sua passagem como dirigente do setor na gestão de Chico Franca, quando empresa e governo já vinham se acertando por melhor serviço. Chico, na sua discrição, plantou esse marco, como habituou a Prefeitura a pagar à professora melhor que o Estado.

O transporte que tomo agora atingiu um nível sofrível de atendimento que não pode voltar atrás, tanto pela responsabilidade do concessionário quanto pela incorporação do conforto pela cidadania.
Ainda não é um luxo chileno ou mesmo da Curitiba de Lerner, como propalavam os que vinham dessas estações.

Desci na Lagoa, refleti, diante da multidão que se arrima à sombra das árvores à espera do transporte, quanto seria injusto privá-la desse conforto por amor a um projeto urbanístico mais estético. Pensa-se nisso. E rumei na torrente, parando onde a multidão parava, aguardando o sinal do pedestre, recebendo panfletos, aqui e ali encontrando um conhecido, até avistar um banco mais amigo, refúgio em plena rua como essa praça remansosa que o IPHAN da saudosa Eliane de Castro, associado à Prefeitura, conseguiu requalificar.

Requalificar é a expressão técnica da placa, mais que restaurar, que é renovar a qualidade.
A qualidade é outra, atendendo à solicitação das minhas pernas, que pedem banco, e me oferecendo, de quebra, o conforto do pequeno bosque de oitizeiros conservados no cimento da praça Rio Branco com vistas para a sede da antiga prefeitura. Em 1951, quando aqui cheguei, era o Paço Municipal, cujo prédio foi transformado depois na primitiva Escola de Engenharia.

A Duque de Caxias que daí desce para o Ponto de Cem Réis exibe novas lojas do alcance popular, invejosas naturalmente do comércio sem crises do Terceirão. A antiga sede central do Cabo Branco, hoje abrigando a secretaria de Cultura municipal, obriga-me a parar, escorar-me na esquina do antigo Rex , e distribuir as almas da minha memória devota no portal da Misericórdia. Barreto Neto, naquela simplicidade de vida que era a de seu estilo, aparece saindo do cinema e surpreende-me nessa contemplação. Nem parece ter cruzado, sem volta, a linha do horizonte..

A requalificação (insista-se no termo) desse trecho da Duque de Caxias nos concilia um pouco com o lajedo cimentado do Ponto de Cem Réis. Pena que o edifício do Ipase não integre o ambiente requalificado.
Paro na pilha de livros que, mercê de Deus, a Prefeitura deixou ficar numa quina do Paraíba Hotel, e quem encontro? O poeta Vinicius de Morais, verso e prosa, completo, numa edição-bíblia da Lacerda Editores. Bendita manhã !