Rubens Nóbrega

Sejamos justos. Não é a primeira vez que o Governo do Estado toma de uma prefeitura a distribuição de alimentos do Programa do Pão e Leite, temendo proveito político-eleitoral por parte de quem se encarrega de entregar os produtos a quem mais precisa.

Longe de ser pioneiro ou criativo, o que o Ricardus I está fazendo agora com a Prefeitura de João Pessoa não passa de uma cópia do que o Maranhão III fez com a Prefeitura de Bananeiras há dois anos, exatamente para não dar cartaz à gestão de uma prefeita adversária.

Na cidade do Brejo, até onde sei a iniciativa de interromper a parceria com a Prefeitura partiu da então cúpula dirigente da Fac – Fundação de Ação Comunitária, que hoje, coincidentemente, é presidida pelo ex-deputado Ramalho Leite, também marido da prefeita Martha Ramalho, de Bananeiras.

Já no caso da Capital, até onde sei a ordem de suspender a parceria com a Prefeitura de João Pessoa foi dada pessoalmente pelo governador Ricardo Coutinho.

Ele teria recebido queixas ou alguém teria observado a Sua Majestade que a distribuição do pão e do leite pela PMJP não ajudava a campanha de sua candidata a prefeito, Estelizabel Bezerra (PSB).

Pior: o grande favorecido pelo fato de o programa estar nas mãos da Prefeitura sob Luciano Agra seria o candidato a prefeito pelo PT, Luciano Cartaxo, que tem o apoio do alcaide em exercício.

Essa versão me foi passada por fonte limpa e fidedigna, ontem. Imediatamente após, pelo Twitter enviei ao governador a seguinte mensagem: “@realrcoutinho, partiu de Vossência ordem para suspender parceria com PMJP no Programa Pão e Leite? Qual a (sua) razão?”.
Mais de 15 mil prejudicados

Perguntei a mesma coisa ao governador por i-meio, mas ele não deu retorno, pra variar. Talvez nem precise, de tão evidente e inescondível a mesquinharia política que se infere da medida, capaz de prejudicar mais de 15 mil pessoas, sobretudo crianças e idosos que vinham recebendo regularmente o pão e o leite do Estado, via Prefeitura.

Sem contar que pelo menos 60 prestadores de serviço – encarregados de apoiar a distribuição – teriam que ser demitidos pela PMJP. Mas o que são essas demissões ou essas subtrações de um benefício que mata a fome de milhares de pessoas ou todo o sofrimento daí decorrente diante da vontade de Ricardo Coutinho?

O único consolo, por enquanto, é acreditar que a própria Fac, mesmo com toda a precariedade, vai tentar distribuir o pão e o leite. Mesmo sabendo que vai ter que arranjar nas carreiras toda uma estrutura para substituir a Prefeitura.

Vai ter que contratar pessoal, localizar e locar novos pontos de distribuição, construir ou reformar esses pontos, receber e controlar o produto, fiscalizar a entrega, preparar e preencher cadastro de beneficiados etc. Tudo, enfim, que a Prefeitura já vinha fazendo com razoável competência.
Argumentos inverossímeis

Quanto aos argumentos das autoridades estaduais para tentar justificar a injustificável suspensão da parceria, desculpem-me, mas são inverossímeis. Dizer que suspendeu porque estamos em período eleitoral é uma graça, porque o período eleitoral começou há três meses e quinze dias e não esta semana, a 25 dias das eleições.

Dizer que não foi só com João Pessoa que isso aconteceu, porque convênios, acordos ou parcerias outras foram igualmente suspensos em mais 40 municípios, dá margem para esclarecer o seguinte: nesses outros municípios, o Estado assumiu a distribuição – e não foi recentemente – porque em tese as prefeituras não vinham dando conta do recado ou coisa pior.

Em João Pessoa, não. Aqui, pelo contrário, o trabalho andava bem e fazia parte de um processo de municipalização do Programa deflagrado ano passado, quando Ricardo Coutinho e Luciano Agra ainda eram amigos e aliados políticos.
Mais uma contra Cássio?

Desde o Cássio I, inaugurado em 1º de janeiro de 2003, passamos por quatro eleições e nunca antes na história do pão e do leite do governo houve quem alegasse temor de descumprimento da legislação eleitoral para suspender parcerias do gênero com quem quer que fosse.

Ao governo de Cássio deve ser creditada extraordinária expansão desse programa, que de 20 mil litros passou a fornecer mais de 120 mil litros de leite por dia em menos de quatro anos. Nesse decurso, o programa deixou de ser uma ação pontual de governo para se transformar em política de Estado, imune a interrupções por força de lei ou decisões de juízes eleitorais.

De modo que a atitude do governo estadual deixa dúvidas se não pretenderia algo mais além de simplesmente impedir o programa de favorecer uma candidatura adversária. Pode ser que seja mais uma iniciativa de Cássio submetida a um processo de desconstrução pelo atual governo. Quem sabe?