Ministros aparecem com medidas para ‘tranquilizar’ o público; emenda sai pior que o soneto
Ainda na semana do Ano-Novo, o ministro Guido Mantega, da Fazenda, antecipou, em linhas gerais, o resultado das contas do governo federal de 2013. No domingo, em entrevista a esta Folha, a ministra Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, avisou que poderia abrir o mercado de aviação para empresas estrangeiras caso as companhias brasileiras exagerassem nos preços, por causa da Copa.
Mantega adiantou em um mês o resultado do superavit primário de 2013. Tinha a intenção declarada de brindar o ano com uma boa notícia e “acalmar os nervosinhos” com o mau estado das contas públicas.
O ministro praticamente choveu no molhado, escorregando em seguida. O governo conseguiu atingir sua meta já muito reduzida de poupança, mas com receitas extraordinárias. Disse, em suma, que o governo conseguiu fazer um remendão, algo já meio sabido e mal recebido.
Irritadas, preocupadas, nervosas, passadas, desencantadas ou abúlicas, as pessoas que acompanham esse tipo de discussão não ficaram com impressão melhor do desempenho fiscal do governo, na melhor das hipóteses.
A coisa ficou algo pior com uma informação levantada pelo site “Contas Abertas” e noticiada ontem pelo jornal “Valor”: houve crescimento dos já incomodamente grandes “restos a pagar”. Em suma, em 2013 o governo empurrou para o ano(s) seguinte(s) um volume ainda maior de pagamentos devidos, o que avaria algo mais a credibilidade das contas do governo.
Gleisi, em última análise, ameaçou as empresas aéreas brasileiras com competição, subtexto tão evidente da entrevista que a coisa virou piada até nas ditas “redes sociais”. Está claro que não pega bem dizer que um mercado funciona tão mal que é preciso o governo vir com “medidas emergenciais” de competição (“abusem, mas não exagerem”).
Sim, não é raro que o governo recorra a esse tipo de medida, tal como reduzir o custo de importação de produtos (ocorre com alguma frequência com insumos industriais ou da construção civil produzidos por oligopólios ineficientes).
No caso das passagens aéreas, a ameaça caiu especialmente mal porque o assunto é “pop”. Os serviços das empresas do setor são detestados como os de telefônicas ou de TV por assinatura. Muitos sentem na veia a ruindade desses serviços.
No fundo, a “medida” não pega bem de jeito nenhum. Se há cartel, oligopólio e/ou ineficiência grossa, essas ameaças pontuais de “mais competição” suscitam a ideia de que o governo é em geral conivente com o abuso, além de não ter política de incentivo à maior produtividade.
Para piorar, a ameaça da ministra era inadvertida e fundamentalmente vazia, ao menos segundo empresas estrangeiras e entendidos na legislação.
Primeiro, as empresas aéreas de fora dizem que não teriam como fazer uma oferta de voos emergência. Segundo, a lei brasileira proibiria a abertura dos aeroportos.
Além de anunciar um remendo que por si só denuncia um descalabro, mais uma vez um ministro aparece com uma ideia apressada e sem fundamentação técnica elementar. FOLHA DE SP