Ameaça à Justiça

Rubens Nóbrega

Fiquei na dúvida ontem depois de ouvir no Polêmica Paraíba (Paraíba FM) uma fala do governador Ricardo Coutinho ameaçando cortar ou reduzir a mesada ou duodécimo da Justiça se a Justiça não decidir contra a greve do Fisco. Minha dúvida é: ele perdeu o senso ou realmente acredita que pode reinar acima da lei e subjugar os demais poderes à sua vontade ou à sua evidente estratégia de fazer caixa para gastar mais tarde segundo as prioridades do seu projeto de poder? Ou será que mais uma vez me enganei com Ricardo Coutinho e confirmo agora que além de tudo ele é despreparado também para o convívio com os seus pares, já que parece não ter o menor respeito por outra autoridade que não seja a sua? Afinal, pela gravação que ouvi no programa comandado por Gutemberg Cardoso e Nilvan Ferreira, Sua Majestade falou de um jeito como quem quer mostrar que tem poder suficiente inclusive para humilhar dirigentes e membros do Judiciário.

Não vejo outro modo de definir o que ele fez ao deixar patente que seria capaz de condicionar o repasse da verba do Poder a uma sentença judicial favorável ao seu interesse em vencer a qualquer custo a queda de braço com uma categoria em greve. Não tenham dúvida de que Sua Majestade considera uma desmoralização ceder às reivindicações do pessoal do Fisco, que não quer outra coisa além do respeito a uma lei em vigor desde 2007, a Lei do Subsídio dos servidores fiscais.

Mas, apesar de saber disso, apesar de saber que o Fisco quer o que é seu por direito, e não um aumento salarial, o Ricardo I nem pisca quando diz que não pode atender porque não vai “tirar de quem ganha menos para dar a quem ganha mais”. Não lhe faz cócegas de modo algum declarar que não dá para pagar o subsídio porque com isso estaria infringindo a Lei de Responsabilidade Fiscal, quando ele sabe – ou deveria saber – que pagar o que é de lei não fere lei alguma. Mas a arrogância do homem é tamanha que ele não dá a menor se os seus atos e palavras causam tanta intranqüilidade, além do sofrimento que já causou a milhares de pessoas, demitindo ou achatando os ganhos para fazer o acúmulo que faz. Ricardo I fala e age com tanta prepotência que parece não lhe fazer mossa ameaçar a Justiça e com isso ameaçar a própria estabilidade política, jurídica e institucional da Paraíba; por via de conseqüência, a sua própria estabilidade no cargo.

E tudo isso ele faz como se estivesse nadando num mar de popularidade e de credibilidade popular, ao ponto de se sentir legitimado e fortalecido para também divulgar números sobre as finanças do Estado que não batem com a realidade.Porque até as emas da Granja Santana sabem que o governo teria estocado hoje cerca de R$ 1 bilhão e 100 milhões, conforme assegurou ontem no Polêmica Paraíba um sindicalista do Fisco que vigia entradas e saídas do cofre estadual. É dinheiro que dá pra pagar pelo menos cinco folhas de pessoal, sem ter que deixar de pagar as demais despesas do Estado, para as quais existem normalmente, correntemente, as transferências federais, sobretudo FPE e Fundeb.

Como se fosse pouco, o governo é uma contradição só quando vem a público falar de finanças. O governador diz uma coisa, seus secretários dizem outra e sua base na Assembléia não diz nada, por nada saber ou não ter acesso ao governante. Sinceramente, nunca vi a Paraíba num momento político-administrativo tão ruim, por conta dessa corda que o governo estica cada vez mais nas relações com outros poderes, com a sociedade civil, com os servidores públicos, com o público, enfim. Talvez a situação de agora lembre um pouco aquela posterior ao assassinato do empresário Paulo Brandão no governo Wilson Braga (1983-86), crime do qual o governador da época foi apontado como mandante pela Polícia Federal.

Talvez o estágio a que chegamos assemelhe-se àquele vivido nos seis últimos meses do Burity II, quando o fechamento do Paraiban somou-se ao fim dos repasses generosos dos tempos de irresponsabilidade fiscal dos governos da União e dos estados.

Talvez a aflição por que passam amplos setores da Paraíba em função do governo que tem no presente possa lembrar a agonia que se seguiu à tentativa do então governador Ronaldo Cunha Lima de matar o então ex-governador Tarcísio Burity. Por fim, deixem-me dizer uma coisa: a Doutora Aracilba Rocha, secretária de Finanças do Estado, conhecida também por sua franqueza desconcertante, deixou escapar anteontem que nada menos 116 mil pessoas estariam na folha do Estado. Significa dizer, caríssimas e caríssimos, que esse governo que aí está, o governo de Sua Majestade Ricardo I, jogou no lixo a Lei de Responsabilidade Fiscal e, ‘pra dentro’ do Estado, pelo menos 18.429 novos servidores (efetivos e temporários). Como cheguei a esse número? Fácil: fui ao Sagres e peguei o que tem lá disponível em matéria de folha do Poder Executivo. Feito isso, é só diminuir dos 116 mil de hoje os 97.571 que o Ricardo I pagou em seu primeiro mês de governo. Quem duvidar e quiser conferir é só visitar o portal do TCE na Internet (portal.tce.pb.gov.br), apertar no botão do Sagres e procurar em ‘Pessoal’ que vai encontrar a tabelinha que reproduzo a seguir.