Agnaldo Timóteo faz 80 anos: ‘Mamãe era 10’
Oitenta anos. O cantor romântico Agnaldo Timóteo – um dos mais populares artistas do Brasil – entra neste domingo, 16 de outubro, para o seleto Clube onde já estão Silvio Santos, Tom Zé, Fernanda Montenegro e Tarcísio Meira.
A surrada expressão “não parece” lhe cai perfeitamente. Ativo, Timóteo é movido a bateria de longa duração. O aniversário será comemorado em duas etapas. Uma, em Angola, onde fez shows esta semana. E, a outra, à noite, onde já pretende estar no Brasil para, ao lado da família, compartilhar a data.
A cansativa viagem sobre o oceano é fichinha para este botafoguense “doente”, embora ele prefira ônibus quando o trajeto é Rio e São Paulo. Para a África, não teve jeito, o filho de Dona Catarina – já falecida – se submeteu aos caprichos do invento de Santos Dumont.
Para escrever este perfil, perguntamos quais eram os seus ídolos, “além da eterna mãe”. E Timóteo retornou mensagem escrita exatamente assim: “MAMÃE era 10”. O seu objetivo é ser aceito por toda a família brasileira.
Apesar de mineiro de Caratinga, Timóteo utiliza-se do método nordestino “tudo com emoção”. Ele está sempre pronto para o que der e vier. Não por acaso, ele põe coração e paixão em grandes proporções em tudo o que faz.
Timóteo sempre teve uma alta estima e nunca se deixou ser tratado com inferioridade em nenhuma situação: “Eu fico muito agradecido a todos que queiram saber um pouco da vida deste cidadão que viveu até aqui com a mais absoluta dignidade, ainda em grande evidência, que saiu de casa aos 15 anos e não se prostituiu, não se vulgarizou e nem seguiu caminhos errados. Porque continuou sendo o mesmo cidadão voltado para sua família e com amor e respeito aos seus semelhantes. Semi alfabetizado, tendo que aprender com suas experiências pela vida. Espero que as pessoas se sintam, pelo menos, com boa vontade em conhecer um pouco da minha vida”.
Aniversário é dia de festa e confraternização, mas nem sempre foi assim. A vida já pregou muitas surpresas a este artista que fincou seu nome na história da MPB.
Na década de 90, ficou um tempo sem gravadora. Isso foi problema? Claro que não! Ele mesmo produziu seus CDs e, pessoalmente, foi até o Largo da Carioca, no Centro do Rio, vender suas obras. Nas praças públicas, Timóteo pegava o microfone e realizava shows intercalados com a venda dos CDs. O povo adora Timóteo, e nunca o desamparou.
Ele é um dos poucos artistas que sobreviveu todos estes anos sem precisar de divulgação ou apoio da TV líder de audiência. O cantor não come na mão dos outros, e essa é uma das suas qualidades mais ressaltadas. Polêmico por natureza, ele se meteu em todo o tipo de encrenca. Mas isso a gente comenta mais adiante.
Timóteo iniciou sua carreira cantando em programas de calouro nas rádios de Caratinga, Governador Valadares e Belo Horizonte, onde se tornou conhecido como o “Cauby mineiro”. Já no Rio, onde tudo acontecia na década de 50, principalmente por causa das Rádios Nacional e Mayrink Veiga, passou a trabalhar como motorista da cantora Ângela Maria. Para sua carreira solo, foi um passo. Sua voz potente chamou a atenção. E o sucesso foi vindo de forma cadenciada.
Ficou famoso ao gravar a canção “Meu Grito”, de Roberto Carlos. Depois disso, vieram vários sucessos românticos, como “Ave-Maria”, “Mamãe” e “Os Verdes Campos De Minha Terra”. Gravou mais de 50 discos.
Em 1982, elegeu-se deputado federal no Rio de Janeiro, pelo PDT. No meio do mandato, desentendeu-se com o então governador Leonel Brizola, e transferiu-se para o PDS. Mas tem uma história complicada aí.
No primeiro governo de Leonel Brizola, Agnaldo Timóteo teve uma votação estupenda: 600 mil votos. Dizem que o novo deputado teria pedido ao governador um financiamento de 100 mil dólares para montar uma gravadora de discos e 30 empregos para seus cabos eleitorais. Brizola não aceitou, e Timóteo explodiu: “Eu tive 600 mil votos, porra, e exijo o que tenho direito”.
Neste momento, na versão de Timóteo, Brizola teria lhe dito: “Fica calado, seu boca suja”. Agnaldo disse à imprensa que Brizola o teria chamado também de “crioulo boca suja”. Pouca gente sabe direito o que mais foi dito entre os dois. Foi tenso. E o deputado-cantor rompeu definitivamente com o partido.
No Colégio Eleitoral de 15 de janeiro de 1985, para escolha do presidente da República (que teve a vitória de Tancredo Neves), Timóteo votou em Paulo Maluf. Candidatou-se em 1986 a governador do Rio de Janeiro e foi derrotado; em 1994, reelegeu-se deputado federal.
Muita gente o questionou: Por que apoiar Paulo Maluf? A explicação foi prosaica.
“Fui procurado pelo Maluf. Como administrador, ele é simplesmente irretocável. Querendo mudar meu voto, o (cartunista) Ziraldo me levou até Tancredo, que já estava muito debilitado. No encontro, ele quase caiu num carpete. Foi nosso único encontro. Um dia, um deputado do PDT, Fernando Lira, de Pernambuco, me chamou e disse que o PDT queria que eu acompanhasse o partido, queriam que eu votasse no Tancredo. Não votaria. Ele estava doente e não tinha condição”.
E, também, “antes disso. Eu fui à casa do Maluf, e ele me disse: ‘Agnaldo, se você achar que seu voto vai lhe prejudicar com o PDT, pode votar no Tancredo, que está muito doente. Ele só consegue disputar agora. Eu não, tenho ainda pelo menos mais cinco’. Com isso, ainda tentei mudar a cabeça da liderança do PDT, mas não consegui. O pessoal do Tancredo estava dando dinheiro. Alguns deputados ganharam 500 mil dólares”.
“O meu voto não compraram. Dei minha palavra a Maluf e cumpri. Isto (de comprar voto) corre muito no Congresso e serve de ajuda para pagar dívida de campanha. Aliás, não foi a única vez que recusei vender meu voto. Na (emenda de) reeleição de FHC (Fernando Henrique Cardoso, em 1995), me ofereceram também dinheiro para votar com o governo. Não votei, porque a emenda valia para o FHC, mas não para o Maluf, em São Paulo, que teve de colocar o (Celso) Pitta. A popularidade do Maluf era tanta que seu indicado foi eleito facilmente”.
O aborrecimento de Timóteo é que ele denunciou a compra de votos, mas não foi ouvido. “Denunciei. Falei na Hebe, no Faustão. E ainda fui à tribuna pedir que os candidatos se submetessem à junta médica. Queria saber se realmente tinham condições de governar o país. A reação foi violenta. Só não me quebraram porque estávamos dentro do Congresso. A história mostrou quem estava certo”.
Além destes imbróglios políticos, o cantor enfrentou o preconceito racial e a discriminação aos negros. Timóteo também entrou em outro assunto que permeia o comportamento da sociedade nos últimos anos: a homossexualidade.
É de sua própria autoria três sucessos que versam sobre o tema: “A galeria do amor”, de 1975, “Perdido na noite”, de 1976, e “Eu pecador”, de 1977. São canções que abordam a experiência homossexual. Anos mais tarde, ele e o jornalista Felipe Campos participaram de um programa de TV onde Timóteo nega ser gay. Assista ao vídeo:
Para os fãs que apreciam o cantor, e não se sentem muito à vontade com esta vocação política desabrida, Agnaldo Timóteo parece que, finalmente, irá satisfazê-los. “Estou descrente com a democracia neste país! Tinha um desejo enorme em voltar à Câmara dos Vereadores e, por isso, me candidatei… Mas agora, nem pensar em continuar com a política”, fechou questão.
Timóteo viveu sua vida até agora com muita intensidade. Na música, marcou sua presença nos palcos e onde tinha público para ouvi-lo. Ele cantou no funeral de Cauby Peixoto, seu amigo de longa data. Sempre tratou com carinho Silvio Santos, companheiro de muitos anos; Angela Maria, estrela da época de ouro do Rádio; Agnaldo Rayol, assim como ele, dono de uma voz poderosa; e todos os cantores românticos que veem no cantor uma referência artística.
Créditos: Redação SRZD