Agassiz Almeida: Joaquim Barbosa expõem-se acusados, acunhados de os condenados do mensalão, à execração da opinião pública num monumental anfiteatro comandado por magistrados transvestidos de Catão incorruptível.

agazzizMENSAGEM DO ESCRITOR AGASSIZ ALMEIDAAO MINISTRO JOAQUIM BARBOSA, PRESIDENTE DO STF.

Desde o nosso período colonial que o povo brasileiro sofre duas formas cruéis de opressão no seu processo de desenvolvimento: a espoliação por uma elite egoísta e excludente, e recentemente, nas últimas décadas, se vê manipulado por espetáculos circenses nos quais se dão as mãos a hipocrisia, o cinismo e a avidez pelas manchetes midiáticas.

O que assistimos hoje? Como há dois mil anos nas arenas do Coliseu romano, expõem-se acusados, acunhados de os condenados do mensalão, à execração da opinião pública num monumental anfiteatro comandado por magistrados transvestidos de Catão incorruptível, e, remontando aos idos tempos, em verdadeiros sobas africanos.

Molière não faria melhor encenação. Embalada nos frenéticos aplausos da massa humana, idólatra desses novos deuses, a mídia televisiva e a internet, a alta corte do país dita uma nova ordem de moralismo, mesmo violentando os mais elementares princípios e normas do Estado Democrático de Direito. Todos procuram tripudiar nos vencidos.

Vem-me um horror sarcástico desse cenário teatral por trás do qual grassa nas antecâmaras dos poderes corrupção epidêmica, escancarada nas obras faraônicas, sobretudo no Judiciário.

Aplaudam-se os magistrados na ação punitiva aos condenados de alto coturno, e que ela se estenda implacavelmente por todo o país a prefeituras e tribunais superiores.

Que não fique, Sr. Ministro, na consciência do povo brasileiro a  frustação  melancólica de que mais um espetáculo circense foi montado.  O juiz Lalau nos deixou de sobreaviso. Desde então, quem foi condenado?

A mais condenável ação de um dirigente do poder é arrastar às fronteiras do engodo a consciência de um povo.

Cansa-se a nação das demagogias e hipocrisias. Existe um abismo entre o povo brasileiro e a nação. Ele precisa de um estadista que desafie os grandes problemas e aponte as soluções, e não de populistas de ocasião.

Façamos deste Brasil uma nação conduzida por um povo forte e livre, e não um empanturrado país manipulado por elites egoístas e venais.

Os indignados repelem a passividade satisfeita que uma mídia comprometida quer impor ao povo brasileiro.

Entre o ruído que a condenação dos acusados do mensalão provoca e a esperança do povo, uma verdade eclode: que este julgamento não seja apenas uma peça teatral, porta larga por onde os corruptos e os irresponsáveis gestores públicos trafeguem.

Condenar não basta, Sr. Ministro, urge convocar a consciência da nação para uma nova ordem de respeito aos recursos  públicos. A sensação de que tudo isto é mais uma encenação midiática levará à desolação o povo brasileiro, tão malbaratado por poderosas forças.

Saudações democráticas.

Agassiz Almeida 

Agassiz Almeida, escritor, ativista dos direitos humanos, ex-deputado federal constituinte, autor das obras, “A república das elites”, A ditadura dos generais”, e recentemente lançou “O fenômeno humano”. É considerado pela crítica como um dos grandes ensaístas do país.