A pergunta que virou pesadelo

Rubens Nóbrega

Meu amigo João Costa não aguenta mais. Há mais ou menos dois meses, todo santo dia, onde estiver ou aonde for depara-se com pelo menos meia dúzia de pessoas que lhe fazem sempre a mesma pergunta: “Cássio é candidato?”.

Notabilizado no papel de comentarista político do programa Rádio Verdade (Arapuan FM, de João Pessoa), o jornalista e teatrólogo João Costa conta que de uns tempos pra cá, como diz a música de Chico César, pra onde se vira dá de cara com alguém interessado em saber se ‘Cássio é candidato’.

Ele não sabe a quem atribuir a ‘perseguição’. Vez por outra, acha que é pegadinha encomendada ou insuflada por seus companheiros de rádio, entre eles Nilvan Ferreira, Antônio Malvino, Fernando Braz e o Dijei Brazinha.

“O fato é que o aperreio começa de manhã cedo, quando vou comprar o pão lá perto de casa”, diz. No caminho de ida, de volta, no balcão da padaria, no ponto do ônibus ou dentro, não falha, não falta. Do padeiro ao cobrador, todo mundo pergunta: “E aí, Seu João, Cássio é candidato?”.

“Esse moído só acaba de noite, quando volto pra casa”, emenda. Será que acaba mesmo? Tem noite que não, confessa, pois recorrentemente sonha com o seu saudoso pai e o sonho termina invariavelmente com o velho perguntando: “Cássio é candidato?”.

O negócio ficou tão sério, assumiu proporção tal que esta semana João teve um sonho diferente, um sonho que quase lhe deu esperança de se livrar da pergunta-pesadelo. Mesmo assim, ele mesmo fez por onde o danado do bordão se repetir.

– Sonhei que encontrava meu pai no Ponto de Cem Réis, a gente tomava um cafezinho e ele ia embora sem me perguntar coisa alguma. Achei estranho. Corri atrás e peguei o velho já dobrando a esquina das Nações Unidas. Interrompi seus passos e perguntei se ele não estava esquecendo de perguntar alguma coisa.

De acordo com a narrativa de João, o velho parou, coçou o queixo, botou no rosto aquela expressão de quem acabou de descobrir a pólvora e mandou ver:

– Eita, Joãozinho, agora que tu falasse, meu filho, lembrei que tinha mesmo uma coisa muito importante pra te perguntar. Afinal, filho, Cássio é candidato?

João garante que desse sonho acordou com sensação de pesadelo. Ainda bem que sua mulher acordou na mesma hora e cuidou de acalmar o maridão, convencendo-o a voltar a dormir porque ambos deveriam estar de pé bem cedo.

“Pular da cama bem cedo pra quê, mulher, depois de uma noite mal dormida feito essa?”, quis saber João Costa. A companheira tratou de explicar:

– Minha irmã quer que a gente passe por lá que ela quer discutir umas coisas contigo. Precisa tomar decisões sérias, ela e meu cunhado, mas, antes, quer te ouvir.

Entre curioso e intrigado, sem ter como furar o compromisso assumido pela patroa, antes de oito e meia da manhã lá estava João na casa da cunhada. Que não perdeu tempo e foi direto ao ponto tão logo ele entrou e ocupou lugar no sofá da sala:

– João, pra saber o que fazer ano que vem, estamos precisando saber uma coisa que só você é capaz de nos dizer: Cássio é candidato?

Espantado, chocado mesmo, João observou sua mulher com o rabo do olho. Pra ver se ela não estava rindo. “Esse povo só pode estar tirando onda da minha cara”, pensou, mas se conteve para não dar resposta malcriada nem criar confusão na família.

“Só posso dizer e prometer uma coisa: quando encontrar o senador, pode deixar que eu pergunto pra você e depois lhe digo a resposta”, disse, com aquele tom na voz que deixa muito clara a vontade de não querer espichar conversa.

Por causa dessa baldeação na casa da cunhada, João perdeu o busão das nove do Valentina-Centro e se viu na contingência de um táxi, que chamou e nele rapidamente embarcou.

Com trânsito incrivelmente livre àquela hora, chegou à Lagoa em 15 minutos. Mas, em vez de ir direto pra rádio, preferiu descer na Banca de Assis para comprar o Jornal da Paraíba. Mas aí… Após pagar a corrida, não conseguiu saltar do táxi de imediato:

– Me desculpe, mas pela voz reconheci que o senhor é o Véi do rádio e, se não lhe incomodar, eu queria que o senhor me respondesse uma coisa: Cássio é candidato?

João fechou a cara e desembarcou sem dizer palavra. E de cara fechada dirigiu-se à banca, onde apanhou o seu exemplar e foi até o caixa. No exato momento em que tirava uma arara do bolso, sentiu indicador alheio cutucando-lhe a omoplata direita.

Mal se virou para ver quem era… “E aí, meu irmãozinho, Cássio é candidato?”, perguntou Assis, o dono das bancas Viña del Mar. Paciência no zero, João deu o troco: “Acho que não, Assis, pois o Papa Francisco agora que começou o mandato…”.

Assis achou graça; João, nenhuma. Não tinha mais um pingo de humor, sequer para rir das próprias piadas. Tanto que, vinte passos adiante, mandou pr’aquele canto um mendigo a quem dera uma prata de cinquenta. Motivo: no lugar do indefectível ‘Deus lhe pague’, o pedinte provocou o nosso herói: “Ei, Véi, Cássio é candidato?”.

Já lançando o dia na coluna da perda total, faltava meia hora para o programa começar quando João entrou na sala de produção da rádio, onde Nilvan o aguardava para trocar ideias sobre a pauta do Rádio Verdade.

Foi logo avisando: “Só não venha me pedir pra falar da candidatura de Cássio, pelo amor de Deus”. Na maior calma, Nilvan disse ser impossível não tocar no assunto, ainda mais depois do que acontecera na reunião do G-20, em Moscou.

– E o que diabo tem a ver o G-20 com essa onda que vocês tão fazendo aqui? – questionou João.

– Soube não, Véi? Dilma se reuniu em separado com Obama hoje pela manhã, pra resolver aquela parada da espionagem, e, segundo o intérprete da Presidente, antes que ela abrisse a boca, Obama atalhou e perguntou: Dona Dilma, a senhora poderia me dizer se Cássio é candidato? – explicou Nilvan, disparando uma risada que só parou ao meio-dia, a poucos segundos de ele e o Véi entrarem no ar.