A falência dos valores

Rubens Nóbrega

Do que pude acompanhar ontem da mesa-redonda em homenagem a Ronaldo Cunha Lima no programa Polêmica Paraíba (Paraíba FM, de João Pessoa), gravei bem o lamento do nosso decano, o jornalista Severino Ramos, diante do que ele chamaria de empobrecimento de nossa representação política.

Biu queixou-se particularmente da qualidade da nossa representação em Brasília, onde já tivemos na mesma contemporaneidade, além de parlamentares brilhantes e realmente importantes, pelo menos oito paraibanos ocupando postos ministeriais, entre ministros de Estado e ministros de tribunais superiores.

Requeiro permissão dos debatedores de ontem e leitores de hoje para situar o período a que Biu se refere. Vai da segunda metade dos anos 50 à primeira dos 70.

Faço tal recorte baseado nos nomes que ele mesmo citou (Ernani Sátyro, Oswaldo Trigueiro de Albuquerque, Antônio Mariz e outros do mesmo porte).

Delimitada a quadra histórica para efeito de análise, vê-se logo que o nosso Biu Ramos verbalizou uma saudade recorrente de sua geração e o testemunho de quem teve a oportunidade – ou a felicidade, diriam alguns – de acompanhar de perto, profissionalmente, jornalisticamente, o desempenho de homens públicos que faziam jus a esse título.

As restrições às figuras mencionadas por Mestre Biu não extrapolavam a política ou ideologia. Não lembro, não vi, não ouvi nem li qualquer referência desabonadora àqueles expoentes. Não conheço passagem, acusação ou denúncia, contada ou formulada sequer por adversários, que lhes ponha dúvidas sobre a honorabilidade, a probidade, a respeitabilidade.

Como profissionais liberais, detentores de cargos eletivos ou no exercício de funções judicantes, não cabiam suspeitas, desconfianças nem especulações sobre a retidão dos atos e a força da palavra de homens como Ernani, Mariz, Oswaldo e outros um pouco mais recuados no tempo, a exemplo de Ruy Carneiro, Argemiro de Figueiredo, Alcides Carneiro e José Américo de Almeida.

Compreensível, portanto, a queixa ou o desencanto de Biu. Principalmente porque a decepção decorre naturalmente do cotejo entre o passado e o presente da vida pública brasileira em geral e paraibana em particular, onde a régua de medir a estatura moral e intelectual de muitos dos ‘homens públicos’ de agora nos leva inevitavelmente a conferir nanismo de caráter e pequenez de atitude.

O Professor concorda

Motivei-me para escrever sobre a degradação de valores na vida pública ao receber mais um excelente escrito do Professor Menezes. Reparto o texto com vocês adiante. Cuida de recentíssimo episódio da série ‘A degola dos ricardistas’, que tem como algoz-protagonista o prefeito Luciano Agra, de João Pessoa.

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Meu caro amigo, acabo de ler em um dos jornais de nossa cidade escrito que considerei perfeito atestado da falência política do nosso malfadado sistema administrativo, que hoje, parece-me, funda-se exclusivamente no interesse pessoal dos envolvidos, que se dizem gestores da coisa pública.

Ex-secretário municipal, defenestrado de sua cômoda posição em virtude dos movimentos sísmicos que têm abalado o stablishment político deste nosso sofrido Estado, publica longa catilinária em que tenta mostrar ao dono da caneta que o afastou das benesses governamentais que sua fidelização partidária era suficiente e causa maior para sua manutenção no esquema político-partidário do qual fora afastado por falta de sintonia com o líder.

Dessa manifestação podemos tirar afirmações as mais diversas, dentre as quais considero mais grave a demonstração dessa “autoridade”, que se acha injustiçada, do quanto estava dissociada do interesse público e do bem comum, pois em momento algum fala, nem que seja da boca para fora, como diz a sabedoria popular, de planos e projetos que esperava realizar em favor da comunidade que lhe confiava, mesmo indiretamente, uma posição que deveria ser ocupada em nome desse interesse público.

Nenhuma linha, nenhuma palavra dessa catilinária, por mais suave ou diminuta que seja, nos deixa antever a presença da vontade de ajudar a construir o progresso da cidade e o bem estar de seus munícipes.

O que temos, a meu ver e humilde interpretação, é única e exclusivamente um lamento de quem perdeu poder, benesses e salamaleques dos quais se beneficiava e usufruía de uma posição alcançada apenas em função de uma fidelidade partidária que nada de positivo constrói.

Lamentável esse fato! Mas muito mais lamentável é atentarmos para as constatações que podemos tirar dessa ocorrência, uma das quais pode ser a de que outras fidelidades continuam a usufruir das benesses do poder, com os mesmos propósitos e objetivos. Indagamos, então: até onde vamos chegar?

Seria o caso de dizer…

“Ou nos locupletemos todos ou se restaure a moralidade”, como diria o impagável Stanislaw Ponte Preta? Não, claro que não. Os bons são a maioria, a imensa maioria. O problema é que os maus, além de tudo, roubam a cena e aparecem mais.