A era das perplexidades

Gilvan Freire

Nos Estados Unidos, a reeleição de Barack Obama foi fruto da perplexidade da população que viveu o dilema entre punir ou poupar o maior símbolo da raça negra depois de Martin Luther King, o ativista preto que foi assassinado precocemente para que a democracia americana pudesse vencer o apartheid dominante em pleno século 20.

Obama (tanto quanto Mandela), é expoente da democracia racial no mundo e chegou a assustar a elite branca dos Estados Unidos, assim como Lula assustou a elite brasileira nos primeiros momentos de sua candidatura à presidência do Brasil, no final da década de 1980, porque seria um papa-figo comunista capaz de socializar a riqueza e os meios de produção.

Lula, aos poucos, foi avançando contra a descriminação dos ricos com relação aos pobres e aos trabalhadores, depois de ajoelhar aos pés dos Sindicatos as maiores corporações nacionais e multinacionais que durante centenas de anos exploraram economicamente o país, seu povo e os proletários.

Obama nunca causou medo comunizante, porque os comunistas americanos não chegam a lotar uma Kombi, mas fez exalar suor de negro nos salões ovais da Casa Branca, onde o capitalismo granfino mundial estava acostumado a incensar com as melhores e mais caras fragrâncias do planeta, só comparados em luxo ao que os imperadores romanos faziam resplandecer em seus banquetes na Roma Antiga. Pior de tudo é que Mister Obama invadiu os recintos e aposentos da Casa Branca com uma trinca de negros: a mulher e suas filhas, todas pretinhas em folha. Pode haver no mundo revolução cultural e social maior do que essa?

Os americanos pobres, os desempregados, os hispânicos, os latinos e os negros, garantiram a permanência de Obama no poder, enquanto que Mr. Mitt Romney quase tomava de volta o governo secular dos brancos. Mesmo assim, parece que o grosso da população americana esteve hesitante quanto a perder ou preservar as conquistas raciais que mudaram o nariz da burguesia capitalista, antes intolerante aos odores produzidos pelas axilas dos que não nascerem brancos.

PERPLEXIDADES TAMBÉM EM JOÃO PESSOA

Por razões diferentes, a eleição de Luciano Cartaxo para prefeito da Capital há de causar inquietações. Não por questões raciais ou econômicas, mas por razões estritamente políticas e partidárias.

Enquanto do ponto de vista pessoal Luciano não desperta grandes controvérsias, pois é um rapaz bom e pacato – um tipo comum, sem afetação ou distúrbio de personalidade -, a sua natureza política é complexa e suscita preocupações, especialmente pelo fato dele ter deixado sempre muito claro que seu modelo de gestão é o petista, uma engenhoca oriunda dos anos 80 que tinha viés transformistas e inovador mas termina por colocar muitos de seus ideólogos na cadeia, 30 anos depois. Além do mais, Luciano é herdeiro e continuador de uma administração extremamente contraditória que se meteu num conflito ainda não resolvido pelas próprias eleições recentes: como saber se ela foi aprovada como obra de Ricardo Coutinho (pois ele implantou o modelo de gestão), ou se foi usada contra o seu próprio idealizador, que teve uma boa candidata repelida pelo eleitor. Essa ambigüidade levou RC ao tormento psicológico, pois ele disse, logo após o segundo turno, que se essa administração fez sucesso capaz de eleger Luciano Cartaxo, esse sucesso é dele, o construtor do projeto. Foi a mais genial e controversa interpretação extraída dos oráculos, com sentido e muita imaginação ao mesmo tempo, dessas de deixar o próprio RC e muita gente meio pineis e confusos durante muito tempo.

A partir de segunda-feira, em mais dois artigos na semana, abordarei essas questões, tentando explicar. Até lá.