Polêmicas

‘A culpa é de Cícero’ - Rubens Nóbrega

Quando expus anteontem a vastíssima experiência (cerca de 40 anos) de Luciano Agra em planejamento urbano, atuando principalmente em João Pessoa, o espaço ficou pequeno para tanto currículo. Não deu para destacar na coluna de quarta última que o atual prefeito da Capital é também professor efetivo da UFPB, onde lecionava as disciplinas ‘Desenho Urbano’ e ‘Planejamento Urbano’ no curso de Arquitetura.

O vínculo com a Universidade também impeliu o Professor Luciano a se qualificar além da graduação pela Federal de Pernambuco. Daí ele correu atrás e fez um Mestrado em Engenharia Urbana, sagrando-se Mestre na matéria em 30 de setembro de 2006, data em que defendeu a dissertação intitulada ‘Uma Contribuição aos Estudos Sobre a Relação Transportes e Crescimento Urbano: O Caso de João Pessoa – PB’.

Sob orientação do Professor Doutor Nilton Pereira de Andrade, atual superintendente da STTrans de João Pessoa, a ‘tese’ do Mestre Luciano “analisa como se deu a evolução urbana e dos transportes no município de João Pessoa desde a sua fundação até o ano de 2004”.

Sabendo que o homem é um estudioso no assunto, e também que ele participou dos principais planos de urbanização e reurbanização da cidade nas últimas quatro décadas, alguém aí pode dizer que ele tem parcela de culpa pela cidade congestionada de trânsito engarrafado em que se transformou João Pessoa.

Mas o grande culpado desse tormento nosso de cada dia, segundo o Mestre Luciano Agra, não é ele, lógico, mas ninguém menos que os dois últimos anos do governo Chico Franca e todos os oito anos que cobrem os dois mandatos de Cícero Lucena na Prefeitura da Capital.

Evidente que o Doutor Luciano não ‘fulaniza’ nem atribui culpas em sua dissertação. Esse tipo de coisa não pega bem num trabalho acadêmico. Mas a responsabilidade ao período dos dois ex-prefeitos pelo que acontece hoje em nossa cidade fica muito clara quando se lê a parte final da obra lucianista.

Dá pra perceber também que as iniciativas de que participou como técnico ou coordenador de programas e planejamento da Prefeitura da Capital são elogiadas pelo autor da dissertação, no contraponto ao ‘desmantelo’ que teria sido a era Cícero na PMJP.

Ele se refere a descontrole e omissão do poder público, em relação ao crescimento desordenado da cidade, entre os anos de 1994 e 2004, que pegam justamente o final da gestão de Chico Franca e todo o tempo de Cícero como prefeito. Usando excertos da ‘tese’, faço um resumo a seguir.

Assim escreveu Luciano

A década de setenta representou um marco definitivo na organização espacial da cidade e no seu sistema de transportes. A cidade passou a ser planejada de forma

integrada, associando desenvolvimento e transporte, de modo menos intuitivo e com

maior rigor técnico.

A cidade consolidou a organização espacial e lançou as bases para o desenvolvimento do setor de transportes urbanos.

Em meados dessa década, a Prefeitura promoveu a elaboração do Plano de

Desenvolvimento Urbano – PDU e depois o Código de Urbanismo com uma proposta

para o zoneamento de uso do solo e sistema viário, concebidos para funcionar de

maneira articulada, integrando definitivamente no âmbito legal as duas dimensões do

planejamento urbano. Surgiram então os planos integrados de transporte e estrutura

urbana elaborados por Jaime Lerner, que não foram implantados mas influenciaram a

concepção dos estudos de transportes subseqüentes contribuindo com a definição de

projetos para o centro e a orla marítima da Cidade.

A partir do início da década de oitenta foram elaborados os estudos e o plano diretor de transportes que definiram num horizonte de 20 anos o modelo de transportes urbanos que funcionaria desde o fim da década de 1980 até o presente.

Outra iniciativa importante foi elaboração do Plano Diretor da Cidade que só foi aprovado em 1992, regulamentando a política e os instrumentos para a gestão urbana, e implementado a partir de 2005 (ano em que começa o governo Ricardo Coutinho na PMJP, tendo Luciano Agra como secretário de Planejamento).

Examinando os aspectos da evolução urbana, ficou delineado um perfil do crescimento da forma e do tamanho da cidade desde a sua fundação. Na etapa final do processo ficou comprovado que apesar de toda a legislação vigente, a produção do espaço ficou sem controle entre 1994 e 2004 provocando a fragmentação do tecido urbano.

(…) o descontrole da urbanização levou à taxa de crescimento da extensão das vias a superar o crescimento da área urbana enquanto que os itinerários de transportes coletivos não acompanharam a tendência de crescimento. Esse inchaço da cidade foi devido à omissão do poder público em executar uma política urbana que norteasse o crescimento da cidade e controlasse os excessos da especulação imobiliária sobre o parcelamento do solo nas áreas periféricas da cidade. Isso concorreu para onerar os custos de transportes principalmente para os trabalhadores de menor renda.

A relação entre o uso do solo e os transportes na cidade repercutiu não somente nos elevados custos de urbanização e das tarifas, como afetou também o comportamento da mobilidade urbana e os modos de transporte utilizados pela população. O número de

passageiros transportados no modo ônibus diminuiu mesmo considerando a adaptação dos itinerários (aquém da demandas), o aumento da quilometragem percorrida e a renovação da frota de veículos em circulação. A população da cidade ficou menos dependente dessa modalidade de transporte.

Quem quiser conferir…

A dissertação de mestrado de Luciano Agra está acessível no seguinte endereço: http://www.ct.ufpb.br/pos/engurbana/arquivos/dissertacoes/10-2004.zip