A CPI do Acarajé

Rubens Nóbrega

Se eu fosse deputado de oposição, ontem mesmo teria iniciado a coleta de assinatura para instalar a CPI do Acarajé, que sob as bênçãos do Senhor do Bonfim terminaria com a deposição do nosso monarca por afronta gravíssima à pobreza extrema e à fome de pelo menos 2 milhões de paraibanos que vivem na indigência.

O motivo líquido e certo para a CPI a Assembléia já tem. Não é o caldinho de lagosta com lascas de bacalhau e filé de camarão rosinha, mas o que iguarias como essa vão custar aos contribuintes da Paraíba se o Ricardus I consumar a licitação pública marcada para hoje na Secretaria de Estado da Administração, em João Pessoa.

Através de um pregão presencial, pretende-se contratar um fornecedor capaz de abastecer a Granja Santana com nove mil quilos do que existir do bom e do melhor no mercado em matéria de carne, peixe e crustáceos e tudo o mais que for preciso para um banquete onde possam servir do prosaico acarajé a mais requintada paeja.

A feira da dacha oficial dá bem uma ideia do apetite pelo poder – poder de ostentação, inclusive – que tomou conta da Corte instalada na Paraíba em 1º de janeiro de 2011. Sem o menor pudor, consome milhões de reais dos cofres públicos em mordomias acintosas e escandalosas para o segundo Estado mais pobre da República.

Na Paraíba em que o Programa do Leite foi desmantelado e a defesa agropecuária destroçada por incompetência governamental, vamos pagar caríssimo para o governador e seus mais chegados se esbaldarem em comilanças de alto nível, porque é exigência expressa no próprio edital do pregão que tudo seja de primeira qualidade.

Quem se deu ao trabalho de ler a descrição da mercadoria a ser comprada para a Granja, publicada anteontem pelo jornalista Clilson Júnior no portal Clickpb e no Blog do Clilson, vai observar, por exemplo, que os 800 kg de filé de camarão a serem licitados têm que ser de ‘primeira qualidade’. Da mesma forma, os 800 kg de camarão grande, inteiro, que a família real e seus convidados devem saborear.

E o fornecedor e o bolso dos pagantes (nós) que se preparem, porque tudo tem que vir acondicionado em embalagem de filme PVC transparente, contendo identificação do produto, marca do fabricante, prazo de validade e todas as marcas e carimbos oficiais. Tais especificações devem encarecer bastante o negócio. Mas isso é problema do erário, não dos comensais, não é mesmo?

Chama a atenção, de outro lado, para além da riqueza, a diversidade das provisões alimentares majestáticas que vão encher a despensa da ‘residência oficial’. Se gastronomicamente é uma beleza, ecologicamente é um desastre, por incluir até o mero, um peixe em extinção e de comercialização proibida, segundo descobriu o mesmo Clilson Júnior, sempre arguto e contundente.

Mas se o mero não puder compor a peixada da Granja, sem problema! Vai ter dourado, badejo, salmão. E se o soberano enjoar peixe, os criados podem lhe preparar um filé mignon ou uma picanha argentina ou uma costela suína com no máximo 10% de gordura e 20% de osso ou uma carne de carneiro sem osso e sem gordura, porque tudo isso faz parte da lista de compras que vai prover o cardápio da realeza.

Juro como fiquei com água na boca só de ler o anexo do pregão destinado a comprar também galeto desossado e linguiça de carne suína, mas tem que ser “pura, em gomos, com no máximo 10% de gordura, com aspecto firme”, conforme está no edital. Evidente que também vão comprar carnes menos nobres e até peito de frango com osso em boa quantidade. Afinal, a criadagem também precisa comer, não é verdade?

Só tem uma coisa que não entendi nessa história. Por que diabos incluíram 600 kg de óleo de girassol no pregão? Pergunto porque me disseram que de uns tempos pra cá, como diria o poeta Chico César, o produto passou a ser fabricado na própria Granja.
Da indignação à gozação

A lista de compras do Ricardus I deve ter sido um dos assuntos mais comentados nas redes sociais nos dois últimos dias, especialmente no Twitter, onde inventei ontem de dizer que as nove toneladas de manjares divinos devem ser doadas à merenda escolar da rede de ensino mantida pelo Governo do Estado. Vejam algumas reações.

• Carlos Chagas: “É o povo passando fome e a Granja esbanjando”.

• Fátima Pessoa: “Pois é, amigos, cardápio #FARTO pra família real e FOME para o povo paupérrimo”.

• Vandemberg Nóbrega: “Rubens, se você quer perder peso, venha ser funcionário público estadual da Paraíba no gov RC”.

• Cuméquié Cuméquefoi: “Fica com tua sardinha, Rubão. Deixa o Mago engordar!”.

• Do mesmo tuiteiro: “Que mania de pobre, essa de vocês. O poder de um rei é medido pelo tamanho do banquete”.
Juiz quer fim das carreatas

Quando segunda que vem chegar, o Doutor Eduardo José de Carvalho Soares, juiz da propaganda eleitoral de rua em João Pessoa, vai reunir partidos e coligações e sugerir que não façam carreatas. Caso não haja acordo, quem fizer não vai ter como usar os principais corredores viários da Capital, o que já é um avanço.