No dia 12 de junho, Bráulio Fazolo deixou uma mensagem pública na página do MBL no Facebook informando sua decisão de sair do grupo.
O motivo era o apoio do MBL ao PMDB em troca de ajuda financeira e o uso do movimento como ferramenta de autopromoção por parte de alguns integrantes.
“Estou saindo da coordenação do Movimento Brasil Livre Espírito Santo representado aqui na figura de sua coordenadora geral Raquel Gerde pelos seguintes fatos. Após a sua confirmação pessoal de filiação ao PMDB e pela sua postura pessoal que vem defendendo de forma aberta escancarada esse partido, usando a mim e as pessoas do movimento para auto promoção política, não compactuo com corrupção e não defendo corrupto, defender o PMDB que é um partido tão corrupto quanto o PT é fazer associação criminosa”, escreveu.
Junto ao texto, ele anexou um áudio da coordenadora geral do MBL/ES, no qual ela confirma a filiação ao PMDB e diz que eles, do MBL, têm que “bater” nos corruptos e deixar o PMDB em paz.
“Você está querendo que eu acabe com o partido, é isso que você quer, que nós chegamos e batemos no partido, nós não podemos, nós temos que bater nos corruptos, mas não no partido porque não há motivos nenhum para a gente bater nele”, diz Gerde, referindo-se ao PMDB. Moradora de Guarapari, principal ponto turístico do Espírito Santo, Gerde tem 60 anos e foi candidata a deputada estadual em 2014 pelo PC do B.
Na entrevista ao DCM, Braúlio Fazolo fala sobre o papel exercido por Gerde na coordenação do MBL/ES e detalha os motivos que o fizeram sair do grupo.
Ele entrou para o MBL no começo deste ano, após participar de várias manifestações na Grande Vitória contra o governo e a favor do impeachment da presidente Dilma. Estudante de Direito em uma faculdade particular, Fazolo tem 29 anos de idade e trabalha como desenvolvedor de sites.
Como você chegou ao MBL?
Eu já tinha participação ativa nas manifestações, pouco antes da votação do impeachment no congresso. Tinha amigos do MBL e de outros movimentos daqui da Grande Vitória, como o Fora Dilma e o Levanta Brasil. Foi numa dessas manifestações que conheci a coordenadora geral do MBL aqui no ES, Raquel Gerde, que inclusive é uma das coordenadoras gerais do MBL nacional. Como a gente pactuava das mesmas pautas e dos mesmos ideais, ela me convidou para participar da coordenação aqui no ES, alegando que precisavam de alguém para cuidar dessa parte digital, da criação do site, do banco de dados para cadastro.
Isso foi antes da votação do impeachment na Câmara?
Antes da votação, no final de fevereiro. Eu participei das manifestações de março já pelo MBL, já havia me filiado ao movimento.
Quais eram suas atividades práticas na coordenação?
Eu cuidava do site, toda a parte do banco de dados, de cadastro de membros. Eu que desenvolvi a parte de banco de dados, a captação fui eu que desenvolvi, por estar responsável de dar acesso a Raquel e demais coordenadores a esse banco de dados, com informações de todas as pessoas cadastradas.
O que te levou a sair do grupo?
Foi após uma discussão. O MBL se modificou bastante desde a votação do impeachment no Congresso. Uma coisa que eu quero que fique clara é que o movimento recebeu dinheiro do PMDB. Não só do PMDB mas de alguns outros partidos, mas vou citar o PMDB em especial porque o nome do partido foi falado internamente nas reuniões. É um assunto que a gente nunca levou para fora dos grupos internos, dos núcleos. O MBL tem vários grupos abertos para quem diz simpatizar com a causa, e essas situações não são levadas para esses grupos, são tratadas em grupos internos. Essa questão do PMDB ter destinado fundos para pixulecos, panfletos, movimentação de pessoas que foram a Brasília acompanhar o impeachment sempre foi tratada com bastante tranquilidade, porque eles passavam para a gente que o PMDB era uma peça fundamental no impeachment.
Assim, o MBL caminharia com o PMDB até a votação e depois não seria mais possível porque a gente sabe, acho que hoje tem mais deputados e senadores do PMDB envolvidos em processos, sendo investigados por corrupção que o próprio PT. Como uma da pautas que a gente sempre carregou abertamente foi o combate à corrupção, a orientação que a gente tinha para falar para as pessoas era essa: “Olha, a gente não apoia o PMDB, gente está caminhando com o PMDB até o impeachment, porque o impeachment é impossível, é inviável sem o apoio do PMDB, mas que logo depois a situação seria revista”.
Assim como você, tem outros membros da coordenação insatisfeitos?
Da coordenação, uns 70%. A gente começou a estranhar… A questão financeira do MBL no ES sempre foi pessoal. Por exemplo, o site. As despesas de criação, registro de domínio, servidor, eu arquei com tudo, e quando a gente tinha que fazer determinadas movimentações, a gente fazia uma espécie de vaquinha, juntava todo mundo. Só que alguns recursos começaram a aparecer sem que fosse informado de onde vinha, de quem vinha, e o que é pior, onde estava sendo aplicado, porque da mesma forma que eles não informavam quanto foi angariado, eles também não informavam pra onde esse valor foi destinado especificamente, por exemplo, um Pixuleco gigante custou uns 30 mil reais.
Houve manifestações que custaram uns 60 mil reais e a gente sabe que não eram recursos angariados entre os integrantes, que na maior parte da sua composição têm uma certa restrição financeira, não são pessoas “bem de vida”. Assim, a gente começou a cobrar transparência sobre esses recursos e isso era sempre desconversado nas reuniões.
Inclusive algumas pessoas que bateram, persistiram na tecla, nessa pauta, foram convidadas a sair do grupo, foram consideradas pessoas de esquerda. É um assunto que nunca foi tratado muito bem, mas a gente sabia que existia o dinheiro que vinha do PMDB, a gente não sabia quanto, da mão de quem ele vinha e como esse dinheiro estava sendo aplicado. Para onde ele estava indo? Como ele estava sendo movimentado, na conta de quem? Ficavam sempre perguntas sem resposta.
Quem são os outros coordenadores?
Não queria envolver outros nomes, são amigos, pessoas com quem convivo. Não vem ao caso falar das outras pessoas por elas são como eu, a gente vai lá para ouvir e não é nem aberta uma contradição, uma discussão sobre as pautas. Eu falo assim porque quem dita como o MBL vai se posicionar aqui no estado é a Raquel Gerde. Ela é a representante nacional e uma das coordenadoras nacionais. É quem passa como o movimento vai agir, como vai se movimentar. Não vem ao caso falar das outras pessoas porque elas são como eu, a gente vai lá para ouvir e não é nem aberta uma contradição, uma discussão sobre as pautas. Ela sempre falou que a gente segue a discussão nacional.
Tudo passa por ela? Centraliza nela?
Financeiramente tudo passava por ela. Inclusive, ela utiliza contas pessoais para destinar esses recursos. A falta de transparência foi gerando dúvidas e com o passar do tempo, começaram a existir orientações da Raquel para evitar postagens contra o governo atual e contra o PMDB, que não era interessante. Se você pegar a página do MBL, tanto no nacional como no Espírito Santo, você não vai ver nada contra o governo atual. Isso foi se intensificando, a ponto de semana retrasada você encontrar manifestações contra o atitude de Janot de pedir a prisão de três integrantes do PMDB, Renan, Jucá e Sarney. Eles chegaram ao ponto de querer convocar reuniões para protestar contra o pedido. Eu comecei a questionar, falei assim, “tem alguma coisa errada acontecendo”.
Questionou o quê?
Questionei a questão financeira, a falta de transparência e o apoio repentino do MBL ao PMDB e ao governo Temer e aí, nessa discussão a Raquel afirmou (até mandei o áudio) e ela confirmou que estaria, ela é de Guarapari, né, ela já foi candidata a deputada estadual aqui, pelo PC do B, e aí ela … ela confirmou que … ela é uma pessoa que participou ativamente em Brasília, ela tem acesso ao Congresso, ao Senado, é a pessoa que passava informações pra gente de tudo que acontecia lá dentro, passava telefones de deputados para a gente pressionar, divulgando números, ligando, incentivando pessoas a ligar, então era uma pessoa que participava lá ativamente até mais que o Renan (Santos) e o Kim (Kataguiri).
Mais que o Kim e o Renan?
Mais, tanto é que o Kim e o Renan não participaram da votação, só ela, e o Renan foi retirado, foram retirados, né, de maneira forçada. Ela foi a única figura que ficou lá dentro.
Mas ela não aparece assim nacionalmente, nacionalmente, como Kim Kataguiri, Renan Santos, Rubens Nunes e o Fernando Holiday …
A Raquel alega que é uma ponte entre o MBL e esses partidos dentro do Congresso, porque ela é uma figura que tem contato com o PMDB, é aliada do deputado federal Lelo Coimbra, daqui do ES. Ela foi uma ponte para o MBL chegar lá dentro, ter acesso a essas pessoas no Congresso, inclusive, foi um dos motivos dela ter sido nomeada coordenadora geral aqui do Estado. Ela tem passe livre, ela entra e sai a hora que quer, tem contatos lá dentro. E aí, nessa discussão ela confirmou que iria mudar o domicílio, o título de eleitor para Vitória, que ela iria se filiar ao PMDB. Pra mim é muito claro, possivelmente ela vai se candidatar pelo PMDB. Na última reunião que a gente teve pelo MBL, eles expuseram que o MBL deixou de ser um movimento apartidário para ser suprapartidário, e claramente apoia o PMDB.
Em maio surgiu um áudio que revela que o MBL recebeu dinheiro do PMDB, PSDB, DEM e Solidariedade. Você já sabia disso antes dessa informação vazar?
Todas as pessoas que faziam parte da coordenação, da parte interna do MBL sabiam que esses repasses existiram.
Havia prestação de contas?
Nunca houve prestação de contas. Inclusive, é um dos problemas que eu tive porque a gente queria saber quanto estava vindo e para onde esse dinheiro estava indo, até para saber se alguém estava sendo favorecido.
Você recebeu ajuda de custo pelas atividades que desenvolveu?
Não, nenhuma. Nunca recebi nenhuma ajuda de custo do MBL.
Chegou a viajar?
Não, a faculdade me prendia muito, eu tive oportunidade de ir a Brasília no período da votação do impeachment no Congresso, mas era semana de prova.
Iria ficar acampado?
O MBL tinha uma estrutura montada, uma casa, o MBL não ficou acampado, as pessoas da coordenação não ficaram acampadas na votação do impeachment. A coordenação tinha um “QG”, uma casa que foi cedida por um deputado desconhecido, que a gente não sabe quem é, com carro disponível que levava e buscava as pessoas.
Antes da votação houve um acampamento. Nessa época o MBL não tinha essa afinidade, esse encontro do MBL com o PMDB. Depois que o MBL chegou ao PMDB e o partido começou a ajudar, a estrutura do MBL deu uma mudada. Em Brasília havia um lugar pra ficar, carro para levar as pessoas, alimentação. Isso foi depois. O acampamento foi no começo das movimentações para abertura do processo. Na votação já tinha essa cooperação do PMDB com o movimento.
Foi mais ou menos quando que começou essa cooperação?
Uma semana antes … quando os líderes saíram daqui para acompanhar a votação no congresso, as coisas já começaram a mudar e já começou a se falar dessa participação do PMDB colaborando, ajudando o MBL.
No âmbito nacional, Kim Kataguiri conseguiu uma coluna na Folha de São Paulo. Fernando Holiday se filou ao DEM e concorrerá a uma vaga de vereador por São Paulo. Rubens Alberto Gatti Nunes Filho, o “Rubinho”, pretende se candidatar a prefeito de Vinhedo. Você acredita que o MBL é um trampolim para projetos pessoais?
Eu acho, tenho certeza. A Raquel por exemplo, usa o MBL para promover sua imagem política e a gente tem visto isso acontecendo como você expôs no MBL nacional. E aí é o problema. Um movimento que nasceu apartidário de uma hora pra outra começa a ser suprapartidário e começa a vincular em partidos, e começa a dar respostas assim: “olha, não tem como mudar o país sem a política então nós precisamos participar da política”. Até aí tudo bem, mas a estranheza é a relação de fazer aliança com pessoas que estão sendo investigadas e envolvidas em processos de corrupção, como as pessoas que eles acusam. Então é muito claro e notório que eles estão usando da imagem de líderes do movimento para se apresentando a esses partidos, se filiando e tendo a oportunidade de concorrer a cargos.
E a gente vê hoje a troca da presidente por Temer, a gente vê que foi uma simples troca. O que ficou claro pra gente é que vão tirar o PT, e eu sou a favor disso, quero que fique bem claro. O PT tem que sair porque cometeram crimes e eles devem responder por isso. Mas queriam punir somente o PT, e aí punindo o PT parece que tudo está legal. Vamos fazer aliança com o PMDB, ele está do nosso lado e vai ajudar no nosso projeto de chegar à representação política em vários lugares do Brasil, vamos crescer assim, vamos fundar várias instituições… Isso me parece mais um projeto pessoal do que um movimento que está preocupado com as mudanças que o Brasil precisa.
Além da Raquel, você sabe de alguma outra pessoa aqui se aproveitando do MBL para alavancar projetos pessoais?
Eu não sei dizer nomes, mas dos 20 coordenadores, uns cinco ou seis pretendem lançar candidaturas pessoais.
Se arrependeu de fazer parte do movimento?
Olha, eu não me arrependi porque a verdade, por mais que seja triste, seja uma coisa que decepciona a gente, ela é necessária. Talvez se eu não tivesse passado por tudo isso eu estaria hoje achando que o MBL é um movimento que realmente luta pelas causas e pelas mudanças no Brasil. Estou falando aqui do MBL e não é só o MBL não. Infelizmente líderes de movimentos sociais estão sendo comprados, estão recebendo dinheiro de partidos para movimentar, criar um sentimento na população para serem guias de articulações que a gente vê acontecendo hoje. É fato que para o PMDB o apoio popular é uma coisa de suma importância e eu acredito que o partido está se articulando aí nessa figura de pessoas representativas nos movimentos sociais para melhorar essa imagem, querendo buscar de maneira mais fácil uma legitimidade popular para o governo do Temer.
A quais movimentos sociais você se refere?
Eu poderia citar vários, mas como eu não participo, não posso falar assim, o “Fora Dilma”, o “Vem Pra Rua”, porque eu não vivi dentro desses movimentos, mas com a posição que eles assumem em favor do governo alegando que novas eleições no Brasil seriam uma articulação do PT, eu sinto que essas pessoas também estão envolvidas.
A militância no MBL chegou a atrapalhar sua vida particular?
A gente acaba dedicando uma parte considerável do tempo da gente por uma causa, que eu acho assim, a questão do Brasil hoje é uma coisa que interessa a todos nós. Quem não está sofrendo com a questão econômica? Então eu acho que aquele tempo investido ali tinha um propósito que compensava o tempo que eu deixava de trabalhar pra mim, é uma coisa que querendo ou não iria beneficiar mais na frente não só eu mas todos os brasileiros. É lógico que sim, a gente acaba deixando de empregar tempo para atividades pessoais.
Você se arrepende?
Eu não me arrependo, inclusive minha luta continua. Vou continuar lutando ativamente contra a corrupção no Brasil.
Como pretende continuar?
Minha luta continua na rua, falando para um e para outro, criando grupos de discussão, grupos nas redes sociais, batendo na tecla de que as pessoas devem se envolver na política, que elas devem pensar.
Fonte: Platform Twitter