Jornalista e escritor, Rui Leitão tomou passe na Cadeira número 28 na Academia Paraibana de Letras, na sede da Fundação Casa de José Américo, na noite dessa terça-feira.
O novo imortal fez um discurso emocionante, afirmou que estava realizando um sonho e, como espera, citou o seu pai, o escritor e historiador Deusdedit de Vasconcelos Leitão.
Leia, abaixo, a íntegra do discurso:
“Senhor Presidente da APL, ilustres acadêmicos e acadêmicas, autoridades que se fazem presentes a esta solenidade, familiares, amigos. Senhoras e senhores.
Ao iniciar este pronunciamento estatutário, quero, em primeiro lugar, agradecer a Deus por me fazer merecedor de sua graça, dando-me a oportunidade de realizar um sonho acalentado por qualquer pessoa que se devota ao exercício da escrita, qual seja a de tornar-se membro da Academia de Letras de sua terra.
Todos os que têm a honra de ingressar nesta augusta casa de Coriolano Medeiros são filhos dos livros e da imaginação. Afinal, a academia nada mais é do que um lugar de convivência fraterna entre os que se dedicam à cultura, às artes, à educação, à história. Este é um templo de comunhão cultural, abrigando, de forma plural, pensamentos e ideias diversas. Aqui estão os que exercitam a arte da palavra escrita.
Ao ingressar na Academia Paraibana de Letras, ocupando a cadeira de número 28, vaga com o falecimento do Monsenhor Marcos Trindade, o faço no desejo de contribuir com a tradição cultural, linguística e literária de nosso estado, por considerá-la uma instituição de excepcional importância para os que se dedicam ao ofício das letras. O pluralismo intelectual que se afirma na composição do seu quadro de integrantes, enriquece o convívio acadêmico, agregando conhecimentos nas suas mais diversas manifestações culturais: científicas, literárias, artísticas e jurídicas.
A Academia é, inegavelmente, o sonho de qualquer escritor. Não poderia fugir à regra. Marcar presença na instituição cultural por onde já passaram as mais proeminentes figuras do ambiente acadêmico, artístico, intelectual e político da Paraíba, tendo, inclusive, a oportunidade de conviver com as mais expressivas personalidades contemporâneas do nosso mundo cultural, desperta em mim um sentimento de honra e de dignidade.
A primeira pessoa que fez acender em minha mente a pretensão acadêmica foi meu pai, o escritor e historiador Deusdedit de Vasconcelos Leitão. Por isso, permitam-me todos os que me prestigiam nesta noite, que inicie o meu discurso de posse reverenciando a sua memória. Vem, portanto, do berço esse apreço pelo mundo da literatura e da história. Aqui esteve ele ocupando a cadeira de número 16, cujo patrono era Francisco Antônio Carneiro da Cunha. Era um apaixonado pesquisador, dedicando-se a perscrutar os caminhos da nossa História e estudo das árvores genealógicas de famílias paraibanas. Imagino o quanto ele estaria feliz ao ver um dos seus filhos assumindo, como ele o fez em vida, a responsabilidade de, na condição de sócio deste sodalício, oferecer sua capacidade intelectual em favor da cultura de nosso estado. Dele e de minha mãe, dona Maria José, que não estão mais aqui neste plano terrestre, recebi a maior das riquezas: a educação e a honradez.
Agradeço aos que agora posso tratar como confrades e confreiras, por terem sufragado o meu nome para integrar o corpo efetivo desta Casa, ao tempo em que me coloco à disposição de todos para compartilhar trabalhos e iniciativas que possam ser úteis ao engrandecimento de nossa Instituição. Chego a esta casa do saber com a humildade de quem se considera um aprendiz diante da sabedoria dos senhores e senhoras que compõem esta entidade cultural.
A tradição impõe um ritual de saudação à memória do patrono e dos acadêmicos que ocuparam a cadeira de número 28 da Academia Paraibana de Letras, de maneira a demonstrar que a imortalidade formal significa, em termos concretos, a perpetuação da lembrança daqueles que, mesmo não estando mais fisicamente em nosso meio, permanecem vivos pela contribuição que prestaram à cultura da Paraíba. Os homens, por serem efêmeros, não são imortais. Imortalizadas ficam suas ideias, seus ideais e suas criações. Não é fácil substituir insubstituíveis.
Não existe situação mais confortável, para quem ingressa em um colegiado deste nível, do que ocupar uma cadeira cujo patrono foi um exemplo de honradez, decência pessoal e dignidade profissional. O Padre LINDOLPHO JOSÉ CORREA DAS NEVES, destacou-se em vida como sacerdote, jornalista, orador sacro, político e atuante líder do Partido Liberal, no Império. Nasceu em 1819 e faleceu em 1884. Foi Procurador Geral de Tesouraria, Professor de Filosofia e Álgebra e ocupou o cargo de Secretário de vários governos. Como escritor foi autor de livros como “Jesus Cristo e os Filósofos”, “A Vida Humana”, “O Plágio” “Sermões” e “Ensaios Filosóficos”.
Frequentou as primeiras escolas em Portugal, onde passou a residir aos cinco anos de idade. Voltando ao Brasil, matriculou-se no Seminário de Olinda, ordenando-se presbítero em 1834. Em 1947, bacharelou-se pela Faculdade de Direito de Olinda.
Seu sacerdócio foi sempre exercido na Capital paraibana, celebrando missa diariamente às seis horas da manhã na Igreja do Rosário. Em pouco tempo seus sermões ganharam fama. Dentre eles, merece destaque a oração fúnebre pronunciada nas exéquias de Sua Majestade Dom Pedro V, mandada fazer pelos súditos portugueses residentes na cidade de Mamanguape. Como pregador honorário da Capela Imperial pronunciou um sermão laudatório a Dom Pedro II, por ocasião da sua visita à Paraíba, em 1859.
Como parlamentar, filiado inicialmente ao Partido Conservador e depois transferindo-se para o Partido Liberal, seja na Assembleia Paraibana, seja na Assembleia Geral Nacional, o Padre Lindolpho ficou conhecido como um orador talentoso.
Em 1862, fundou O Publicador, primeiro jornal a circular diariamente na Paraíba, do qual foi seu diretor.
O sócio fundador da cadeira de número 28 foi o Dr. Apolônio Carneiro da Cunha Nóbrega. Advogado, filósofo, escritor e historiador, nasceu na Capital da Parahyba no dia 05 de janeiro de 1909 e veio a falecer no Rio de Janeiro em 1967. Exerceu os cargos de Promotor da Comarca de Santa Rita,de Diretor da Casa de Detenção e Procurador de Feitos, no seu estado natal. No Rio de Janeiro foi Procurador de Aposentadoria e Pensões dos Bancários.
Integrou o quadro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano.
Publicou os livros “Pioneiros do Café na Paraíba e no Ceará” e o “Dicionário de Filosofia”.
Teve como sucessor o Professor Milton Paiva, sem dúvida um dos mais influentes intelectuais paraibanos. Nasceu na cidade de Pilar, em 1923. Foi aluno do Seminário Arquidiocesano da Paraíba. Formou-se em Letras Clássicas pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras “Manuel da Nóbrega”, hoje Universidade Católica de Pernambuco. Conseguiu graduação, também, em Direito, Filosofia e Especialização em Linguística.
Foi Diretor do Colégio Estadual de Campina Grande, do Lyceu Paraibano, do Departamento de Educação do Estado, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, do Instituto Central de Letras, do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, na UFPB, onde viria a ocupar o cargo de Reitor. Quando criada a Fundação Casa de José Américo, foi nomeado pelo então Governador Tarcísio Burity como seu primeiro presidente.
Ingressou na Academia Paraibana de Letras em 1981, sendo saudado pelo acadêmico José Rafael de Menezes. Também pertenceu à Academia Campinense de Letras.
Publicou os livros: “A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras no contexto do Ensino Superior brasileiro”, “O Papel da Universidade Brasileira no Desenvolvimento nacional”, “Perspectivas da Reforma Universitária”, “Uma análise da Educação Brasileira”, “A flexão dos nomes nas principais línguas românicas”, “O ensino do Português em face das novas correntes lingüísticas”, “O substantivo: Uma classe de palavras”, “Uma edição crítica de A Bagaceira” e “O itinerário de Dumerval Trigueiro”.
Faleceu em outubro de 2002.
Tenho plena ciência da responsabilidade ao suceder o Monsenhor Marcos Trindade, na cadeira de número 28, da Academia Paraibana de Letras. Tive a felicidade de ter sido seu aluno no Seminário Arquidiocesano da Paraíba. Pude testemunhar a sua ação evangelizadora, educativa e intelectual, que o credenciou a se tornar um dos imortais da Casa de Coriolano de Medeiros. Portanto, suceder o Monsenhor Marcos Trindade já representa um motivo de especial honraria.
O Monsenhor Marcos Augusto Trindade nasceu em João Pessoa, no ano de 1927. Integrante de uma família com sólida formação cristã, matriculou-se no Seminário Arquidiocesano da Paraíba, em 1941. Sua ordenação sacerdotal aconteceu no dia 08 de março de 1952, na Basílica de São João de Latrão, em Roma, na Itália, após estudos na Pontifícia Universidade Gregoriana, onde concluiu os cursos de Bacharelado e Mestrado em Teologia.
Voltando ao Brasil tornou-se professor do Seminário Arquidiocesano e Assistente da recém-fundada Juventude Estudantil Católica (JEC). Ali, atuou como diretor espiritual, Vice-Reitor e Reitor. Como já falei antes, tive a honra de ter sido seu aluno naquela instituição de ensino da Igreja Católica. Por 24 anos seguidos dirigiu o Colégio Arquidiocesano Pio XII.
No magistério universitário, na Escola de Serviço Social da UFPB, ministrou várias disciplinas na área social: Política Social, Cultura Religiosa, Filosofia das Religiões, Sociologia, Organização Social e Política do Brasil e Doutrina Social da Igreja.
Presidiu o Conselho Estadual de Cultura.
Em 1971, juntamente com os educadores Afonso Pereira, Flávio Colaço, José Loureiro, José Trigueiro e Manoel Batista, fundou os Institutos Paraibanos de Educação (IPÊ), depois transformado no Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ), onde foi Reitor, adotando como projeto fundamental o lema “Ensinar a Paraíba a Pensar”.
Tomou posse na Academia Paraibana de Letras no dia 09 de maio de 2003, sendo saudado pelo acadêmico José Loureiro Lopes.
No exemplo de todos eles, buscarei inspiração para desincumbir-me da responsabilidade que assumo, a partir de hoje, nesta Casa de Letras, responsabilidade que se faz maior porque venho suceder uma figura extraordinária da intelectualidade paraibana. É meu desejo, modestamente, levar adiante o magnífico trabalho de todos eles
Na esperança de ter cumprido a contento a honrosa missão de prestar tributo ao patrono e meus antecessores, permito-me agora voltar um pouco a lembrança para os caminhos passados que me conduziram ao momento presente.
Tenho me dedicado ao exercício de escrever. E tenho feito isso diariamente, seja na elaboração de livros, seja na publicação de textos no jornal A UNIÃO e veículos da mídia. Desse trabalho literário, já resultaram cinco livros publicados: 1968 – O Grito de uma Geração, A Essência da Sabedoria Popular, Canções Que Falam Por Nós, Sentimentos, Emoções e Atitudes, Um Olhar Interpretativo das Canções de Chico. Considero-me um garimpeiro do passado e um cronista do cotidiano.
Na minha vida profissional, estive no exercício de atividades que têm a ver com a produção cultural da Paraíba e a defesa do seu patrimônio histórico, o que me oferece experiência para oferecer esforços no sentido de ser um coadjuvante na construção de nossa memória cultural e histórica. Em 1985, participei da Comissão Organizadora dos Eventos Comemorativos do IV Centenário da Paraíba, na condição de seu secretário executivo, e presidida pelo confrade José Otávio de Arruda Melo. Ocupei o cargo de Diretor do IPHAEP – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba. Por duas vezes, assumi a superintendência da Rádio Tabajara, oportunidade em que foi instalada a sua emissora FM. Desde o ano passado, por convite do Governador João Azevedo e da Presidente da Empresa Paraibana de Comunicação, a jornalista Naná Garcez, voltei à mais antiga emissora do estado, agora como Diretor de Rádio e TV, onde estamos trabalhando na execução de dois importantes projetos: a migração da Tabajara AM para Parahyba FM e a instalação do Museu do Rádio Paraibano. Tive também a honra de ter sido superintendente do Jornal A UNIÃO, o mais antigo veículo de comunicação impresso da Paraíba e o único atualmente em circulação em nossa capital. Na administração municipal, exerci o cargo de Coordenador do Patrimônio Cultural e Artístico de João Pessoa.
Venho trabalhando a elaboração do livro “INVENTÁRIO DO TEMPO II”, mesmo título da obra de memórias do meu pai, embora sem a intenção de autobiografia, mas com o desejo de exercitar reminiscências que tratam de acontecimentos de vivência da contemporaneidade interessantes para serem relembradas. Estou também envolvido num trabalho de pesquisa para elaboração de um livro sobre a história do Sindicato dos Bancarios da Paraíba, por solicitação de sua atual diretoria., que deverá ser lançado por ocasião das comemorações de aniversário em abril do próximo ano.
Este é um momento muito especial na minha trajetória de vida. Quero compartilhar dessa alegria com minhas filhas Candice, Cristiane, Cibelle e Vanessa, que aqui se fazem presentes, minhas obras primas, razões e inspirações maiores de tudo o que faço. Bem como Rodolpho, que não pôde comparecer a esta solenidade por conta de compromissos de trabalho. A Cecília, minha esposa, cúmplice de meus desejos e reconforto entre as batalhas, e Nicole, minha enteada, com as quais divido os momentos atuais do meu viver, registro os meus agradecimentos pela paciência com que têm acompanhado meus passos profissionais e literários, oferecendo estímulo e entusiasmo para bem exercer esses ofícios. E não poderia deixar, igualmente, de abraçar meus netos e netas, André Filho, Gabriel, Júlia, Isabela e Davi, que vieram prestigiar este instante glorioso do avô, bem como Eduardo, Philipe e Elisa, que não estão presentes. Agradeço aos meus irmãos e irmãs, Fátima, Elza, Nísia, Eliziário, Wilton e Wilson, genros, cunhados e cunhadas, e demais familiares, que reservaram tempo em suas agendas para aqui comparecer e testemunhar o meu ingresso na mais importante casa de cultura da Paraíba. Mas quero fazer um registro emocionado de homenagem a alguém que deixou imensa saudade no meu coração, mas que, enquanto tive a felicidade de com ela compartilhar momentos da minha vida, ter recebido sempre palavras de incentivo e de apoio em todos os projetos por mim abraçados. Trata-se de minha querida irmã, Rita de Cássia, vitimada por essa terrível pandemia da Covid 19. Lá no céu, ela deve estar comemorando essa minha conquista ao lado de meus pais.
Não poderia de, ao final desta minha mensagem de ingresso na APL, deixar de registrar uma palavra de agradecimento ao meu ilustre e eminente amigo, acadêmico Helder Moura, pela manifestação de acolhimento a este centro de cultura. Jornalista respeitado pela forma independente e responsável com que exerce o seu ofício na imprensa paraibana; escritor consagrado, com produção literária já ultrapassando as fronteiras de nosso país, Helder Moura, confere honraria maior a este momento, ao dedicar-me referências, talvez um tanto exageradas, quanto à minha capacidade literária. Somos velhos “camaradas”, como ele gosta de tratar seus amigos de convivência.
Ao finalizar, relembro uma frase de Platão, em homenagem àquele que foi o responsável pela criação da primeira Academia da História da humanidade: “Tente mover o mundo, mas comece movendo a si mesmo”.
Muito obrigado.”
Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Polêmica Paraíba