Às vezes o erro de cálculo político, de mãos dadas com a ambição incontrolável, põe tudo a perder na carreira dos homens públicos. Foi o que aconteceu com o ex-governador Wilson Braga (falecido este ano) quando renunciou à prefeitura de João Pessoa em 1990 para disputar novamente o governo do Estado, que perdeu em segundo turno para Ronaldo Cunha Lima. Braga se elegeu prefeito em 1988 derrotando três máquinas – federal, estadual e municipal. O Planalto estava sob controle do PMDB com José Sarney, que assumiu na morte de Tancredo Neves; no Palácio da Redenção reinava Tarcísio Burity, de quem Braga se tornara arqui-inimigo, e na prefeitura estava Carneiro Arnaud, que em 85 Wilson ajudara a eleger, numa aliança do PFL com o PMDB.
Mesmo se jactando de dar combate a três máquinas e sair vitorioso, Wilson tinha diante de si grandes possibilidades de empreender uma boa gestão na prefeitura de João Pessoa. A experiência à frente do governo do Estado a partir de 1983, com investimentos maciços na Capital, o credenciava a tirar de letra a administração dos problemas de João Pessoa. A possibilidade de retaliação dos governos federal e estadual não era considerada. Na primeira entrevista que concedeu a um órgão de imprensa escrita, a revista “A Carta”, Wilson sinalizava não querer o confronto com Burity, esperando, no contraponto, que este respeitasse a autonomia do município. Havia um clima propício à boa gestão – Wilson tinha influências junto a esferas de poder em Brasília pela sua atuação como deputado federal e dispunha de “faro” para descobrir e viabilizar projetos e forrá-los com recursos que garantissem a continuidade.
No radar do prefeito pesava, contudo, a ambição de retomar o governo do Estado – e isto lhe custou caro, além de esmaecer a biografia da sua passagem pelo Paço Municipal. Braga entrou no páreo em outubro substituindo a mulher, Lúcia, que alegou como justificativa a necessidade de dar assistência integral à filha Patrícia, em dolorosa recuperação no hospital Albert Einstein, em São Paulo, como consequência de um acidente automobilístico que sofrera em Alfenas, Minas Gerais. Lúcia aparecia em pesquisas de opinião pública disparando com 45% de aceitação. Wilson largou com 31% dos votos e tinha menos de dois meses de campanha para recuperar o tempo perdido. Logrou ser vitorioso no primeiro turno, derrotando candidatos como João da Mata (apoiado por Burity), Haroldo Lucena (do PMDB de Humberto, Sarney e Carneiro), Hermano Almeida, entre outros. Mas frustrou o eleitorado pessoense quando não esquentou cadeira na prefeitura.
Tanto decepcionou que foi derrotado em 1990 ao governo e em 92, numa cruzada dramática para retomar espaços, candidatou-se a vereador na Capital, puxando uma boa bancada e até mesmo ascendendo à presidência da Câmara. Mas, lá, a permanência ainda foi mais breve do que na prefeitura. Wilson andava em círculos sem conseguir esconder uma obsessão fixa – a de retornar ao governo do Estado, o que não se verificou, ou de conquistar um mandato de senador, que não logrou inscrever na sua biografia pontuada por outras vitórias. O último mandato que exerceu foi o de deputado estadual, que, curiosamente, foi o primeiro que ele exerceu, por volta de 1954, quando fez sua estreia em grande estilo, respaldado por sua passagem ativa pela Casa do Estudante na Capital paraibana.
Quando se lançou candidato a prefeito de João Pessoa pelo PDT, Braga fez uma leitura correta sobre as perspectivas de vantagem em relação a outros postulantes, assim resumida: “Sou conhecido até por crianças e velhos. Tenho serviços prestados a todas as camadas da população. Os outros candidatos são ilustres desconhecidos. Alguns deles nem residem na Paraíba”. Ele não deixou de assinalar, no discurso de campanha, a facilidade que teria para conseguir recursos para o município, com isto exorcizando fantasmas de possível discriminação por parte dos governos federal e estadual, com quem não estava alinhado. Esse diagnóstico encontrava eco porque grande parte da população pessoense conhecia a habilidade e o “jogo de cintura” de Wilson Braga em termos políticos. Não por acaso, ele era referenciado como raposa política, alusão a personagens experientes, com domínio de intrincadas questões administrativas. Esse vestibular, como registramos, ele havia feito ao se investir no governo do Estado anos atrás.
Logo após proclamados os resultados que lhe deram a vitória à prefeitura, Wilson Leite Braga deixou claro que a sua gestão não seria marcada por obras suntuosas nem faraônicas. Chegou mesmo a pontuar que seria marcada pela simplicidade. “A cidade está tão estragada que requer uma administração de reposição. Além disso, a administração será de muita austeridade”, asseverou o novo prefeito de João Pessoa. Já se discutia em Brasília a reforma tributária (que ainda hoje está em pauta). Wilson acreditava que a partir do segundo ano do seu governo o bolo de recursos para municípios iria crescer, favorecendo a sua administração.
Não deu tempo porque a ambição bateu à porta e o canto da sereia da volta ao governo voltou a seduzi-lo. Carlos Mangueira, o vice-prefeito, fez o que pôde, nas condições de temperatura e pressão vigentes, para corresponder às expectativas e demandas urgentes da população, mas é evidente que os resultados não apareceriam num passe de mágica, como não apareceram. Wilson poderia ter se consagrado na prefeitura da Capital mais do que no governo do Estado, guardadas as proporções? Infelizmente não dá para teorizar sobre o que não tinha que ser. Mas fica a impressão de que a chance de uma boa gestão, pelo menos, foi jogada fora.
Fonte: Os Guedes
Créditos: Os Guedes