Sergio Moro já foi o ministro mais popular do governo do presidente Jair Bolsonaro, pela reputação conquistada ao tempo em que foi juiz e desbaratou escândalos na Lava-Jato, além de ter tido a coragem de decretar a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que posava de vestal da política brasileira. Coube a Moro emprestar credibilidade ao governo do capitão, diante de erros crassos que este cometeu. Com o tempo, Moro foi tendo atribuições esvaziadas, poderes amputados e entrou na linha de tiro de Bolsonaro, acostumado a alvejar ministros que aparentemente fazem sombra ao seu ego e atrapalham suas pretensões de se impor como candidato à reeleição em 2022 (se o impeachment não vier antes disso).
De ontem para hoje, Sergio Moro tornou-se um sério problema para Bolsonaro, a partir do momento em que este comunicou ao ministro que iria mudar o comando da Polícia Federal, trocando o atual diretor, Maurício Valeixo, por um nome “in pectoris”, da confiança absoluta, do mandatário. Qual o mal de Valeixo? Abrir investigações contra pessoas do entorno de Bolsonaro. No caso da apuração de fakenews, que, inclusive, foi aberta pelo STF, há a suspeita de que filhos do presidente, entre eles o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) estejam por trás de um gabinete do ódio supostamente mantido pelo Palácio do Planalto para atacar desafetos políticos. Moro sinalizou resistência à exoneração de Aleixo e o impasse continua, gerando suspense que pode ser resolvido a qualquer momento, em meio a uma das reações instáveis típicas do capitão que está presidente.
Registra a “Folha de S. Paulo” que um dos primeiros incômodos do presidente com a PF na gestão Moro se deu no início do mandato com a instauração de inquérito contra o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, para apurar esquema de candidaturas laranjas do PSL em Minas Gerais. Em outubro, o ministro foi denunciado à Justiça sob acusação de falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita de recurso eleitoral e associação criminosa. Apesar do constrangimento gerado pela situação, o presidente manteve o aliado no cargo e em mais de uma oportunidade demonstrou irritação com as conclusões a respeito. Ainda em outubro, ele disse que o responsável pela investigação na PF “agiu de má fé” no inquérito e que a intenção não foi atingir o ministro, mas o presidente da República. Dois meses antes, o presidente havia gerado instabilidade na PF ao anunciar que trocaria o superintendente do órgão no Rio de Janeiro, por questões de gestão e produtividade.
Em janeiro deste ano, ainda conforme a “Folha”, Bolsonaro pôs novamente sobre a mesa a troca de comando na polícia, ao incentivar movimento que pedia a recriação do Ministério da Segurança Pública. Nessa hipótese, a corporação seria desvinculada da Justiça, ficando sob responsabilidade de outro ministro. Mas o presidente novamente voltou atrás e disse que a chance de alterações era nula. Bolsonaro também manifestou contrariedade ao tratar de inquérito sobre um de seus auxiliares mais próximos, o chefe da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Fabio Wanjgarten. A pedido do Ministério Público, a PF abriu a investigação no início deste ano para apurar o envolvimento dele em supostas práticas de corrupção passiva, peculato (desvio de recursos por agente público) e advocacia administrativa (patrocínio de interesses privados na administração pública). O secretário nega qualquer irregularidade.
Maurício Valeixo, que foi quem recepcionou o ex-presidente Lula na sua chegada à Superintendência da Polícia Federal em Curitiba para cumprir pena de 580 dias de prisão, foi do time de Sergio Moro na Operação Lava-Jato e conta com vinte e três anos de experiência na instituição. Atuou nas áreas de combate ao narcotráfico e ao crime organizado. Versões dão conta de que, além do incômodo de Bolsonaro com ações da PF que atinjam seus familiares e alguns amigos, há pressões de parlamentares do chamado “Centrão” em cima do presidente para destituir Moro inapelavelmente. Valeixo foi importante na execução da pena do ex-presidente Lula, que chegou a obter uma ordem de soltura por parte do desembargador Rogério Favretto, que estava de plantão. Mas o então chefe da PF no Paraná pediu esclarecimentos ao Tribunal Federal da Quarta Região sobre a decisão. Ao final, Lula permaneceu preso até novembro de 2019.
A deputada Joice Hasselmann, ex-aliada de Bolsonaro, provocou o presidente afirmando que ele “amarelou” na decisão de livrar-se de Sergio Moro da Pasta da Justiça. Bolsonaro é ciclotímico, imprevisível. Não sabe governar, não sabe liderar auxiliares, não tem bom senso e cava quase diariamente o próprio impeachment, em atitude kamikaze nunca vista na história do país. Resta conferir como vai estar seu humor hoje, na saída do Palácio da Alvorada, onde se refugia em Brasília, quanto à nova crise nada artificial que ele mesmo incentivou, não bastasse a pandemia do coronavírus.
Fonte: Os Guedes
Créditos: Os Guedes