No elevador tocava… música de elevador.
Ambiente de escritórios, clínicas médicas. Um destes complexos mais refinados da cidade. Mas a cena era a mesma tradicional, remetendo a infância quando era “arrastado” por minha mãe para consultórios médicos em Itabuna.
Só me vem a cabeça o Módulo Center na Beira Rio. Na minha infância “tabaréu” aquilo era o mais luxuoso equipamento desta natureza que podia existir. Bela Avenida Beira Rio, vista para o outrora imponente Cachoeira, hoje, infelizmente, nada mais que um esgoto a céu aberto, com todo aspecto sujo e exalando fedentina.
Mas voltando a minha aventura em elevador moderno com atmosfera antiga…
A ascensorista (sim esta profissão ainda existe) simpática anunciava os andares, pessoas saíam, outra entravam. O meu destino era quase o topo do empresarial (para o alto e além).
Ambiente mais esvaziado, de repente restava apenas a funcionária, eu e uma senhora de bobs no cabelo (estavam querendo mesmo me levar de volta a Buerarema oitentista). Nostalgia pura.
Sem barreiras de corpos humanos aquele som de elevador ganhava amplificação. A música parecia uma mistura de Kenny G com Enya. Percebo a caixinha no chão. Não resisto e comento, gracioso.
– Essa música acalma durante cinco minutos, depois vira um tormento ao longo do dia de trabalho né??
Solto a pilhéria sem saber a reação. Estilo o meme “larguei e corri”. Só que, n o caso, eu não tinha pra onde ir.
Pronta e simultaneamente, a senhora e a jovem funcionária irrompem em gargalhadas.
Chega a rota da outra passageira. Ela se despede amigavelmente, ainda com sorriso estampado no rosto.
Imediatamente me viro para a ascensorista e, sem deixar espaço para “fuga” pergunto:
-Essa caixinha e opção musical é da empresa. Um padrão, né?
Ela assente.
Emendo:
-Se fosse por opção, gosto musical seu, o que estaria tocando aqui agora, ao longo do dia transportando a mim e todos os outros:
Sem titubear, de bate-pronto, a jovem responde:
-Oxe, taria tocando JOÃO GOMES.
Faço uma derivação na sequência natural dos acontecimentos aqui para exercitar minha filosofia de botequim…
Conversas amenas, descontraídas com desconhecidos são sempre revigorantes.
Nos aproxima mais de algo humano. Aquela máxima “gentileza gera gentileza”.
A jovem, diariamente, robotizada ali. Pessoas invisibilizadas. Prestando serviço a outros, atendendo centenas, talvez milhares, diariamente, mas ignoradas, sem serem vistas, ou notadas.
Sobe, desce, aperta botão, anuncia andar, cara-crachá. Muitas vezes precisam apenas de alguma empatia, reação natural, atenção mínima. E eu ainda aproveito para gastar uma piada sem graça.
Voltando a minha mais nova amiga e seu gosto musical revelado entusiasticamente…
Apesar da divertida interação, tive que carregar o ônus de ter ficado o dia inteiro com aquela “munganga” do “vaqueiro-trovador” cantando dentro do meu ouvido:
-Hã, hã, hã, hã…
-Essas pragas grudam na mente por osmose e como diz o menino Buarque: “Até música de elevador me prende a atenção”.
Fonte: Marcos Thomaz
Créditos: Polêmica Paraíba