implícito

“RACISTAS SÃO OS OUTROS”! A negativa de Mourão quanto ao racismo estrutural no Brasil seguirá matando negros e massacrando minorias pelo país?

Em entrevista concedida no ano passado, o antropólogo Kabengele Munaga, congolês naturalizado no Brasil, doutor em Antropologia pela USP, disse que “No Brasil o racismo é implícito. De fato, ele nunca foi oficializado nos princípios da pureza de sangue, da superioridade e da inferioridade racial. Por causa dessa ausência de leis segregacionistas, os brasileiros não se consideram racistas, quando se comparam aos demais países. Se olham nos espelhos sul-africanos, americanos e nazistas e se percebem sem nenhuma mácula, em vez de se olharem em seu próprio espelho. Assim ecoa, dentro de muitos brasileiros, uma voz muito forte que grita ‘não somos racistas! racistas são os outros!’ Essa voz forte e poderosa é o que chamo inércia do mito da democracia racial”.

Em entrevista concedida no ano passado, o antropólogo Kabengele Munaga, congolês naturalizado no Brasil, doutor em Antropologia pela USP, disse que “No Brasil o racismo é implícito. De fato, ele nunca foi oficializado nos princípios da pureza de sangue, da superioridade e da inferioridade racial. Por causa dessa ausência de leis segregacionistas, os brasileiros não se consideram racistas, quando se comparam aos demais países. Se olham nos espelhos sul-africanos, americanos e nazistas e se percebem sem nenhuma mácula, em vez de se olharem em seu próprio espelho. Assim ecoa, dentro de muitos brasileiros, uma voz muito forte que grita ‘não somos racistas! racistas são os outros!’ Essa voz forte e poderosa é o que chamo inércia do mito da democracia racial”.

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. É o que nos assegura o art. 5º da constituição brasileira afirmando a igualdade e a não discriminação por meio destas palavras. Ok, eu acredito e devo respeitar a nossa Constituição promulgada – três anos e meio após um difícil período de castração dos direitos civis – em 1988! Mas quem até o momento nos garantiu a inviolabilidade do Art.5º da Constituição Federal? No Brasil, a Constituição de 1988 atesta, ao menos teoricamente, a igualdade de todos e todas perante a lei! Mas, quantos infratores foram severamente punidos pela Lei, ao discriminar outro cidadão apenas por este ter a pele um pouco mais escura ou estar socialmente inferior a categoria mais branca que acredita ter um poder aquisitivo um pouco maior?

Sempre foi assim! E não preciso recorrer a história para justificar o que falo. A história recente sempre nos traz eventos tristes de desrespeito aos direitos constitucionais, com flagrantes atentados ao que me atrevo chamar de uma utópica Democracia racial – que é um termo que diz respeito a uma suposta igualdade entre raças diferentes – o que pressupõe igualdade e livre participação. Não é exatamente o que temos visto desde a promulgação da Carta Magna a 32 anos! Não sei se devo me arriscar a dizer que por um curto período o Brasil chegou a vislumbrar uma possibilidade de ver o respeito às leis e aos cidadãos, independentemente de raça, credo, cor ou condição financeira, ser praticado! Talvez!

Mas a verdade é que o conceito de “raça superiora” vem num crescente assustador e, nos últimos anos tem aflorado em cada “cidadão de bem”, fomentando o desprezo, a discriminação e um racismo doentio em que aquela pessoa, crente da sua condição branca e superior, acha que pode agredir moralmente, fisicamente e até mesmo matar outra pessoa por que ela é negra ou não pensa exatamente como ela (a criatura alvíssima e pura) gostaria que pensasse!

De uma forma mais global, A Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece que todo ser humano tem direitos invioláveis que devem ser respeitados em qualquer situação. No inciso I do art. 2º, afirma-se que “todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”. Tudo isso está numa Lei Universal! No entanto, essas pessoas “especiais” parecem ignorar completamente, qualquer lei – ou por completo desconhecimento ou por serem apenas pessoas más!

O caso mais recente, da morte por espancamento, de um cidadão negro no estacionamento do Carrefour de Porto Alegre, no último dia 19 de novembro, não foi a primeira e provavelmente – em continuando esse processo de impunidade recorrente no país – não será a última! João Alberto Silveira Freitas, foi assassinado por dois seguranças daquele estabelecimento, com a conivência de muitos outros que assistiam passivamente aquele espetáculo de horror! A prova é tanta, de que faltam punições mais severas para crimes dessa natureza, que o Brasil prossegue matando, injuriando (e em muitos casos, vemos e ouvimos agressores pedindo desculpas ou justificando demência após os atos praticados)!

O fato que mais uma vez chocou o país – e parece não haver abalado as autoridades, – tem suscitado discussões e muita revolta e principalmente críticas mais severas da comunidade internacional que assiste estarrecida as mortes (até anunciadas) sem que, com tudo, a autoridade maior do país admita o que se passa por aqui! Causou revolta a declaração do vice-presidente, Hamilton Mourão ao minimizar o problema, lamentando, ao mesmo tempo que afirmando que no Brasil não existe racismo estrutural. “Para mim, não existe racismo no Brasil. É uma coisa que querem importar, mas aqui não existe”, disse o vice-presidente. Por mais que pareça comum para um governo de extrema direita, a frase chega a chocar!

Eu aproveito e volto ao antropólogo Munaga, citado lá no comecinho desse artigo, o qual, em estudos mais recentes, acusa a existência de uma crise que vem causando a destruição dos direitos já adquiridos por meio de políticas públicas em nosso país. Segundo o pensador, o racismo aqui, ao mesmo tempo em que é evidente em alguns casos, também é, na maioria das vezes, velado”.

Infelizmente, no Brasil, inúmeras Leis são criadas todos os dias e bem poucas são, de fato, praticadas. Em matéria publicada pela BBC NEWS BRASIL, em junho deste ano, logo após o assassinato do negro George Floyd nos EUA, por um policial branco, “a grande maioria das pessoas mortas por intervenções policiais no Brasil são negras. Entre 2017 e 2018, segundo dados compilados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, dos 6.220 registros de mortes por intervenções policiais daquele ano, 75,4% eram pessoas negras, sendo que, segundo dados do IBGE, esse grupo representa 55% da população. Além disso, 99,3% eram homens e 77,9% das vítimas tinham entre 15 e 29 anos de idade. Entre 2017 e 2018, 75% dos mortos pela polícia no Brasil eram negros”. Ainda, segundo a matéria, só para ilustrar melhor esse quadro assustador, “Claudia Silva Ferreira, mulher negra, foi vítima de violência policial quando foi morta aos 38 anos e arrastada por 350 metros por uma viatura da Polícia Militar na zona norte do Rio em 2014. Seis anos depois do crime, nenhum dos policiais acusados do homicídio e da remoção do cadáver de Cláudia foi punido”.

O racismo, assim como a misoginia, a homofobia e a intolerância religiosa são problemas sociais, éticos e jurídicos que precisam ser severamente enfrentados. O decreto nº 7716, de 5 de janeiro de 1989, define quais são os crimes resultantes de raça ou de cor e como eles devem ser punidos. O decreto existe, os crimes são reconhecidos, mas a impunidade é uma triste realidade!

Só para citar um outro grande pensador brasileiro do século XX, o sociólogo e professor Florestan Fernandes, que era doutor em Sociologia pela USP, em sua tese – A integração do negro na sociedade de classes, afirma que “[…] a democracia só será uma realidade quando houver, de fato, igualdade racial no Brasil e o negro não sofrer nenhuma espécie de discriminação, de preconceito, de estigmatização e segregação, seja em termos de classe, seja em termos de raça. Por isso, a luta de classes, para o negro, deve caminhar juntamente com a luta racial propriamente dita”.

Ao final desse artigo um questionamento imperativo para uma reflexão: O que poderia haver de diferente entre um homem/mulher de pele preta e um homem/mulher de pele branca, para que pessoas possam se sentir no direito de escravizar, humilhar, odiar e até matar sem sequer expressar qualquer remorso? E ainda mais: Porque essa desigualdade resiste aos séculos sem que as autoridades adotem providências e façam cumprir as leis? Será essa a verdade de que, no fundo, no fundo, falta mesmo é vontade política para pôr fim ao racismo, mantendo sempre mais alto o muro que separa as classes menos favorecidas para continuar, também, mantendo os mais poderosos no poder?

Fonte: Francisco Airton
Créditos: Polêmica Paraíba