Na foto de cima, o prédio que serviu de endereço ao Paraíba Hotel, tendo, à direita, o ex-Ipase; na outra, a homenagem a Vidal de Negreiros, tendo, ao fundo, os prédios Duarte da Silveira (à direita), em péssima condição, e do antigo casarão dos Ávila Lins.
Na foto de cima, o prédio que serviu de endereço ao Paraíba Hotel, tendo, à direita, o ex-Ipase; na outra, a homenagem a Vidal de Negreiros, tendo, ao fundo, os prédios Duarte da Silveira (à direita), em péssima condição, e do antigo casarão dos Ávila Lins.

Quando, em 12 de outubro de 1924, foi dada como concluída a primeira intervenção urbanizadora do velho Ponto de Cem Reis, a realidade da urbe pessoense impunha-lhe uma vocação bem diferente da que o logradouro tem atualmente, embora já, naquele momento, dessemelhante do seu passado. No lusco-fusco do Século XIX, o local centralizava o tráfego de bondes movidos por tração animal, e a partir de 1914, impulsionados por eletricidade. Do preço das passagens, 100 reis, veio a denominação popular.

Então, naquele dia dos anos 1920, após as demolições da seiscentista Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, símbolo de toda aquela área, do prédio do cinema Morse, afora outras edificações, e implantados um pavilhão, um relógio central e estacionamento para “carros de praça” (os atuais taxis e automóveis por aplicativos), tudo mudou. Porém, outras modificações ocorreram a partir dali, como as derrubadas do pavilhão (com a construção de outros dois), da mansão do Barão de Maraú (em 1929), que virou o Paraíba Hotel, a substituição do prédio da Farmácia Régis pelo do esquisito edifício do mesmo nome, e a substituição do relógio central pelo busto de André Vidal de Negreiros, herói paraibano, denominação oficial do logradouro.

No correr do tempo, o Ponto de Cem Reis passou a centralizar o tráfego de automóveis e de ônibus, que aceleravam na capital paraibana, e de gentes. Foi quando, em 1970, já sem os bondes, atingiu o ápice das mudanças a que foi submetido, com a edificação de um entroncamento viário urbano consagrado ao automóvel e aos ônibus, por meio de um sistema de viaduto e alça (na direção da Lagoa do Parque Solon de Lucena e da Duque de Caxias, na própria praça), derrubando os pavilhões, que serviam a lanchonetes, jornaleiros e engraxates, e enterrando de vez a opção Paraíba Hotel.

A paisagem virou outra coisa, contando com a companhia do dessemelhante edifício Regis, já citado, da década de 1960. Depois disso, no início do Século XXI, quase tudo o que representava o tal viaduto da década de 1970 foi desmanchado, atendendo a uma proposta de convivência humana, com atenção a eventos. Agora, estamos prestes a uma nova intervenção, que, segundo soube, acrescentará mais árvores e bancos, iluminação a LED, passeio tátil, para atender a quesitos de acessibilidade, e mesas para comunhão entre as pessoas. As obras – pela descrição, positivas, do ponto de vista comunitário – atingirão também a Duque de Caxias, na parte já transformada em calçadão, num modelo urbano que deve ser adotado em toda a via, a antiga Rua Direita, desde a Praça São Francisco, na altura do histórico prédio da Academia Paraibana de Letras.

O foco é priorizar os pedestres e perseguir a ideia de revitalização do Centro Histórico de João Pessoa, projetado por estado e município, em atuação conjunta. Hoje, o que resta, no Ponto de Cem Reis, fruto de todas as intervenções anteriores, é muito dessemelhante, parte em processo de desgraça, como é o caso do edifício Duarte da Silveira. Existem ainda a antiga residência dos Ávila Lins, inteira, na esquina com a Duque de Caxias, os andares superiores de sobrados, também na Duque de Caxias, o antigo prédio do Ipase (em processo de revitalização, visando posterior ocupação para moradia e negócios), o do Paraíba Hotel (atendendo à Assembleia Legislativa), o que abrigou as Lojas Nações Unidas (que vai servir de moradia, após reformado), e algumas construções entre esse prédio (o das Nações Unidas), na parte da Visconde de Pelotas, até o antigo Cinema Plaza (do qual somente resta a parte frontal superior da sua versão mais moderna).

E, realmente, se não cuidar, não fica nada que identifique o entorno do Ponto de Cem Reis, mesmo que de tempos não tão antigos, assim. Afinal de contas, na paisagem, o que de mais original existia, efetivamente, já era, sendo rigorosamente impossível a reconstrução, a exemplo da Igreja do Rosário dos Pretos, do cinema Morse, da mansão do Barão de Maraú, dos bondes, do relógio central, dos ‘carros de praça’, dos dois pavilhões, da farmácia Régis… Ainda assim, só ali por perto, a rua Nova virou General Osório, a rua Direita passou a ser Duque de Caxias, a rua da Cadeia se chama Visconde de Pelotas, o Passeio Público passou por vários nomes, e hoje é identificada como Praça João Pessoa, o campo do Comendador Diogo se dividiu em praças Pedro Américo e Aristides Lobo, e é com essas denominações atualizadas que o povo da cidade conhece cada um desses lugares.

Menos o Ponto de Cem Reis, que permanece, ainda que sem qualquer sinal dos bondes de outrora (que bem mereciam um servir de monumento real, na praça), muito menos da moeda de então. Portanto, ao transitar pelo Ponto de Cem Réis, é preciso respeito, pois é um dos locais onde adeja leve e fagueiro o espírito da cidade!