Opinião

PARAHYBA E SUAS HISTÓRIAS: Boêmios Brasileiros - Por Sérgio Botelho

Sempre me chamaram a atenção as notícias sobre a existência na história social da cidade de João Pessoa de um certo clube de nome Boêmios Brasileiros, que muito sucesso fizera nas décadas de 1930, 1940 e 1950.

Foto: Internet

Sempre me chamaram a atenção as notícias sobre a existência na história social da cidade de João Pessoa de um certo clube de nome Boêmios Brasileiros, que muito sucesso fizera nas décadas de 1930, 1940 e 1950.

Fui pesquisar e descobri que o clube funcionou no entorno da Praça Vidal de Negreiros, sendo que até 1949, do lado da Duque de Caxias (no número 389), e a partir desse ano, do lado da Visconde de Pelotas, no andar superior do imóvel, um de elevador bem antigo e muito notado até algumas décadas atrás, que teve por vizinho, a partir de certo tempo, o prédio das Nações Unidas.

Os carnavais do Boêmios Brasileiros, segundo comprovam as notícias de jornais da época, foram mesmo cercados de um brilho bem particular. Além dos bailes a partir do chamado Sábado Gordo, inclusive matinés para as crianças, o clube mantinha um bloco nos corsos daquela época, onde o trânsito estava anos luzes mais tranquilo do que é hoje e a gasolina ainda não havia sofrido o arranque no preço do petróleo internacional ocorrido a partir de 1973.

O corso, sobre o qual já falamos em crônica anterior, se configurava em desfile de carros alegóricos e pessoas fantasiadas pelas ruas, onde grupos de amigos e famílias decoravam veículos e se juntavam à festa nas ruas, celebrando a folia com música, dança e trajes coloridos e muito povo a jogar confete, serpentina e, a partir de sua decadência, água. No referido desfile, o Boêmios era sempre uma atração aguardada, com seu estandarte à frente e carros alegóricos ricamente adornados.

Em 1952, o clube foi o grande vencedor da Primeira Noite do Passo (leia-se frevo), que incluía um desfile alegórico, evento promovido pelo governo José Américo e pelos Diários Associados de Assis Chateaubriand, com o objetivo de “prestigiar o carnaval de rua {em João Pessoa} que estava prestes a desaparecer”, conforme A União de 15 de fevereiro do referido ano, a 7 dias do sábado de Carnaval. O luxo e a beleza plástica do Boêmios garantiram o prêmio.

Outro momento de destaque do clube era o Réveillon, na noite de 31 de dezembro para a madrugada de 1 de janeiro, quando também acontecia o Primeiro Grito de Carnaval. Mas a atividade do Boêmios Brasileiros não se limitava a festejos carnavalescos e réveillons. Havia, por exemplo, iniciativa voltada à apresentação de números de danças, música e poesia aberta aos associados, sempre seguida de baile, a revelar compromisso com a cultura na capital paraibana. Mas também as festividades que homenageavam São João e São Pedro tinham destaque no clube.

Outra festa animada no Boêmios Brasileiros era a da Micareme (palavra de origem francesa, a denominar um alívio de obrigações durante a Quaresma, com origem em tradição católica, portanto, assim como o próprio Carnaval, traduzida, a Micareme, no Brasil por um carnaval fora de época, e que acabou inspirando as micaretas da vida), no Sábado de Aleluia, prosseguindo com um baile no Domingo de Páscoa. (A Micareme já foi tradicional em João Pessoa, em outros clubes, a exemplo do Astrea, que também realizavam bailes com odores de folia no Sábado de Aleluia e Domingo de Páscoa).

Já no mês de setembro, outro grande evento movimentava o Boêmios Brasileiros: a Festa da Primavera. Não foram poucas as vezes em que a Orquestra Tabajara, já brilhando no circuito nacional, tocou para os convidados ao baile, que deveriam ser frequentados em traje a passeio ou a rigor, e cujo ápice era a escolha da Rainha da Primavera. Detalhe: na abertura, sempre, a valsa Vozes da Primavera (Voices of Spring), de Johann Strauss virou tradição.

Junto com o Boêmios, nos carnavais da década de 1950, brilhavam, na primeira grandeza do carnaval pessoense o Cabo Branco e o Astrea (embora o Esquadrilha V ainda fosse representativo). Em 1952, os preços das mesas para o chamado tríduo momesco eram de Cr$ 400,00, no Cabo Branco e no Astrea, e Cr$ 250,00 no Boêmios Brasileiros. Nos clubes dos bairros elas eram vendidas ao preço de Cr$ 100,00.

Com o correr do tempo, e o crescimento do prestígio de Astrea e Cabo Branco, ambos passaram a conquistar associados de classe média (principalmente o Astrea), fortaleza social do Boêmios, como é possível observar nos preços de suas promoções, quando o clube acabou desaparecendo. Mas, sem dúvidas, o Boêmios marcou muito a vida profana e catártica pessoense em boa parte do Século XX.

(Na foto, flagrante do corso, na passagem pela Praça Vidal de Negreiros)

Fonte: Sergio Botelho
Créditos: Polêmica Paraíba