Tento ter espírito democrático.
E busco transmitir isso aos meus filhos.
Mas se tem uma coisa que eu nunca escondi e admitia ser intransigente era o futebol.
O direito do pai transferir o amor pelo clube a cria.
Mesmo isso sendo mais arroubo, memória afetiva e romantização do futebol do que qualquer outra coisa.
Fato é que quem me conhece sabe da minha relação com o Esporte Clube Vitória.
Está na minha alma, marcado na pele, lembranças, histórias, amizades.
Mas, ao contrário da aparência, nem fui o maior estimulador assim nos meus filhos.
O mais velho ainda foi ao Barradão, meu santuário, duas vezes.
Tom conferiu, exatamente na idade do Ben hoje (5 anos), duas apoteoses rubro-negras: 6×2 no Santos e 5×2 no Botafogo (guarda esse time aí, que voltarei a falar dele mais a frente).
Por influência materna alinhada a época mágica, Tom teve a sua fase corintiana.
Hoje, na verdade nem liga para futebol, mas manifesta os laços com o Vitória, por extensão paterna.
Ambos, naturalmente, tiveram camisas, acessórios desde bebês.
Mas, na prática, ao contrário do que “garganteava”, nunca os sufoquei com isso, menos ainda forcei a algo.
Denise, mãe do Ben, até comenta, constantemente, que eu nunca o estimulei ao futebol, Vitória etc.
Há verdade nesta afirmação.
De fato pouco fazia além de vesti-lo uniformizado dos pés a cabeça e eventual e raramente, comemorar gol, triunfo jogando ele para o alto (coisa rara hoje, pois o Vitória não ganha e mal faz gol).
Na verdade, com toda sua individualidade, das vezes que assistimos jogo do Vitória o Ben logo afirmava que iria torcer pelo outro time e assim conduzia em espírito de pirraça.
Ainda narrava o jogo com vantagem ao adversário:
-Por que você só torce para um time? Se o outro joga melhor, pai? Não pode mudar??
Explico aquela coisa de fidelidade, amor mesmo, identificação e bla, bla, bla
Claro, que a intenção principal dele na verdade era desconstruir aquela idéia de ver futebol.
Ele ainda não gosta. Até pela quase hiperatividade.
Mas o nível “personalidade Benjamin” assumiu níveis estratosféricos dia desses!
Lembra do Botafogo citado na goleada épica que meu filho mais velho presenciou in loco, em corpo e espírito no Barradão (desculpa a empolgação, mas é carência do tempo em que peitar qualquer um era rotina do meu ECV)?
Pois bem, estava ouvindo resenha esportiva no rádio do carro, quando era abordada uma notícia sobre o Botafogo.
Ben, que parecia distraído no banco de trás (só aparentava, porque sempre está a observar tudo, mesmo concentrado em outra coisa), logo se manifesta:
-Bo-ta-fo-go! Gostei desse nome, vou torcer para este time.
Eu e a mãe nos entreolhamos com cara de espanto.
Seguiu o fluxo e eu considerava aquilo mais uma intempestividade infantil.
No outro dia, de sobressalto Benjamin vira para o irmão e diz que torce para o BOTAFOGO.
Assim, de boca cheia.
Passa-se mais alguns dias e na TV um noticiário esportivo cobria a chegada da delegação botafoguense a algum lugar.
Benjamin, em outro canto da casa, sem sequer olhar a TV, diz:
-Botafogo, meu time.
Como disse, meu único time é o Vitória, depois do Buerarema, que tem status de seleção e é hour concour.
Mas tenho algumas poucas simpatias. Na Paraíba, não me pergunte por que, mas sou Treze.
Na verdade, especialmente o Galo da Borborema, mas torço pelo sucesso de todos os clubes locais por extensão afetiva ao estado que me acolheu.
E de fato vibro com o êxito de todos. O que não me permito na Bahia, meu estado natal, por razões óbvias, antagônicas, inconciliáveis, né?? Bahia é Bahia, Vitória é Vitória e vice-versa. Não misture as cores, faz favor…
Como diz um amigo meu, “quem tem obrigação de torcer para o Estado como um todo é o governador!”
Voltando a descoberta traidora e repentina do meu filho, percebendo que a vaca já tinha ido pro brejo e buscando minimizar prejuízos de torcer para times do eixão RJ-SP, afirmo:
-Filho, você sabia que na Paraíba tem um Botafogo?
-Sério, papai? Me leva pra ver um jogo?
Vou levar. Se é para torcer para outro time, que meu filho torça para o Belo.
Democraticamente, claro…
Fonte: Marcos Thomaz
Créditos: Polêmica Paraíba