No próximo domingo, 21, a morte do ex-presidente Tancredo de Almeida Neves completará 34 anos em meio a teorias conspiratórias, inclusive a de que ele teria sido assassinado. Uma outra versão insinua que Tancredo teria sido alvejado com um tiro durante missa que assistiu na Catedral de Brasília, às vésperas da posse e já enfermo, acometido por diverticulite aguda que derivou para septicemia generalizada. A versão fantasiosa dá conta de que o provável tiro disparado contra o político mineiro teria atingido de raspão a repórter Glória Maria, da Rede Globo, que fazia cobertura do ato religioso. Glória Maria teria sido enviada pela Globo para uma temporada no Marrocos a fim desse evitar exploração sobre o tema das supostas teorias conspiratórias.
Essas teorias foram alimentadas pela circunstância de que setores das Forças Armadas, da chamada linha dura, não aceitavam a investidura de Tancredo, que seria o primeiro civil a assumir em 21 anos de vigência da ditadura militar instaurada em 64. Tais setores espalhavam boatos de suposto golpe que poderia ser intentado contra Tancredo Neves. Na prática, o ex-governador de Minas Gerais passou 38 dias agonizando e se submeteu a sete intervenções cirúrgicas, despertando correntes de oração e sentimentos de comoção por todo o país.
A 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves, do então PMDB, derrotou Paulo Maluf, do PDS, no Colégio Eleitoral, que escolhia por via indireta, através de votos de congressistas e delegados de Assembleias estaduais, os presidentes da República. No dia 14 de março, às vésperas da posse, Tancredo sofreu fortes dores abdominais e foi internado em hospital em São Paulo, onde faleceu, sendo declarado morto no dia 21 de abril e sepultado em São João Del Rey, Minas Gerais, sua cidade natal, onde nascera a quatro de março de 1910.
Político remanescente do famoso PSD, tido como escola de líderes matreiros e habilidosos, Tancredo esteve presente em momentos decisivos da história do Brasil por mais de cinquenta anos. Foi figura de destaque já no governo de Getúlio Vargas e tornou-se primeiro-ministro na década de 60 em meio ao arremedo de Parlamentarismo que foi tentado no país como condição imposta por militares para que João Goulart assumisse a presidência da República, que estava desocupada diante da renúncia do ex-presidente Jânio Quadros.
O Parlamentarismo foi dissolvido, um referendo popular reinstituiu o presidencialismo, João Goulart governou por pouco tempo sob pressões e com dificuldades até que foi deposto pelo golpe militar e se exilou no Uruguai. Tancredo reaparece em cena em plena ditadura atuando como deputado federal, depois senador, pelo então MDB, alinhando-se com os chamados moderados do partido, mas afinado com o presidente nacional da legenda, Ulysses Guimarães.
Em 1982, Tancredo foi eleito governador de Minas Gerais, quando da restauração das diretas nos Estados. Com a sua projeção política e experiência legislativa e administrativa, credenciou-se, naturalmente, a ser o candidato do PMDB à presidência para derrotar o PDS, sucedâneo da Arena, no colégio eleitoral. Embora a eleição fosse indireta, teve apoio popular e procurou dar essa conotação à campanha desencadeada em manifestações gigantescas em várias Capitais do país. Escolheu para seu vice, numa operação de engenharia política, o senador José Sarney, que presidia o PDS mas se tornou um dissidente e formou com Tancredo a Aliança Democrática, respaldada pelo já PFL, com a atração de lideranças emergentes no cenário nacional.
Tancredo criou expectativas otimistas no seio da sociedade brasileira e ganhou manifestações de apoio de artistas, intelectuais, religiosos e líderes políticos oposicionistas adversários. A própria Rede Globo de Televisão deu cobertura aos eventos de rua protagonizados de forma memorável pelo político mineiro, em pontos estratégicos do Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e até João Pessoa, onde o candidato da oposição falou a uma multidão na Lagoa do Parque Solon de Lucena.
A morte de Tancredo Neves provocou um ambiente de desolação em todo o país, agravado pela desconfiança quanto aos rumos que seriam imprimidos por Sarney, oriundo do regime militar. Sarney surpreendeu adotando o Plano Cruzado, que congelou tarifas públicas e obteve grande aceitação popular, mas o Plano fez furos e durou pouco a lua de mel com o governo. O país voltou a experimentar uma inflação estratosférica e Sarney deixou o governo com altíssimos índices de impopularidade. Até hoje, em paralelo às teorias conspiratórias sobre as causas da morte de Tancredo, analistas políticos e historiadores constroem inúmeras teses sobre um hipotético governo do político mineiro – prognósticos absolutamente surrealistas diante da constatação da morte de Tancredo e do seu impedimento em tomar posse.
Fonte: Os Guedes
Créditos: Lenilson Guedes