Ele tinha uma linguagem própria que prescindia de letras e números. Falava com o simbolismo das cores, traços e formas, e conseguia se expressar com mais intensidade e nitidez do que se escrevesse uma crônica.
Além disso, tinha o dom de penetrar no pensamento alheio, de transmitir uma mensagem de forma bela, simples e direta. Era um artista, um mago, um mestre da criação publicitária com a qual mantinha extraordinária intimidade.
Tínhamos uma convivência profissional estreita. Nos identificávamos também pelo sentimento, pela afinidade, pela simplicidade como encarávamos a vida, os seus encantos e os seus mistérios. Como todo artista, era um homem de sentimentos fortes e profundos, que, entretanto, mantinha sob severa vigilância. A sua timidez crônica não lhe permitia extravasar o que acumulava em sua alma de menino, em seu coração adolescente.
Difícil era vê-lo alterar a voz. Falava pouco e baixo. Quando envolvido em um trabalho, postado junto a uma velha prancha de desenho ou em frente a um computador, não se permitia sequer olhar para o lado, inteiramente envolvido com o seu processo criativo, com os detalhes de um traço, de uma cor, de um detalhe que pudesse revelar o exato conteúdo que lhe ditava a sua imaginação fértil e criadora.
Fizemos muitos trabalhos juntos, desde a capa do meu primeiro livro à logomarca que assinava a maioria dos meus eventos. Muitas vezes recorri a ele para mudar o visual de minha coluna, desde os tempos de O Norte, para torná-la mais leve e atraente aos olhos dos leitores.
Como homem, tinha o caráter e a integridade de poucos. Era tão honesto em suas avaliações e tão reservado em suas pretensões que, por vezes, não sabia cobrar o justo preço do seu trabalho. Remunerava-se com a satisfação e a emoção daqueles que lhe entregavam a responsabilidade sobre as suas obras e projetos. Era um trabalhador sempre em busca do salário moral, muito mais do que a recompensa em dinheiro.
Milton Nóbrega, ou simplesmente o Mituca, para os amigos diletos, era um artista precioso e um profissional exemplar. Nesses anos todos, entre cartazes, placas, capas de livro, símbolos e logomarcas, construiu uma senha indelével para identificar a qualidade de um bom produto: a sua própria assinatura.
Quando a tecnologia começou a substituir o talento, com o desenvolvimento da informática, suas plataformas e aplicativos, com o CorelDraw e Pagemaker dispensando a criatividade do artista, Milton Nóbrega não conseguia esconder o seu desconforto. Por mais que tentasse, não se habituava àqueles comandos eletrônicos invasores, que competiam com o seu trabalho e ofendiam a sua inteligência.
E a alma? Cadê a alma desses desenhos? Costumava perguntar quando alguém lhe mostrava um projeto construído pela máquina sem a mão do homem, sem o sentimento do artista, sem a sensibilidade e o carinho do ser humano.
Costumava vê-lo caminhando pelas ruas e chegando, a pé, ao seu local de trabalho. “Prefiro assim. Tenho tempo de pensar na vida, de observar as pessoas, de refletir sob os meus problemas e de aproveitar melhor o tempo que Deus nos disponibiliza para olhar o que acontece à nossa volta”.
Milton era artista gráfico, publicitário e autor das mais belas capas de livros publicadas na Paraíba. Irmão do ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, foi diretor do jornal A União, fundador e sócio da agência Oficina de Propaganda, ao lado de Alberto Arcela e Martinho Moreira Franco. Morreu aos 69 anos, de mal súbito, em 16 de dezembro de 2015.
Fonte: Abelardo Jurema Filho
Créditos: Polêmica Paraíba