Análise

DOIS PAPAS: O embate entre o papa de uma Igreja ultrapassada e o desejado papa dos tempos modernos - Por Anderson Costa

Assisti ao filme Dois Papas, da Netflix, e agora posso dizer sem medo algum de errar que apenas desperdicei minutos de minha vida.

Assisti ao filme Dois Papas, da Netflix, e agora posso dizer sem medo algum de errar que apenas desperdicei minutos de minha vida. Dois Papas, ao meu ver, não consegue ser nem uma obra interessante ao público católico e nem para os que não confessam esta fé. Dois Papas poderia ter sido uma grande oportunidade da Netflix fazer um aceno ao público católico que ela vem perdendo ao redor do mundo, a rejeição dos católicos a Netflix e ao seu repertório vai muito além do Especial de Natal do Porta dos Fundos. Este filme poderia ter sido um grande indicativo do Netflix que pensa também neles e que produz material que os permita se entreterem com material original da Netflix. Não agradou, gerou polêmica e reforçou o discurso dos católicos que o material produzido pela Netflix é panfletário para defender algumas ideologias, as quais a Igreja Católica é contrária.

Como uma obra para não católicos o filme também não é interessante, uma vez que, apesar dos ares de documentário que o diretor brasileiro, Fernando Meirelles, adotou, o filme não traz nenhuma informação real. A proposta do filme é muito boa, a relação de disparidade entre os dois últimos sumos pontifices da Igreja Católica é tão grande que até mesmo a missão do autor não seria de grande dificuldade. O grande defeito de Meirelles foi que, em nome da mensagem que buscava passar, ele abandonou quase que totalmente a realidade para construir uma narrativa. Tenho consciência de que o filme é ficcional e por isso aceitei certas coisas como a troca de confissões e perdões concedidas pelos dois papas próximo do final do filme. O que não posso aceitar é que o filme afronte a realidade e me apresente informações claramente irreais com uma roupagem de fatos que ocorreram em um momento impreciso da história.

O filme se inicia com a morte do Papa João Paulo II e a necessidade da eleição do seu sucessor. Nas cenas em que vemos o concílio que elegeu Bento XVI como bispo da diocese de Roma, o então cardeal Ratzinger nos é apresentado como um antipático politiqueiro que apenas fala com cardeais mais tradicionais que podem lhe garantir votos. Ele teria legado ao cardeal Bergoglio uma antipatia, que fica incerto se seria por este ser um nome menos conhecido em Roma ou se por vê-lo como um adversário na eleição. A realidade que o filme não mostra é que várias vezes o cardeal alemão e futuro Papa teve sua resignação negada pelo Papa João Paulo II, que tinha nele uma figura de confiança na cúria. O que ele mais buscava era poder aposentar-se para voltar a Alemanha e aproveitar sua velhice ao lado do irmão.

O filme também nos apresenta um Ratzinger altamente apegado a costumes tidos como ultrapassados após o Concílio Vaticano II a exemplo de uma constante reclamação pelo desconhecimento em latim dos colegas. Ao passo que Bergoglio é apontado como um nome popular dentre cardeais e o povo que pediria uma reforma na Igreja tida ainda como antiquada. Aqueles que defendem o nome de Bento logo após sua eleição também são apresentados como nomes apegados ao passado, além de uma alusão de que o papa emérito seria nazista. A tese é rapidamente defendida no início do filme e passei toda a obra aguardando um momento em que se falaria sobre o seu sofrimento sob o regime de Adolf Hitler, na Alemanha. Quando nos é mostrado o sofrimento vivido pelo Papa Francisco durante a ditadura peronista acreditei que cada um falaria sobre seus sofrimentos diante das ditaduras que aterrorizaram seus países, a expectativa foi em vão.

Após uma apresentação como se o papado de Bento tivesse sido aterrorizado pela perda de fiéis, escândalos financeiros e sexuais. Todos estes fatos marcaram principalmente o fim do pontificado do alemão, mas esteve longe de ser uma constante. Em decorrência do cenário apresentado se iniciam os encontros entre Bento XVI e o até então cardeal Bergoglio. Os diálogos entre os dois homens são irreais, considerando as personalidades de ambos e as posições que os dois desempenhavam no momento. Ao fim, o filme se mostrou para mim maçante e longe da obra que eu esperava em que as diferenças de cada um seriam expostas e destrinchadas. O filme se encerra como que buscasse demonstrar uma necessidade de se desapegar das tradições em nome de um humanismo que o próprio Papa Francisco muitas vezes criticou ao longo de seu papado. O filme, na minha opinião, é uma produção que acerta tanto na técnica que o roteiro desperdiça um filme que poderia se tornar mais um dos muitos clássicos da carreira de Anthony Hopkins.

Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Polêmica Paraíba