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“CLOROQUINA SIM, VACINA NÃO” - por Rui Leitão

Por incrível que possa parecer, essa tem sido a nova recomendação dos que fazem o governo federal. Em declaração pública, replicada pela secretaria de comunicação oficial, o presidente disse que “ninguém pode obrigar ninguém a se vacinar”. Essa afirmação poderia ser considerada normal, se proclamada por um cidadão comum, ainda que um tanto fora da racionalidade. Porém, pronunciada pelo líder maior da nação, pode ter um efeito de desestímulo para que a população se sinta motivada a se vacinar buscando proteção da infecção de uma doença mortal.

Não quero nem entrar no mérito da discussão, levantando o argumento de que a vacinação obrigatória está definida por lei sancionada pelo próprio chefe da nação em abril deste ano. A contradição é que chama a atenção. Ora, como compreender que a mesma autoridade que dá validade a uma norma legal que estabelece a vacinação compulsória para conter epidemias, pode, ao mesmo tempo, minimizar a sua importância na imunização contra a covid-19? Na lei assinada por ele está textualmente definido que “”as pessoas deverão sujeitar-se ao cumprimento das medidas previstas neste artigo, e o descumprimento delas acarretará responsabilização, nos termos previstos em lei”. Ou será que ele não lê o que assina?

Uma contradição incompreensível, para não oferecer outra qualificação que atenta contra os conceitos de responsabilidade. Ora, não há dificuldade em entender que a recusa em receber a vacina pode ser considerada uma ameaça à saúde coletiva. O descrédito lançado torna-se um grave problema sanitário para o país, contrariando a grande expectativa que se tem na oferta de uma vacina que contenha o avanço da pandemia do novo coronavírus entre nós. A ele cabia, antes de qualquer outra autoridade, conscientizar a população para a necessidade da vacinação.

Enquanto desestimula a vacinação, propagandeia o uso de um medicamento que a comunidade médico-científica não reconhece sua eficácia no tratamento da doença, alertando, inclusive, para os riscos de agravamentos colaterais na saúde. Muito estranha essa obsessão do presidente pela prescrição da cloroquina. Outra contradição explícita é o fato de que o seu governo destinou cerca de R$ 2,0 bilhões para a produção e aquisição da vacina contra a Covid-19, produzida pelo laboratório AstraZeneca e a Universidade de Oxford. Para que, então, se a vacinação será feita somente em pessoas que aceitarem receber? Recursos públicos jogados fora?

O nosso sistema de imunização é reconhecido internacionalmente, reforçando a contribuição inquestionável para o aumento da qualidade de vida dos brasileiros e a redução da mortalidade. Se o presidente contesta essa importância, induz muitos à dúvida de sua serventia. O que é inadmissível quando estamos vivendo a mais grave crise sanitária de todos os tempos. Historicamente temos verificado que vacinas erradicaram doenças que estavam matando muita gente. É mais um movimento anticiência que vem caracterizando o atual governo. A não ser que ele queira voltar a orientar no sentido de que à direita a cloroquina, à esquerda a vacina. Aí eu teria satisfação em apresentar, se existisse, a minha carteirinha de esquerdista.

Fonte: Rui Leitão
Créditos: Rui Leitão