A maior obra do gênio político de Ronaldo Cunha Lima foi ter conseguido estabelecer um vínculo de difícil desassociação entre a auto-estima do povo de Campina Grande, o imenso apego do campinense pelo território de sua idolatria, e o projeto de poder da família da qual o ex-governador e ex-prefeito da Rainha da Borborema foi o patriarca.
Dois momentos podem ser considerados chave para dar início e consolidar essa estratégia discursiva:
1986, quando Ronaldo chamou ou povo de Campina Grande para “decidir” se o então prefeito deveria deixar o cargo para disputar a eleição de governador ou se deveria abrir mão para o neopeemedebista Tarcísio Burity.
1990, quando Ronaldo transformou a disputa com Wilson Braga, durante o segundo turno da eleição para o governo da Paraíba, numa disputa entre João Pessoa e Campina Grande. O resultado confirmou a correção da estratégia ronaldista: enquanto a pouco bairrista João Pessoa deu a Braga 56,59%, uma diferença de pouco mais de 23 mil votos, em Campina, Cunha Lima Ronaldo Cunha Lima obteve incríveis 82,84% e uma diferença de 84 mil votos para a Braga, que superou em muito a derrota na capital.
Em 1982, Ronaldo Cunha Lima se elegeu prefeito de Campina com uma diferença de 12 mil votos para o principal concorrente, Vital do Rêgo. Na eleição seguinte, de 1988, a diferença entre o candidato da oposição, Enivaldo Ribeiro, e o “menino de Ronaldo”, Cássio Cunha Lima, continuou nos 12 mil votos, diferenças que se estreitaram nas eleições seguintes, todas contra Enivaldo Ribeiro: a de 1992 (10 mil votos pró Félix Araújo), e em 1996 (8 mil votos pró Cássio Cunha Lima). Em 2000, Cássio se reelegeu em aliança com o PT com mais de 70 mil votos de diferença.
O único que conseguiu estabelecer um interregno nesses 40 anos de hegemonia da família Cunha Lima na Rainha da Borborema foi o então aguerrido vereador e hoje senador Veneziano Vital do Rêgo. Em 2004, o cabeludo Vené derrotou Rômulo Gouveia em duas eleições seguidas, as de 2004 e 2008, anos em Campina vivia o que parecia ser o auge da hegemonia da família Cunha Lima na cidade. Cássio Cunha Lima tinha acabado de se eleger governador com 74% dos votos de Campina. A vitória do hoje aliado Veneziano era considerada improvável.
Mas, o que tornou possível a vitória do “cabeludo”? Minha hipótese principal é que, diante do desgaste de um ciclo que já durava mais de 20 anos, Veneziano foi capaz de descaracterizar a falsa correlação entre campinismo e cunhalimismo e dividi-lo eleitoralmente. Essa divisão é arbitrária e serve apenas para facilitar a argumentação. Os “campinistas”, chamemos assim, compõem um terço do eleitorado da cidade, os Cunha Lima e a oposição dividem o restante do eleitorado, com um naco maior para os primeiros.
O apelo ao bairrismo, a um amor abstrato pela cidade, foi sempre um recurso que ajudou a família Cunha Lima a encobrir fracassos administrativos, e, mais ainda, a perda de importância relativa da cidade, sobretudo, econômica. E a julgar pelos resultados de pesquisas recentes, não só eleitorais, mas de avaliação do desempenho do atual prefeito Bruno, um Cunha Lima da gema, Campina vive uma situação semelhante a de 2004, um ciclo que ganhou sobrevida nos oito anos de Romero Rodrigues e hoje apresenta claros sinais de esgotamento com Bruno Cunha Lima.
As perguntas que emerge e a seguinte: o campinismo vai voltar à cena com força na campanha que está em vias de começar? Bruno Cunha Lima já ensaiou esse discurso contra o candidato do PSB, Johnny Bezerra. As condições estão dadas depois da desistência de Romero Rodrigues, ou seja, a família Cunha Lima está novamente unida.
Resta saber como o eleitor campinense vai se comportar em 2024. Se vai optar pelo senso crítico, ou se vai novamente e mais uma vez deixar seu campinismo ser capturado pelo cunhalimismo.
Fonte: Flávio Lúcio Vieira
Créditos: Polêmica Paraíba