Opinião

Bolsonaro: situação complicada após denúncia sobre “trama golpista” - Por Nonato Guedes

Foto: Fátima Teixeira
Foto: Fátima Teixeira

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), apesar de toda a orquestração ensaiada para figurar como “perseguido” no enredo da tentativa de golpe de Estado perpetrada na transição do seu governo para o do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não conseguiu escapar do seu indiciamento no robusto inquérito da Procuradoria Geral da República versando sobre apuração de episódios verificados em 2022, antes e depois das eleições que derrotaram o capitão. Ao todo, 34 pessoas estão relacionadas entre os denunciados pelo procurador Paulo Gonet na petição encaminhada ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, incluindo ex-ministros e colaboradores diretos de Bolsonaro, bem como oficiais das Forças Armadas que embarcaram na aventura sinistra contra o regime democrático no país.


A PGR entendeu, com base em farta documentação, que a tentativa foi realmente articulada
pelos perdedores e inconformados e que o plano foi elaborado com requintes de profissionalismo, pressupondo existência de financiadores representantes de elites econômicas, um elemento que ainda falta ser apontado com mais clareza por parte das autoridades. Para grande parte da opinião pública, não houve, a rigor, novidade ou surpresa no teor da denúncia oferecida, dado que os fatos constantes da narrativa final já vinham sendo expostos nos mínimos detalhes, a partir de informações colhidas de fontes privilegiadas e mesmo de expoentes militares que concordaram em fazer delação premiada. O papel do ex-presidente no contexto foi o de líder da conspiração frustrada.

De acordo com a PGR, Bolsonaro “planejou, atuou e teve domínio de forma direta e efetiva dos atos executórios realizados pela organização criminosa que objetivava concretizar o golpe de Estado e a abo lição do Estado democrático de direito”.
Os indícios foram colhidos ao longo de quase dois anos pela Polícia Federal, por meio de quebras de sigilo telemático, telefônico, bancário e fiscal, além de colaborações premiadas, buscas e apreensões.


O objetivo do grupo envolvido, formado em suma por militares, seria impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para recolocar Jair Bolsonaro no poder. Contudo, segundo aa corporação, havia ainda um plano para matar Lula, seu vice, Geraldo Alckmin, e prender ou executar o ministro do STF, Alexandre de Moraes. A Operação Contragolpe da Polícia Federal prendeu quatro militares ao ser expedida em 19 de novembro de 2024. As investigações levaram, ainda, à prisão do general Braga Netto, além de outros alvos da operação.

O relatório caiu como uma bomba, sobretudo em Brasília, onde houve radicalização de ânimos com discursos exaltados por parte de apoiadores do bolsonarismo,
irresignados com a comprovação de fatos deletérios que fariam voar pelos ares a democracia
brasilweira. O ex-presidente mantém o figurino de se apresentar como vítima de retaliação e é certo que o amplo direito de defesa lhe está sendo assegurado, mas é visível a inconsistência dos argumentos
preliminarmente agitados para tentar salvar a pele do capitão golpista.


A expectativa é quanto aos passos seguintes da denúncia em torno da “trama golpista”, já que
parece inevitável a decretação da prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro, que, como se sabe, já está inelegível para concorrer às eleições presidenciais de 2026, como é a sua aspiração maior e a de seus seguidores mais radicais. No íntimo, o ex-mandatário tem se preparado psicologicamente para a chamada “hora da verdade” que é o seu confronto com as provas judiciárias – e, mais do que isso, tem demonstrado uma espécie de “medo pânico” diante da hipótese de ser preso. A base da sua formação combina elementos como a impunidade e a presunção de estar acima da lei, como se o Brasil vivesse num Estado autocrático ou, como queiram, numa ditadura militar, sobre a qual Bolsonaro tanto faz apologia, com os olhos voltados para a longa noite das trevas que se abateu sobre o país entre os idosde 1964 e 1985. Aliás, no exercício da Presidência da República, a prioridade número um de Jair Bolsonaro foi se manter no poder pela força das armas – e ele recorreu a expedientes de mistificação e manipulação de consciências, partindo para uma “lavagem cerebral” entre apoiadores atraídos pela farsa da “polarização” ideológica que ainda agora busca sustentar com o PT e com a esquerda em geral.


Não há, no horizonte, atenuantes que possam livrar o ex-presidente Jair Bolsonaro de
punições severas ou rigorosas pelo seu papel destacado de líder de uma trama golpista que repercute ainda hoje, negativamente, no exterior. O presidente que desdenhou das urnas eletrônicas, que incitou à descrença no sistema eleitoral brasileiro, baseado apenas em vagas suposições, sem apegar-se a nenhum fato concreto, e que operou ativamente contra a democracia, está frente à frente com seu destino e suas responsabilidades. Para o país, o mais importante é que as leis sejam cumpridas, que haja punições para quem cometeu crimes e que a Constituição reine soberana como a Carta Magna. O desenrolar das investigações, sem dúvida, terá impacto para frear a manobra pró-anistia aos envolvidos nos atos de 8 de Janeiro. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, foi enfático ao dizer, ontem, que não há clima para uma matéria que já é praticamente vencida.