O capitão-presidente Jair Bolsonaro manda no governo? A impressão dominante na mídia e na sociedade é que não. Já circula no entorno do poder em Brasília um neologismo apropriado para esses tempos bolsonarianos: “filhocracia”. É a influência além da conta e de todas as medidas de filhos do presidente que usam e abusam do nome do pai para transmitir recados, xingar aliados, esculhambar o poder na sua pompa e circunstância. O presidente faz que enquadra os filhos e a opinião pública finge que acredita. Os rebentos do capitão-presidente são tratados pela mídia independente como “pit-buls”, aqueles cachorros com cara de mal que assustam à distância, quanto mais de perto. A função deles parece ser exatamente a de afastar certas influências na órbita do círculo de ferro do pai e, ao mesmo tempo, instituir a “redoma” para colocar Bolsonaro a salvo de idiossincrasias.
Além da “filhocracia”, o governo de Bolsonaro destaca-se por outra particularidade: a eclosão de bizarrices. A campeã nesse terreno é a ministra Damares Alves, uma espécie de Dilma Rousseff da direita, cultora de pérolas desconexas e proprietária de raciocínios tortuosos que, espremidos, não levam a lugar nenhum. Depois da divisão entre meninos que vestem azul e meninas que vestem rosa, a última ‘boutade’ da ministra Damares, que ainda por cima é pastora, foi a encrenca com uma suposta filha adotiva que teria sido arrancada de aldeia indígena para ficar sob a proteção da pastorinha. E o ínclito ministro da Educação, o colombiano Ricardo Vélez, mentor de conceitos absurdos sobre a questão cultural e a questão educacional no Brasil? Que tal digerir as trapalhadas do ministro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, uma espécie de Geddel Vieira da Era Bolsonaro?
Há, também, o conspirador-mor, o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, que não esconde de ninguém a ambição de ser o contraponto a Bolsonaro, uma espécie de diferencial para se credenciar ao respaldo popular e adquirir influência – quem sabe, legitimar-se para chegar à própria Presidência, onde se sente mais confortável do que o Presidente? Não se passa um dia sem que Mourão frequente as manchetes, sempre discordando do “chefe”. Bolsonaro é a favor do sexo dos anjos? Mourão é contra. Bolsonaro trata mal a imprensa? Mourão é o “queridinho” de jornalistas. Pela primeira vez na história do Brasil, um vice conspira ostensivamente, à luz do dia, nas barbas do titular. Tancredo Neves costumava dizer que as conspirações nascem nos gabinetes dos vices, até em virtude da ociosidade deles em palácios imensos ou gabinetes privilegiados em Brasília. Mourão quer ser a solução. Será?
A opinião pública brasileira não tem paciência para conviver com um governo que produz um desmentido por dia, que registra entrechoques de ministros, que se alimenta da intriga e da divergência do vice-presidente com o presidente da República e que é dominado pelos filhos do presidente, ora porque são da sua mais absoluta confiança, ora porque são indispensáveis ao pai no manejo das redes sociais, muitas vezes fazendo o papel de “robôs” do governo, com a permissão do titular. É um terremoto a cada dia, uma variedade de oscilações em decisões importantes, uma mescla de anúncios e negativas. Ufa! Não é qualquer coronária que suporte esse ritmo imprimido ao Executivo federal.
Está faltando a Bolsonaro autoridade para se impor dentro da órbita palaciana e para ditar as diretrizes que ele espera ver seguidas pelos que o acompanham na jornada dentro do governo. A reforma da Previdência é um exemplo de como proliferam dentro da gestão Bolsonaro ilhas de conflitos de interesses, cada qual puxando brasa para sua sardinha. Ninguém governa sem o mínimo de unidade ou de afinidade de pontos de vista. Urge que o comando seja assumido por quem tem a obrigação de assumir. Urge a cessação de hostilidades, fogueiras de vaidade, intrigas de corredores, divergências que comprometem o governo nos seus pontos cardeais. Em última análise, não é nenhuma ofensa dizer que tudo decorre do despreparo de Bolsonaro para ser presidente da República. Caía-lhe bem, talvez, ou, com certeza, o comando de uma guarnição militar, de uma unidade qualquer da caserna. Na Presidência da República, Bolsonaro é um estranho no ninho, com a agravante de não mandar. Nem ter nas mãos o poder pleno que as urnas lhe conferiram. Não será surpresa, infelizmente, se esse governo desandar até o fim. Será um desastre parra o Brasil, evidentemente!
Fonte: Os Guedes
Créditos: Nonato Guedes