Acredito que as gírias passaram a se tornar uma expressão própria dos jovens a partir dos anos 60. O espírito de mudança que tomava conta do mundo estimulava a criação de uma linguagem juvenil que diferenciasse do vocabulário formal, encontrado nos dicionários. Era a necessidade também de estabelecer uma comunicação em grupo que identificasse os novos costumes e formas de pensar, muitas vezes produzidas com toques de humor e irreverência. Talvez seja até uma maneira de dificultar a compreensão da comunicação de quem não faz parte do grupo, garantindo segredos e preservando privacidade.
Algumas dessas gírias caíram em desuso, mas outras continuam sendo pronunciadas até hoje. Ganharam espaço nos dicionários, porque deixaram de ser palavras da “moda”, ultrapassaram as gerações que as criou. A gíria é uma forma diferente de dizer alguma coisa. Através dela as pessoas mostram identidade com o grupo a que pertencem.
No meu tempo de adolescência, ficávamos felizes quando alguma garota nos achava “um pão”, era o jeito moderno de dizer que um rapaz era bonito, atraente. Para nós, a menina que chamava a atenção pela beleza estética era um “brotinho” e se tornava mais encantadora se tivesse “um papo firme”, soubesse falar com desembaraço e inteligência. E, se tivesse um corpo bonito, sensual, era classificada como “boazuda”. Quando isso acontecia, estava dado o primeiro passo para ficar “gamado”, apaixonado, seduzido. Era importante não se mostrar um “cara quadrado”, conservador, avesso às novidades, “cafona”. Precisávamos demonstrar ser “pra frente”, atual, adequado aos novos tempos.
“É uma brasa, mora”, assim queríamos dizer que algo estava ótimo, com a energia acesa, quente de entusiasmo. “Pode vir quente que eu estou fervendo”, nesta frase declarávamos que estávamos prontos para o que desse e viesse, sem medo de enfrentar dificuldades, preparados para qualquer coisa. E todo mundo queria “abafar”, ser alguém que, ao chegar em determinado local, fosse notado, fizesse sucesso. Era preciso estar sempre “ligado” em tudo, atento, com a capacidade de “sacar”, compreender, o que acontecia ao seu redor, “entrar na onda” adaptar-se ao modismo, “ficar por dentro”.
As “paqueras” tinham mais romantismo do que hoje. Iniciavam com um “flerte”, a troca de olhares a distância, comunicando interesse no namoro. As intimidades de casal demoravam algum tempo para acontecer. Não ser correspondido nas propostas de namoro era “levar um fora”. Se a decepção fosse grande, era comum alguém cair na “fossa”, entrar em depressão, ficar visivelmente triste.
Os grupos de convivência eram chamados de “patotas”. Entre eles, se tratavam como “meu chapa”. Ganhava destaque quem possuía um “carango”, um carro, mesmo que fosse um “calhambeque”, um veículo velho. No entanto, se alguém da turma enfrentava uma “barra”, situação difícil, recebia a solidariedade dos demais.
O tempo passa, o tempo voa, e com ele ficam as marcas que caracterizam cada época. A linguagem vai ganhando a cada geração novos jargões, novas gírias. De vez em quando, nos vemos usando termos que eram próprios da nossa juventude e deixamos nossos filhos e netos sem entenderem o que estamos querendo dizer, da mesma forma que encontramos dificuldade em compreender muitas das palavras que eles usam na atualidade. São palavras ou frases que fogem do convencional, usadas por grupos ou classes, conforme as épocas, as regiões ou classes sociais. As gírias produzem o constante movimento de nosso idioma, se adaptando à cultura e ao contexto histórico no qual a sociedade está inserida. Elas fazem parte de um dialeto que inclui sotaque, ritmo e palavras.
Fonte: Assessoria
Créditos: Polêmica Paraíba