A Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos foi construída, em tempos finais do século XVII, no termo da Rua da Baixa, bem perto da vetusta, já à época, Igreja da Misericórdia. A rua da Baixa vinha a ser o trecho da Rua Direita (atual Duque de Caxias) entre a Misericórdia e o atual Ponto de Cem Reis (daí até a atual Praça João Pessoa, já teve o nome de Rua de São Gonçalo ou Rua do Colégio, por conta da capela de São Gonçalo e do colégio dos Jesuítas, no final da via).
Lembrando que a Direita e a Nova eram, até então, as duas ruas mais importantes da cidade, ambas abertas desde construções religiosas pioneiras. O templo dedicado a essa invocação de Maria era gerido pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos que agrupava homens e mulheres pretos e pardos. Mas também brancos, embora sem direito a voto, que se dispusessem a seguir os princípios norteadores da organização católica. Em 1923, no boom da expansão da cidade de Parahyba do Norte, a igreja do Rosário dos Pretos foi demolida, garantindo, de acordo com o projeto defendido pelas autoridades, a consolidação e consequente inauguração da Praça Vidal de Negreiros, o famoso Ponto de Cem Reis.
Na época, o referido espaço público já centralizava as linhas de bondes que serviam à capital paraibana. Algum tempo depois da demolição, conforme promessa pública, teve início a edificação da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em Jaguaribe, sob a responsabilidade do clero secular representado, no caso, pelos franciscanos, e que somente ficaria pronta no final da década de 1930. O que findou se constituindo numa outra saga.
Para a demolição, a Irmandade não foi levada em conta, apesar de legalmente, perante a Igreja Católica, ser responsável pela gestão do templo “do Rozario, pesada construção barroca do século XVII”, conforme resumia, indiferente ao valor da obra e de sua importância social, artigo publicado por A União em 14 de outubro de 1924, reproduzido por Marcondes Silva Meneses em sua dissertação de Mestrado no curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPB intitulada “O Processo de Demolição e Desmonte das Irmandades Religiosas na Cidade da Parahyba (1923-1935)”.
O referido artigo prosseguia dizendo que “desapareceu, assim, aquela página de granito que testificava o fervor religioso e o senso estético dos nossos antepassados” algo não apenas irrelevante, como certamente desprezível, ao que parece, para o autor do artigo em A União, diante do reconhecimento de que “o progresso não se faz sem arrasamentos” (conforme o português de hoje). Não se sabe quem apitou isso no ouvido do articulista, embora não seja difícil de imaginar! Mas foi assim que ele justificou a demolição da Igreja do Rosário dos Pretos, em João Pessoa.
Por curiosidade, procurei fotos da época e percebi que o templo demolido em nada, absolutamente nada, interferia na construção da Praça Vidal de Negreiros, uma vez que o prédio católico ficava alinhado à calçada (que continuou sendo a mesma da nova praça) dos prédios já existentes desde o então Beco da Misericórdia. Não teve jeito, e o templo restou totalmente apagado da memória física do que até a sua derrubada havia sido um movimentado local de crença e de vivências da comunidade afrodescendente da Parahyba do Norte.
Fonte: ´Sérgio Botelho
Créditos: Polêmica Paraíba