Opinião

A febre da neutralidade contagiou maioria dos ex-candidatos na Capital - por Nonato Guedes

Faltando uma semana para a realização do segundo turno da eleição a prefeito de João Pessoa constata-se que a maioria dos ex-candidatos aderiu em peso à neutralidade na rodada decisiva, evitando declarar apoio aos dois candidatos que ficaram para a finalíssima:

Faltando uma semana para a realização do segundo turno da eleição a prefeito de João Pessoa constata-se que a maioria dos ex-candidatos aderiu em peso à neutralidade na rodada decisiva, evitando declarar apoio aos dois candidatos que ficaram para a finalíssima: Cícero Lucena, do PP, e Nilvan Ferreira, do MDB. Do tucano Ruy Carneiro ao socialista Ricardo Coutinho, foram muitos os que disseram “não” a Cícero ou a Nilvan. Com isso, embora tenham representado parcelas do eleitorado no primeiro turno, acabaram transferindo diretamente para o eleitorado o poder de decidir quem deve reger seu destino a partir de primeiro de janeiro de 2021. Apenas João Almeida (Solidariedade) e Carlos Monteiro (Rede) tomaram partido – pelo ex-prefeito Cícero Lucena.

Houve casos de candidatos que tomaram um rumo enquanto seus respectivos partidos tomaram outro, através das cúpulas. Se Ruy Carneiro ficou neutro, a direção tucana saiu de cima do muro e declarou apoio a Nilvan Ferreira. O deputado federal Pedro Cunha Lima, filho do ex-governador Cássio, fez-se representar pelo deputado estadual Tovar Correia Lima no evento em que o prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues, do PSD, também hipotecou adesão a Nilvan. Fechando o grupo de adesistas ao candidato do MDB, Renato Gadelha, do PSC, identificou em Nilvan qualidades para gerenciar os desafios da Capital paraibana. DEM, Rede, Solidariedade e PSL ficaram com Cícero Lucena, ressaltando sua experiência administrativa à frente da edilidade pessoense. O prefeito Luciano Cartaxo (PV) e sua candidata Edilma Freire justificaram a neutralidade alegando que nenhum dos dois candidatos finalistas representa os ideais do Partido Verde. Isto não impediu que os dois candidatos manifestassem desejo de incorporar propostas que Edilma defendeu no primeiro turno e que são consideradas palatáveis.

Discrepando da orientação tomada pela cúpula do DEM, presidida pelo ex-senador Efraim Morais, o ex-candidato Raoni Mendes anunciou o propósito de criar um “Observatório” para acompanhar e fiscalizar as ações que forem empreendidas pelo prefeito a ser eleito no dia 29 no segundo turno em João Pessoa. Na mesma linha, o tucano Ruy Carneiro, que ficou em terceiro lugar e, por um triz, não tomou o lugar de Nilvan na finalíssima com Cícero, apregoou que pretende criar um Instituto para formular propostas que permitam o desenvolvimento da Capital e que não deixará de destinar recursos de emendas parlamentares para obras e investimentos em João Pessoa. Soou como uma tática para se compensar de eventual desgaste pela neutralidade e, ao mesmo tempo, manter acesa a chama junto ao eleitorado que poderá voltar a cortejar em nova disputa à prefeitura. O futuro, como se sabe, a Deus pertence.

O candidato Anísio Maia, do Partido dos Trabalhadores, que ficou em nono lugar no primeiro turno, preferiu não alimentar brigas com setores de cúpula – ele que enfrentou um moedor de carne da direção nacional do PT no primeiro turno quando insistiu até o fim na candidatura própria, enquanto a presidente Gleisi Hoffmann e o ex-presidente Lula da Silva tenham externado preferências pelo ex-governador Ricardo Coutinho (PSB). Assim, Anísio acompanhou a nota do diretório estadual petista dizendo que é contra a candidatura de Nilvan Ferreira mas também não apoia a de Cícero Lucena. Houve muito bafafá em torno da posição do diretório estadual petista decorrente do vazamento, à imprensa, de orquestração para a manifestação de “apoio crítico” a Cícero Lucena e rejeição absoluta a Nilvan, identificado como o expoente máximo do bolsonarismo em João Pessoa. A cúpula petista teve que usar de muito jogo de cintura para colocar os pontos nos is e desfazer mal-entendidos. Pelo sim, pelo não, ficou valendo a neutralidade tanto em relação a Nilvan como em relação a Cícero Lucena.

Tomar posição no segundo turno nunca foi uma missão fácil para ex-candidatos que não chegaram lá, quer seja em pleitos municipais, para prefeitos, quer em disputas estaduais, aos governos, ou, em nível federal, a presidente da República. A crônica política registra “saias justas” experimentadas por líderes de renome como o próprio Lula quando teve de se posicionar no plano nacional. Pode-se dizer que Lula aprimorou o árduo ofício de engolir sapos, da mesma forma como ele foi chamado de “sapo barbudo” pelo ex-governador Leonel Brizola (PDT) quando teve que engoli-lo em um dos prélios pelo Palácio do Planalto. A rigor, quem está forado jogo não é obrigado a revelar torcida por quem continua jogando. O problema é que a neutralidade é faca de dois gumes, pois o eleitorado não tem a facilidade de ser liberado para ficar isento numa rodada decisiva.

Seja como for, vale registrar que a febre de neutralidade que contagiou ex-candidatos à prefeitura de João Pessoa constitui fenômeno na política paraibana e, especialmente, no cenário da Capital. Nunca tantos se omitiram a um só tempo pretextando os mais diferentes motivos – ou, às vezes, sem motivo algum, induzidos “por dá cá aquela palha”. Há algo de didático nessa epidemia que desembarcou junto com o coronavírus: políticos e candidatos não são donos dos votos dos eleitores. O cabresto acabou há muito tempo e o cidadão comum é cada vez mais senhor das próprias decisões e convicções. É ele quem vai decidir a sorte dos dois que ficaram para a travessia final das urnas em 2020 em João Pessoa.

Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Polêmica Paraíba