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A crise de liderança do clã Cunha Lima - Por Júnior Gurgel

Ontem (07), o calendário marcou dez anos da partida para a eternidade de um dos maiores ícones da história política de Campina Grande do século XX, o poeta Ronaldo Cunha Lima. Deixou um espólio de memoráveis e notórias conquistas – desde o seu primeiro mandato para vereador em 1959. Duas vezes seguidas, deputado estadual (1962/1966) culminando na sua eleição para prefeito de Campina Grande (1968).

A crônica política da época registrava suas vitórias sempre como “surpresa”. Mas, ao vencer Seu Cabral e suplantar seu companheiro de sublegenda – saudoso tribuno Vital do Rêgo – o poeta começou a ganhar respeito e paradoxalmente colecionar inimigos poderosos. Muitos não entenderam que o período era de mudanças.

Uma nova geração estava chegando para substituir a juventude dos anos 30/40, surgidas na era Vargas, consolidada na redemocratização instituída após 1945. O mundo era outro e totalmente irreconhecível. Auge da guerra fria, debate radical com ativismo insano das ideologias; guerrilhas em toda América Latina; maior revolução dos costumes do milênio, a partir da liberdade sexual – independência feminina – movimentos musicais; aparecimento de uma nova arte; literatura; teatro; expansão do cinema; dominação do rádio, e a invasão dos lares pela televisão.

A carreira política do poeta foi interrompida pelo AI-5. Fazendo uma analogia ao caos vivido no Rio de Janeiro – luta entre Polícia, Milícias e Traficantes – Ronaldo foi vítima de uma bala perdida. Não era de esquerda, nunca foi comunista, nem apoiava a “resistência armada” da guerrilha. Teve seu mandato cassado e seus direitos políticos suspensos por dez longos anos.

Com o fim do AI-5 (1979) pouquíssimos de sua geração voltaram à vida pública. Foram esquecidos pelas grandes mudanças ocorridas em uma década. O país havia mudado, e não apenas virado uma página de sua história, encerrou-se um capítulo. Em 1982, impelido pela mesma força desafiadora que o levou de vereador a prefeito em apenas nove anos (anos sessenta), Ronaldo fez a maior aposta de sua vida: disputou uma eleição com “voto vinculado”, enfrentando o governo federal, estadual e o candidato de um dos maiores prefeitos da história de Campina Grande (século XX), Enivaldo Ribeiro. Sua vitória foi mais “surpreendente” que a de 1968.

Obstinado, a partir de 1982 se elegeu governador, emplacou seu sucessor e chegou a Senador da República. Sempre “surpreendendo”. Começou a preparar seu sucessor, elegendo o filho Cássio – imberbe de vinte e um anos – deputado federal Constituinte (1986). Depois (1988) prefeito de Campina Grande. Em seguida, governador do estado (reeleito). Passou pelas agruras de uma cassação como seu pai, mas chegou também ao Senado Federal. A esta altura, a fadiga de guerra já tinha atingido o poeta. Chegou o tempo das mudanças e renovações, dinâmica natural da hiperatividade do povo. Mudam, para melhor ou pior, cansados de “continuísmo”.

O poeta havia descido do Senado para a Câmara dos Deputados, convicto que Cássio daria continuidade à causa. Mesmo sem condições físicas para enfrentar grandes combates, esteve sempre na retaguarda: temido, respeitado e amado pelo grande exército que formou. Curiosamente, desde sua partida Cássio Cunha Lima perdeu duas eleições seguidas, fatos ironicamente interpretados como “surpresas”.

Não preparou seu sucessor, desertou de Campina Grande, e o que resta do grande Exército Ronaldista/Cassista hoje carece de uma voz de comando. Na véspera das eleições de 2022, Pedro Cunha Lima não consegue formar uma chapa. Romero Rodrigues, disciplinado, ainda aguarda decisões de Cássio. Bruno Cunha Lima, que tinha estrutura para assumir o comando do Clã, diverge, ao invés de se impor. Eleições 2022, pode representar o fim do Ronaldismo/Cassista, ou o recomeço, com outros personagens.

Fonte: Júnior Gurgel
Créditos: Júnior Gurgel