Em março de 2015, Débora Saraiva, então namorada de Jairo de Souza, o Dr. Jairinho, passeava no BarraShopping, Zona Oeste do Rio, na companhia do filho de 3 anos, quando recebeu uma ligação. Jairo pedira para levar a criança a uma festa, sozinho. A mãe consentiu. Quinze minutos após deixar o menino nas mãos de Jairo, no estacionamento, ela recebeu outro telefonema: a criança havia fraturado o fêmur.
Levado ao hospital, o menino passou a usar, por dois meses, um gesso que começava no abdômen, descia por toda a perna fraturada, pegava metade da outra, sendo ambas unidas por outro gesso, com abertura somente para a criança defecar e urinar. A foto do menino imobilizado consta no relatório final do inquérito da Delegacia de Criança e Adolescente Vítima (Dcav), concluído ontem, ao qual O DIA teve acesso com exclusividade.
No documento, o delegado Adriano França representou por mais uma prisão preventiva de Jairo por tortura majorada. Além disso, indiciou Débora por tortura imprópria, ou seja, por ter se omitido e não ter protegido o filho.
Ambos também foram indiciados por falsidade ideológica já que, no hospital, informaram, em documento público, que o menino tinha sofrido um acidente automobilístico.
Jairo já se encontra preso acusado de tortura e homicídio contra Henry Borel, 4, que morreu no dia 8 de março, em um apartamento no Recreio dos Bandeirantes, em que o vereador morava com Monique Medeiros, mãe de Henry; também presa pelo mesmo crime.
Com o indiciamento de ontem, esse é o terceiro caso em que Jairinho é apontado por torturar uma criança. Além de Henry, cuja morte foi investigada pela 16ªDP (Barra da Tijuca), a Justiça já aceitou a denúncia de tortura ocorrida contra uma menina, entre os anos de 2011 e 2012, também filha de outra ex-namorado do vereador, fruto de outra investigação da Dcav. Na época do início das agressões, a vítima tinha quatro anos. Em seu depoimento, ela disse que foi torturada em um possível motel.
Documentos de hospital provam agressão, diz polícia
A tortura contra o filho de Débora passou a ser apurada após a morte de Henry Borel, quando a polícia, no decorrer da investigação, chamou ex-namoradas do vereador para depor. Inicialmente, Débora não relatou as agressões. O caso foi para a Dcav, que recuperou documentos de seis anos atrás, do dia do socorro à criança na unidade hospitalar.
Um deles é o próprio boletim de atendimento do Hospital Municipal Lourenço Jorge, para onde o menino foi socorrido. Nele, o médico narra não somente a fratura, mas aponta que a criança tinha hematomas nas bochechas e assaduras nos glúteos, o que indicaria uma agressão.
“As informações colhidas nos serviços médicos e de psicologia do Hospital Municipal Lourenço Jorge indicam que Jairinho submeteu (…), neste episódio, a momentos de intenso sofrimento físico e psicológico”, diz trecho do relatório.
Apesar disso, Débora corroborou a versão de Jairo, de que a criança havia pisado em falso ao descer do carro. Em um outro documento, feito no mesmo dia do atendimento, relata que a criança, antes de se machucar, vomitou no carro. E, uma psicóloga registrou o pavor dele ao relembrar do veículo, aos prantos.
Já Débora disse em seu depoimento que seu filho não chorava, o que foi analisado pela polícia como uma contradição e possível omissão dos fatos.
“Não é plausível o relato de que ele (filho de Débora) teria se machucado ao descer sozinho do veículo. Isto porque, à época, (…) tinha aproximadamente 3 anos de idade e, no momento dos fatos, estava sob a guarda e cuidados de Jairinho, no banco de trás do veículo, e este deveria tê-lo retirado do automóvel em segurança”, destacou o delegado, no relatório.
E, acrescentou: “De se observar ainda que, exatamente para prevenir acidentes envolvendo crianças que são transportadas em automóveis, a legislação pátria exige que eles sejam transportados em cadeirinhas especiais, presos por cintos especiais de segurança, dos quais não conseguem se desvencilhar sozinhos”.
Tortura com saco plástico e pisões
Em depoimento prestado na Dcav, com policiais treinados para escutar crianças vítimas, foi constatado que o filho de Débora sofreu mais de uma tortura por parte de Dr. Jairinho.
Em um dos casos, Jairinho teria dado remédio para Débora dormir, ocasião em que teria colocado um papel e um pano dentro da boca da criança, pisado em sua barriga com os dois pés, além de colocá-lo no carro, com um saco na cabeça e rodar as ruas, de madrugada. Antes de sair do apartamento, o menino chegou a pedir socorro para a mãe, que parecia estar desmaiada.
As agressões são semelhantes aos relatos feito pela filha de uma outra ex-namorada, que também apontou tortura com sacos plásticos e pisões, em uma piscina.
As informações do menino foram corroboradas pela sua irmã, que relatou aos policiais o pedido de Jairo de ficar sozinho com o menino na sala, naquela noite.
Na manhã seguinte, Débora parecia estar tão dopada, que foi necessário ser vestida pela filha. A avó da criança foi na residência, ainda pela manhã, e tirou uma foto de Débora no sofá: ela parecida estar drogada. Essa foto também consta no inquérito. Débora contou que notou pó branco em seu copo.
Delegado diz que Jairo é sádico: ‘prazer em provocar dor’
No relatório concluído ontem, o delegado Adriano França afirma que Jairo Souza tem personalidade sádica. “A explicação por tamanha compulsão somente a psiquiatria forense poderia supostamente desvendar, mas o sadismo nas práticas fica latente, não podendo ser caso de inimputabilidade penal, pois o sadismo não é considerado uma doença, mas sim, um transtorno de personalidade que denota do ato de sentir prazer provocando dor em outrem”, escreveu.
Para o investigador, Jairo escolhia intencionalmente mulheres solteiras, mães de crianças pequenas. “A motivação no sentido de a criança atrapalhar o relacionamento com a mãe não faz sentido se levarmos em conta que o investigado poderia ter a mulher que quisesse e escolher as que não tivessem filhos, pelo contrário, a escolha era justamente as que possuíam filhos na mesma faixa etária entre 3 a 5 anos de idade”, diz outro trecho.
Além disso, em seu depoimento, Débora Saraiva relata pelo menos quatro agressões que sofreu de Jairo de Souza. Ela contou que o relacionamento entre os dois teve início em novembro de 2014, um mês após começar a trabalhar na Câmara dos Vereadores do Rio. Logo, Jairo alugou um apartamento para passar alguns dias com ela a sós e os filhos dela, na época com pouca idade. Foi nesse apartamento que o filho teria sido agredido, após ela ser dopada.
Em um dos relatos, Débora contou que Jairo chegou a dar um chute em seu pé, que fez ela quebrar um dos seus dedos. Em outra agressão, chegou a arrastá-la com um mata-leão; em outra vez, a esganou tanto que ela pensou que poderia morrer.
Em uma das últimas agressões, Débora contou que Jairo deu um soco no seu rosto dentro do carro em que estavam e o veículo chegou a ser parado por uma viatura. O policial insistiu em perguntar se ela estava bem, mas, com medo, ela não quis denunciar. As supostas agressões feitas por Jairo à Débora ainda estão sendo investigadas.
A reportagem não conseguiu contato com os citados.
Fonte: Meia Hora
Créditos: Polêmica Paraíba