NEGOU ACUSAÇÕES

Fiéis acusam bispo da Universal de assédio sexual em igrejas: "Um monstro"

A Polícia Civil de Brasília recebeu na última quinta-feira (23) uma notícia-crime em que uma testemunha narra crimes sexuais supostamente cometidos pelo bispo Wagner Negrão, da Igreja Universal do Reino de Deus.

A Polícia Civil de Brasília recebeu na última quinta-feira (23) uma notícia-crime em que uma testemunha narra crimes sexuais supostamente cometidos pelo bispo Wagner Negrão, da Igreja Universal do Reino de Deus. Uma outra testemunha narrou os mesmos fatos em uma representação registrada no Ministério Público do Distrito Federal na terça-feira (28).

As duas testemunhas são homens, fiéis da igreja, que preferem não se identificar. Um deles, localizado pelo UOL, disse que ouviu o relato de mulheres com quem convivia na Universal e, sensibilizado com as histórias, resolveu procurar as autoridades e pediu ajuda para a advogada Valéria Paes Landim, que atua na defesa dos direitos das mulheres. O texto protocolado na Polícia Civil e no Ministério Público é o mesmo e foi escrito por ela.

Procurada pela reportagem por meio da assessoria de imprensa, a Universal afirmou que, a partir da denúncia trazida, “está levantando as informações para apurar, com rigor, a verdade dos fatos”. A igreja, no entanto, afirmou que “não tem conhecimento, ou foi notificada da existência de qualquer acusação, procedimento ou investigação contra o bispo Wagner”.

Wagner Negrão é membro da Universal há 35 anos. Ele realiza cultos nas segundas, quartas, sextas e domingos no templo da Asa Sul, em Brasília. Eventualmente, também fez pregações em Taguatinga, região administrativa localizada a cerca de 25 quilômetros da capital federal. Segundo um dos fiéis ouvidos pelo , os supostos crimes ocorreram nas duas igrejas. Outras duas fiéis confirmaram a informação.

“[O bispo] assedia sexualmente as mulheres, filhas de pastores membros, inclusive, simulando reservadamente orar pelas fiéis, quando estão sozinhas, desenvolvendo suas atividades na igreja, o mesmo começa o processo de assédio, orando com a mão na cabeça, desce a mão para os ombros, dos ombros para os seios e barriga”, diz o texto da notícia-crime.

“Uma dessas irmãs relatou, e outras pessoas da igreja também têm conhecimento, que quando a mão do bispo Negrão chegou na barriga dela, e ela estava de olhos fechados por ordem dele por causa da oração, ele já estava de joelhos com a cabeça perto das suas pernas. Ela relatou que abriu os olhos e saiu correndo da sala que eles estavam. O caso aconteceu em 2019”, conclui o relato.

O UOL chegou ao caso a partir do relato da advogada. Em seguida, a reportagem conversou com o fiel que registrou a ocorrência na polícia. Ele fez o relato com base no que ouviu de duas mulheres que frequentavam a igreja. No texto, ele não informou quantas mulheres teriam passado pela mesma situação. O fiel convenceu as colegas a concederem entrevista ao UOL.

Na terça-feira (28), a reportagem conversou em um café de Brasília com as duas fiéis da Universal que afirmam ter sido abusadas pelo bispo. A narrativa é semelhante à registrada na Polícia Civil e no Ministério Público pelos dois fiéis. No entanto, nenhuma das duas mulheres quis prestar queixa, por medo de eventual perseguição posterior do líder religioso.

Com a fala cortada pelo choro e as mãos trêmulas, a primeira vítima que conversou com o UOL disse que, por diversas vezes, o bispo pedia para ela ir sozinha à sala dele. Segundo ela, outras mulheres também eram chamadas.

“Eu encontrei o abuso, eu encontrei um monstro: o bispo Wagner Negrão. Ele, para vir orar na gente, para dar a benção, colocava a gente numa sala, começava a orar na cabeça da gente, começava a descer a mão, passar no meu peito, falava palavrões, falava que era unção.” A fiel afirmou que ouvia do bispo que o procedimento era uma ordem do Espírito Santo.

Ela afirma que os abusos se repetiram por cerca de dois anos e que o bispo a fazia acreditar que estava louca. “Eu achava que era coisa da minha cabeça, porque ele era muito abençoado, ele era um pai para mim, era um homem muito ungido de Deus e, de repente, ele faz essas coisas”, contou. A fiel diz que está em tratamento com um psiquiatra, e que passou a tomar antidepressivos e outras medicações para superar o trauma.

A outra mulher ouvida pelo UOL narrou sua experiência com lágrimas nos olhos. As duas ficaram amigas porque uma percebeu que a outra não estava bem e puxou conversa. Fora da igreja, as duas perceberam que tinham sido submetidas a procedimentos muito parecidos.

“Ele me apertou contra o corpo dele, me acariciou no meu seio, nas minhas costas, desceu um pouco na minha calça, na minha bunda. Na hora de sair, ele me pediu um abraço e encostou as partes dele em mim. Foi quando eu percebi que aquilo estava errado”, disse sobre um dos abusos que diz que ter sofrido no templo.

A fiel disse que os abusos duraram também cerca de dois anos e que ela tinha dificuldade para se desvencilhar da situação. “Eu só queria me afastar. Só que eu tinha um propósito e eu sabia que a igreja me fazia bem. A partir do momento que eu ia e ele estava, eu ficava aflita e eu via a aflição das outras mulheres, mas acreditava que aquilo era loucura da minha cabeça, porque ele era um deus dentro da igreja. Para mim, eu que estava louca, ele só queria o meu bem, jamais ele ia querer fazer alguma coisa ruim para mim. Então eu me culpei por diversas vezes, a culpa era minha”, afirmou.

A mulher disse que sofreu abuso por parte do bispo incontáveis vezes. “Não tinha como negar, ele chamava na frente das pessoas, como que eu ia negar o bispo da igreja? As pessoas iam achar que eu ainda era do mundo, que eu era desviada. E eu ia e ele fazia tudo de novo, tudo outra vez, e foi assim por várias e várias vezes”, disse. Ela também diz que está em tratamento psiquiátrico para tentar lidar com o trauma.

Resposta da Universal
A reportagem pediu expressamente para falar com o bispo Wagner Negrão por meio da Universal, que respondeu apenas com uma nota.

Segundo a assessoria de imprensa da igreja, “bispos e pastores, por orientação da Igreja, obrigatoriamente, são acompanhados por suas esposas, ou por outros oficiais, para realizarem os atendimentos”.

Na nota enviada à reportagem, a igreja afirma que, “sem conhecer os nomes das acusadoras e as datas exatas dos supostos episódios, o oficial da Universal sequer tem como se defender para comprovar sua inocência. Se, de início, não é possível colocar em dúvida os depoimentos que o UOL colheu das supostas vítimas, da mesma forma não é razoável que uma acusação tão grave seja publicada sem que o acusado saiba quem o incriminou”.

Os documentos com as acusações são públicos e o UOL, a pedido das vítimas, mantém o anonimato das pessoas que fizeram os relatos à reportagem.

Fonte: POLÊMICA PARAÍBA
Créditos: UOL